Discurso integral de vitória de Barack Obama
Ontem
“Se alguém ainda duvida que a América é o lugar onde todos os sonhos são possíveis, se ainda questiona se os sonhos dos nossos fundadores ainda estão vivos, se ainda questiona o poder da nossa democracia, teve esta noite a resposta.
Foi a resposta dada pelas filas que se estendiam à volta das escolas, das igrejas em números que a nossa nação nunca viu antes, feitas de pessoas que esperaram três a quatro horas, muitas pela primeira vez nas suas vidas, porque acreditavam que desta vez tinha de ser diferente, que as suas vozes podiam fazer a diferença.
Foi a resposta dada por jovens e velhos, ricos e pobres, Democratas e Republicanos, negros, brancos, latinos, asiáticos, homossexuais, heterossexuais, deficientes, americanos que enviaram a mensagem ao mundo de que não somos somente um conjunto de indivíduos ou um conjunto de estados vermelhos ou azuis.
Nós somos, e sempre seremos, os Estados Unidos da América.
Foi a resposta que levou aqueles a quem foi dito durante tanto tempo para serem cínicos e receosos e duvidarem do que somos capazes de fazer e para colocar as mãos na arca da história e vergá-la mais uma vez em direcção à esperança num dia melhor.
Levou muto tempo, mas esta noite, por causa do que fizemos hoje nesta eleição e neste momento decisivo, a mudança chegou à América.
Há pouco tempo antes, no início da noite, recebi uma simpática chamada do senador McCain.
O senador McCain lutou muito durante esta campanha. E lutou ainda mais e durante mais tempo pelo país que ama. Ele fez sacrifícios pela América que a maior parte de nós não consegue sequer imaginar. Estamos bem pelo serviço que ele prestou, pela sua bravura e abnegação.
Dou-lhe os parabéns. Também dou os parabéns à Governadora Palin por tudo o que conquistou. E fico na expectativa de trabalhar com eles para renovar as promessas feitas a esta nação nos meses que se aproximam.
Quero agradecer ao meu companheiro nesta jornada, um homem que fez a campanha com todo o seu coração, e falou por homens e mulheres com quem cresceu nas ruas de Scranton e com quem partilhou o comboio de volta a casa no Delaware, o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
E não estaria aqui esta noite sem o apoio incondicional da minha melhor amiga nos últimos 16 anos, o pilar da nossa família, o amor da minha vida, a próxima primeira dama dos Estados Unidos, Michelle Obama.
Sasha e Malia amo-vos mais do que podem imaginar. E conquistaram o cãozinho que vem connosco para a nova Casa Branca.
E, apesar de já não estar entre nós, sei que a minha avó nos está a ver, com o resto da família que fez de mim quem sou. Sinto a vossa falta. Sei que a minha dívida para com eles não é mensurável.
À minha irmã, Maya, à minha irmã Alma, a todos os meus irmãos e irmãs, obrigado por todo o apoio que me deram. Estou-vos muito grato.
E ao director da minha campanha, David Plouffe, o herói não celebrado desta campanha, que construiu, acho eu, a melhor campanha política na história dos Estados Unidos da América.
Ao meu responsável pela estratégia, David Axelrod, que tem sido meu companheiro ao longo de todo o caminho.
À melhor equipa de campanha alguma vez reunida na história política e que tornou tudo isto possível, estou eternamente grato pelo que sacrificaram para conseguir tudo isto.
Mas, acima de tudo, nunca esquecerei que esta vitória vos pertence, na verdade, a todos vós. É vossa.
Não era o candidato mais provável para este cargo. Não começamos com muito dinheiro ou patrocínios. A nossa campanha não foi planeada nos corredores de Washington. Começou em Des Moines, nas salas de Concord, nas varandas de Charleston. Foi crescendo com o trabalho de homens e mulheres que contribuíram com o que tinham e que recorreram ás suas poupanças para dar 5, 10 ou 20 dólares.
Ganhou força com os mais novos que rejeitaram o mito de geração apática, que deixaram as suas casa, famílias por empregos mal pagos e noites mal dormidas.
Ganhou força com a geração já não tão jovem que se aventurou no frio e no calor para bater a portas de estranhos e dos milhões de americanos que se voluntariaram e organizaram e provaram que passados mais de dois séculos um governo de pessoas, pelas pessoas e para as pessoas continua a existir na Terra.
Isto é vitória.
E sei que não fizeram isto somente para ganhar a eleição. E sei que não o fizeram por mim.
Fizeram-nos porque perceberam a enorme tarefa que nos espera. Porque apesar de celebrarmos esta noite, sabemos que os desafios que o dia de amanhã nos trás são os maiores da nossa vida – duas guerras, um planeta em perigo, a pior crise financeira num século.Apesar de estarmos aqui esta noite, sabemos que existem americanos no deserto do Iraque, nas montanhas do Afeganistão que arriscam as suas vidas por nós.
Há mães e pais que não conseguem adormecer e que ficam a pensar como pagar as hipotecas ou as contas do médico ou se conseguem poupar o suficiente para a educação dos filhos.
Temos de rentabilizar a nossa energia, criar novos postos de trabalho, construir novas escolas e lidar com ameaças e reparar alianças.
O caminho que nos espera é longo. A nossa subida difícil. Podemos não chegar lá num ano, ou mesmo num mandato. Mas, América, nunca tive tanta esperança como a que tenho hoje de que chegaremos lá.
Prometo-vos, que como pessoas chegaremos lá.
Teremos contrariedades e falsas partidas. Haverá muitos que não irão concordar com cada decisão que tome como presidente. E sabemos que o governo não é capaz de resolver todos os problemas.
Mas serei sempre honesto convosco em relação aos desafios que enfrentamos. Vou ouvir-vos, em especial quando discordarmos. E, acima de tudo, vou pedir-vos para que se juntem a mim no trabalho de reconstrução desta nação, da única forma que sempre foi feito na América nos últimos 221 anos – bloco a bloco, mão calosa em mão calosa.
O que começou há 21 meses no inverno não pode terminar nesta noite de Outono.
Não é esta vitória a mudança que pretendemos. É a única forma de começarmos a mudança. E isso não pode acontecer se voltarmos a ser como éramos.
Não acontece sem vós, sem o novo espírito de serviço, o novo espírito de sacrifício.
Vamos unir-nos num novo espírito de patriotismo, de responsabilidade, em que cada um de nós resolve participar e trabalhar mas e olhar não só por nós mesmo mas também pelos outros.
Não nos esqueçamos que se a crise financeira nos ensinou alguma coisa foi de que não podemos ter uma Wall Street florescente enquanto que os outros sofrem.
Neste país, levantamo-nos e caímos como uma nação só, como um povo. Resistamos á tentação de voltar a cair no mesmo sectarismo, mesquinhez e imaturidade que envenenou a nossa política durante tanto tempo.
Relembremos que foi um homem deste Estado que pela primeira vez carregou a bandeira do Partido Republicanos até à Casa Branca, um partido que teve por base a autoconfiança, a liberdade individual e a unidade nacional.
Esses são os valores que todos partilhamos. E apesar do Partido Democrata ter conquistado uma grande vitória esta noite, fazemo-lo com a humildade e a determinação de sarar o que nos divide e que impediu o nosso progresso.
Como Lincoln disse a uma nação muito mais dividida do que a nossa, não somos inimigos, mas sim amigos. Apesar da paixão nos levar a exageros, não deve quebrar os nossos laços afectuosos.
E aqueles americanos cujo apoio ainda tenho de conquistar, posso não ter ganho o vosso voto esta noite, mas ouço a vossa voz. Preciso da vossa ajuda. E serei, também, o vosso presidente.
E para todos os que têm os olhos postos em nós esta noite, para além das nossas costas, dos parlamentos aos palácios, para aqueles que se juntaram à volta de rádios nos cantos mais esquecidos do mundo, as nossas histórias são diferentes mas o nosso destino é partilhado, e uma nova aurora se levanta na liderança americana.
Para aqueles que querem destruir o mundo: nós vamos destruir-vos. Para os que querem paz e segurança: nós apoiamos-vos. E para aqueles que se interrogam sobre se a luz de liderança da América continua viva: esta noite provamos, mais uma vez, que a força da nossa nação não vem do nosso poder militar ou da escala da nossa riqueza, mas do enorme poder dos nossos ideais: democracia, liberdade, oportunidade e esperança.
Essa é a verdadeira genialidade da América: a sua capacidade de mudança. A nossa união pode ser perfeita. O que conseguimos dá-nos ainda mais esperança em relação ao que podemos conseguir amanhã.
Esta eleição tinha muitas estreias e muitas histórias que serão contadas ao longo de gerações. Mas uma que está na nossa mente hoje é sobre uma mulher que votou em Atlanta. Ele assemelha-se a muitos milhões que estiveram na fila para fazer ouvir a sua voz nesta eleição por uma razão: Ann Nixon Cooper tem 106 anos.
Ela nasceu na geração da escravatura; num tempo em que não havia carros na estrada, aviões no céu; quando alguém como ela não podia votar por duas razões: porque era mulher e por causa da cor da sua ele.
E, esta noite, penso em tudo o que viu no centenário de vida na América – o desespero e a esperança; a luta e progresso; as vezes que nos disseram que não eram capazes e aqueles que mantiveram a sua capacidade de dizer: Sim, somos capazes.
E este ano, nesta eleição, ele tocou com o dedo no ecrã e fez o seu voto, porque depois de 106 anos na América, depois dos melhores tempos e dos mais obscuros, ela sabe que a América pode mudar.
Sim, somos capazes.
América, chegamos até aqui. Já vimos muito. Mas ainda há muito para fazer. Por isso, esta noite, perguntemos a nós mesmos: se as nossas crianças viverem para chegar ao próximo século; se as nossas filhas tiverem a sorte de viver tanto como Ann Nixon Cooper, que mudanças vão poder ver? Quer progressos teremos feito?
Esta é a nossa oportunidade de responder a essa questão. Este é o nosso momento.
Este é o nosso tempo, de voltar a dar trabalho à nossa gente, de abrir as portas da oportunidade aos nossos filhos; de restaurar a prosperidade e promover a paz; de reclamar o sonho americano e de reafirmas a verdade fundamental de que, no meio de muitos, somos um; que enquanto respiramos, mantemos a esperança. E aqui estamos nós, frente a frente com o cinismo e as dúvidas daqueles que nos dizem que não somos capazes, e a quem respondemos com o credo intemporal que representa o espírito de um povo: Sim, somos capazes.Obrigado. Deus vos abençoe. E que Deus abençoe os Estados Unidos da América.”
1.Quando os leitores se derem ao trabalho de ler este artigo, estão a levantar-se e a preparar-se para votar os cidadãos americanos. Os da Costa Leste, claro, porque os da Costa Oeste só votarão muito mais tarde, noite dentro na Europa. Enquanto os americanos no estrangeiro já votaram há alguns dias.O mundo tem seguido com paixão - é o termo - o desenrolar da campanha presidencial, a mais viva e participada da história dos Estados Unidos. E que terá consequências positivas e muito sérias para a América do Norte - e para a União Europeia - e importantes, senão decisivas, para o resto do mundo.O que está em causa é simples: ou ganha a dupla McCain e a sr.ª Pallin (uma desilusão colectiva, depois da esperança que inicialmente a candidata chegou a suscitar) e teremos mais do mesmo, em relação aos mandatos desastrosos do Presidente Bush, ou vence a dupla Obama-Biden e, então, assistiremos a uma viragem política e geoestratégica de grandes proporções, com consequências enormes, embora não imediatas.O mundo não tem dúvidas acerca disso. Se os estrangeiros de todos os continentes pudessem votar, Obama teria uma vitória esmagadora. Na Europa e na América Central e do Sul, alguns inquéritos apontam para uma percentagem de cerca de 80%.Nos outros continentes não seria tanto, mas a vitória também seria significativa. Excepto para aqueles que acreditam - mesmo em tempo de crise aguda, múltipla e complexa - na teoria do "quanto pior, melhor"...Obama, afro-americano, revelou-se um fenómeno organizativo e mediático imparável. Com excepcional carisma pessoal e um poder de comunicação junto das massas populares, de todas as condições e tipos, absolutamente invulgares.Depois, como já escrevi nesta coluna, um afro-americano sentado na Sala Oval da Casa Branca representa, só por isso, "uma revolução cultural enorme". Como a própria campanha eleitoral dos últimos tempos representou, pelo seu sentido didáctico, participativo e pelo seu dinamismo, um contributo muito relevante para a mudança das mentalidades dos americanos, de todas as classes, contaminando mesmo certos sectores mais fanatizados, empedernidos e ignorantes do mundo.É por isso que a eleição de hoje, que mudará seguramente o Congresso (em especial a Câmara dos Representantes) e, indirectamente, a prazo, o Supremo Tribunal Federal, apaixonou o mundo e tem um recorde de observadores estrangeiros a observá-la in loco.A vitória de McCain - improbabilíssima e contra a lógica das coisas - seria uma imensa desilusão para a esmagadora maioria dos seres humanos e teria consequências muito negativas para o equilíbrio da nossa Casa Comum, a Terra.Não se espere, no entanto, que a vitória de Obama mude tudo para melhor, de um momento para o outro, ou que ele tenha uma varinha mágica para resolver a crise tão grave e complexa com que estamos todos confrontados.O ano de 2009 vai ser muito difícil, para todos, sobretudo para os mais pobres e desfavorecidos, de todos os continentes.As mudanças vão necessariamente ser lentas e difíceis de aplicar, em muitos casos. Trata-se de mudar o paradigma económico em que temos vivido, neste mundo global, desregulado e violento, desde o início do século, e introduzir-lhe regras éticas - nos comportamentos das pessoas, das empresas e dos Estados - no quadro de uma nova ordem política, financeira e económica internacional.Atenção: Obama não é socialista e é um patriota americano que acredita na importância dos Direitos Humanos, tão desrespeitados, pacifista, que quer dar um novo impulso à América - e ao seu pioneirismo - para poder voltar a merecer o respeito e a influência (que perdeu) no mundo. Quer mudar a vida dos americanos, no plano dos cuidados de saúde, da educação e da previdência social. Prometeu que os soldados americanos sairão em 16 meses do Iraque e vai perceber, em pouco tempo, que terá de fazer o mesmo no Afeganistão. Quer que a América volte à ONU - privilegie a diplomacia e não os serviços secretos ou a guerra - e que as instituições financeiras internacionais (FMI, BM e OMC) sejam reestruturadas, democratizadas e integradas nas Nações Unidas. Prometeu dialogar com Cuba, sem condições prévias - o que representa uma mudança radical para a América Latina. Que mais poderemos nós, europeus e cidadãos do mundo, desejar para um primeiro mandato?A Europa, institucionalmente paralisada e atingida em cheio pela grande crise, tem de mudar, quanto mais depressa possível. Será inevitável. Os Estados membros que o fizerem mais rapidamente serão os que menos perderão...Tenhamos nós em Portugal - Governo, oposição, sociedade civil - olhos para ver e compreender a realidade do mundo, que vai mudar com impressionante rapidez. Esperemos, para melhor…2.A Galp e a Fundação Mário Soares realizaram, em Lisboa, no fim da semana passada, o II Lisbon Energy Forum 2008, para debater as questões energéticas - a sua importância e futuro -, não só para "limpar" as energias fósseis, que serão ainda decisivas nas próximas décadas, mas também para repensar a questão das energias alternativas, hídricas, eólicas, bio, como o etanol, e marinhas ou das ondas do mar, para diminuir muito as emissões de CO , como é essencial que aconteça, na fase pós-Quioto em que nos encontramos.Estiveram presentes os mais altos representantes das companhias produtoras dos quatro continentes e também das empresas de distribuição de petróleo e gás, como a Total, a Repsol, a Shell, a British Petroleum, etc. Aproveitando a experiência do primeiro fórum, julgámos importante mudar o modelo utilizado.Desta vez, a reunião foi inaugurada, na ausência do sr. primeiro-ministro, no estrangeiro, pelo sr. ministro da Economia, dr. Manuel Pinho, e, não podendo ser encerrada por Sua Excelência o sr. Presidente da República, como gostaríamos, por impossibilidade de agenda, foi o sr. presidente da Assembleia da República que proferiu o discurso de conclusão.Teve ainda outra novidade: a sessão da manhã, das 09.00 às 13.00 - abertura e encerramento -, foi aberta ao público interessado, que encheu o grande anfiteatro do Centro Cultural de Belém (pôde pôr questões à mesa), e também aos numerosos
-jornalistas presentes, portugueses e estrangeiros. Foi, aliás, preenchida por quatro conferências feitas por grandes especialistas de reputação mundial, duas senhoras e dois homens. Uma delas, uma portuguesa, dr.ª Maria da Graça Carvalho, ex-ministra da Ciência e do Ensino Superior, engenheira e actual conselheira do presidente da Comissão Europeia, dr. Durão Barroso, para as questões energéticas, que aliás estava também em sua representação.A segunda parte do fórum, da parte da tarde, foi à porta fechada, ao público e aos jornalistas, para que o debate entre os altos representantes das empresas pudesse decorrer com total fluidez e, portanto, fosse mais interessante para todos. Foi a novidade deste fórum, muito louvada pelos interessados.Dada a crise global a que estamos todos sujeitos - e as subidas e descidas especulativas dos preços do petróleo e do gás -, foi realmente muito mais produtivo assim.
arranha-céus do banco Wachovia é o que mais alto rasga o perfil de Charlotte, a maior cidade da Carolina do Norte. Charlotte é, depois de Nova Iorque, a capital financeira americana, sede de grandes bancos como esse Wachovia, há pouco comprado a correr para não falir. Deve estar aí uma das razões - ali se percebe melhor a crise na América - que explica o abalo político vivido na Carolina do Norte, estado do Sul que nem por Clinton votou. Agora, o democrata Obama chega ao dia de voto empatado com o republicano McCain. A Carolina do Norte (77% brancos, 23% negros) vai votar, pela primeira vez em muitas décadas, num democrata, ainda por cima negro? Barack Obama acredita tanto nisso que reservou o seu penúltimo comício, ontem, para Charlotte (escrevo na Universidade da Carolina do Norte, onde ele é esperado, e onde acaba de se saber que a sua avó morreu, no Havai). A Carolina do Norte é dos primeiros estados a votar e o seu resultado pode indiciar o novo presidente. Às 00.30 de quarta-feira (hora de Lisboa) conhecem-se as projecções: se Obama ganhar aqui, é porque a América virou democrata. Se não, vai ter de se esperar pela madrugada.
Tudo começou há 11 meses, quando dei por mim a ver a CNN às tantas da madrugada e a assistir ao discurso de Barack Obama após a sua vitória no caucus do Iowa, primeira etapa das primárias democratas no caminho para a Casa Branca. Eu já tinha lido alguns textos sobre Obama em 2007, sobre o seu nome surpreendente, a sua cor de pele e o seu talento político, mas estávamos numa época em que ninguém acreditava que ele pudesse bater a máquina Clinton. Obama era uma boa história, muito mais do que um bom candidato. Só que o frio Iowa, com a sua população esmagadoramente branca e um método de eleição que beneficiava as campanhas mais empenhadas e fervorosas, veio mudar tudo. Para a América, com certeza. Mas, em parte, também para mim.Ler sobre Barack Obama nos jornais é uma coisa. Ouvi-lo discursar em directo é outra muito diferente. E eu jamais esquecerei a sensação de deslumbramento com que o escutei pela primeira vez na madrugada de 4 de Janeiro de 2008. Lembro-me de ter pensado "uau, mas quem é este tipo?", e num arroubo de romantismo político (coisa que nunca pensei existir) ir buscar a minha mulher para partilhar comigo aquele momento. Quatro dias depois publicava no DN um texto intitulado "Convém fixar uma nova palavra: obamamania", que começava assim: "Se no mundo desencantado em que vivemos ainda houver espaço para acreditar em homens providenciais, então eu quero acreditar neste." E de seguida apostava na sua vitória nas primárias de New Hampshire - uma asneira de todo o tamanho, já que as famosas lágrimas de Hillary Clinton acabaram por o derrotar. Ainda assim, foi sua a festa. O seu discurso no New Hampshire, depois condensado no vídeo de will.i.am e Jesse Dylan Yes We Can - que ainda hoje me maravilha quando o vejo -, é certamente um dos mais espantosos discursos de derrota dos tempos modernos. Eu sei que no mundo em que vivemos, e nos jornais em que escrevemos, estas palavras parecem ingénuas. Sei também que dificilmente Obama estará à altura das expectativas que criou para si próprio. Não importa. Não o vejo - nem nunca o vi - como um Messias que revolucionará a forma de fazer política. Isso não existe. Mas é de facto um enorme prazer, ao fim de 35 anos de vida, pela primeira vez olhar para um político e poder dizer: "Eu realmente acredito neste homem." Não por ser imune ao erro, ou sequer concordar com 100% do que ele diz, mas por ter todas as condições de carácter para, em cada momento, poder decidir da melhor maneira. Que ele seja negro e se chame Barack Hussein Obama apenas demonstra que o sonho americano continua vivo. E só quem tiver perdido toda a esperança pode não encontrar aí algum conforto.
tempo de salvar milhões da fome, da tirania, do ex-tremismo e da violência
1- Na Somália há caos, fome, senhores da guerra, tribunais islâmicos. Não há Governo, não há comida, não há justiça. Mas há telefones. E foi por telefone que Asha Dhuhulow explicou ao pai que ia morrer. Executada por lapidação. Tinha 14 anos.
Foi na semana passada que a curta história de vida de Asha se transformou numa história de morte. A família enviara-a para Norte e para longe do campo de refugiados onde nasceu, na esperança de lhe conseguir melhores cuidados médicos.
A viagem foi interrompida em Kismayo, cidade do Sul da Somália, entretanto tomada pelas milícias Al Shabab (A Juventude), organização terrorista com ligações à Al Quaeda. E o que deveria ter sido um julgamento de três homens pela brutal violação de uma menina, transformou-se numa farsa para condenar uma adúltera.
Como é hábito, a execução foi pública, tendo sido arrebanhada uma pequena multidão de deserdados e famintos para o estádio local. Alguns revoltaram-se contra o horror com que os confrontaram. Foram silenciados a rajadas de metralhadora. O ritual prosseguiu. Um camião trouxera atempadamente o carregamento de pedras. Cinquenta homens rodearam Asha, enterraram-na até ao pescoço, para a imobilizar, e cobriram-lhe a cabeça com um capuz. E assim a mataram. À pedrada.
2 - Se o Mundo pudesse votar, Barack Obama seria presidente dos Estados Unidos da América. Por uma dúzia de boas razões. Mas também por ser negro. E assim se demonstrar que é possível quebrar o preconceito racial e, associado a ele, um destino de pobreza e de falência.
Filho de um queniano, tem neste país [e no continente] de "origem" um apoio quase incondicional. Não será o novo messias, mas é visto como o homem que poderá assegurar um Mundo mais pacífico. Sobretudo, a paz para África. Os africanos sabem que só a paz trará a prosperidade de que desesperadamente necessitam. Para inverter o ciclo de pobreza e de violência endémicas.
Notícias desta semana davam conta da ameaça de fome que atinge vários países do chamado Corno de África - Quénia e Somália incluídos. 18 milhões de pessoas enfrentam aquela que se poderá tornar, nos próximos meses, segundo os relatos que chegam da zona, na pior tragédia humanitária da década.
Não é provável que o extraordinário carisma de Barack Obama seja suficiente para inverter a hipocrisia que habitualmente se move a política internacional. Mas é ainda assim razoável esperar que exporte, para fora dos EUA, a sua crença e a sua ambição de mudança. Já será tarde para Asha. Mas pode ser que seja a tempo de salvar milhões de africanos da fome, da tirania, do extremismo e da violência.
Opinião
A semana negra
O horror do desastre das finanças e da economia americana foi um descalabro anunciado há alguns meses mas em que os americanos e economistas reputados, da América e da Europa, não queriam acreditar ou não achavam conveniente denunciar. No entanto, no final da semana anterior à semana negra, Bush resolveu falar ao país e soltar a língua: denunciou, sem qualquer espírito de autocrítica, o descalabro das finanças, a iminência de várias falências de grandes bancos e a necessidade de um «plano de salvação», da responsabilidade do secretário de Estado do Tesouro, Henry Paulson, aprovado por ele, de 700 mil milhões de dólares para evitar as falências e dar um pouco de confiança ao país, uma vez que o desemprego está a crescer em flecha e as pequenas e médias empresas a ser obrigadas a fechar as suas portas.
As bolsas, em enorme baixa, foram detidas e encerraram, no fim da semana, com sinais de alguma esperança. Veio, então, a segunda-feira negra, com a péssima notícia de que a Câmara dos Representantes tinha votado contra o plano pseudo-salvador, distinguindo-se, nesse voto, precisamente os deputados republicanos, amigos e partidários de Bush. Porquê?
Porque o plano resultou extremamente impopular para a maioria da população americana e, dentro de um mês, há eleições, tanto para Presidente como para a Câmara dos Representantes. Ora, os republicanos têm mais medo do que os democratas – o que se compreende – de as perder... Depois, por serem convictos neoliberais, contestatários da intervenção do Estado na economia e ao nacionalizarem os bancos – ou os prejuízos dos bancos – estavam a ser completamente contraditórios com a sua doutrina (ideologia) bem amada... Querem remediar a crise, salvando o sistema que a criou. O que é incoerente – impossível – porque o sistema está podre e entrou em agonia irremediável.
Resultado: Obama, que quer a mudança, como sempre tem dito, sobe, de imediato, nas sondagens, e a inquietação nas bolsas, não só já nos Estados Unidos, mas também na Europa, como se está a ver com os dirigentes dos 4, reunidos em Paris, a comportarem-se como baratas tontas. Bush fez novos apelos: sabe bem que não tem outro remédio para evitar o descalabro. A um mês de terminar o seu mandato, a pior coisa que lhe podia acontecer era o colapso económico do sistema, sem remédio nem esperança.
O plano Henry Paulson voltou a ser feito e refeito, nessa semana de enorme angústia, com reflexos muito negativos na Europa e no mundo. O Senado votou-o pressurosamente. Mas as hesitações, na Câmara dos Representantes, continuaram. Será que o plano vai resolver alguma coisa e que há garantias sérias de que o dinheiro entregue aos bancos vai ser aplicado com razoabilidade e em favor das vítimas, em vias de perder o seu dinheiro? Foram dadas algumas garantias, mas há muitas dúvidas que persistem. Finalmente, na sexta-feira passada, o plano refeito foi aprovado, sem entusiasmo e com muitos votos ainda contra. Mas Bush ficou feliz. Imagina-se, tiraram-lhe um imenso peso de cima dos ombros...
Uma coisa é certa. A América, quer se queira quer não, entrou num novo ciclo. O neoliberalismo – e a «terceira via», como se chamava em Londres e não só – morreu sem glória. Não foi a vitória do socialismo, como alguns dizem, com ironia. Mas se for a vitória da Esquerda americana – e de Barack Obama – já é muito bom. Significa que os ventos de mudança – a sério – vão voltar a soprar, sobre a Europa e o mundo!
Opinião
Uma Casa Branca negra
O fenómeno Obama revela a força e a fragilidade da democracia nos EUA
Lisboa, 9 de Outubro de 2008
É provável que o próximo presidente dos EUA seja um afro-descendente. O significado de tal facto é enorme e insere-se num processo histórico mais amplo. As três últimas décadas foram de muita esperança e desilusão a respeito da democracia. Muitos países conquistaram ou reconquistaram a democracia neste período, mas a garantia dos direitos cívicos e políticos ocorreu de par com a degradação dos direitos sociais, o aumento da desigualdade social e da corrupção.
O desencanto, numa época em que a revolução não foi uma alternativa credível à democracia, fez com que surgissem novos actores políticos, movimentos sociais e líderes, na maioria dos casos com poucas ou nenhumas vinculações à classe política tradicional. As Américas são uma ilustração eloquente disto, ainda que os processos políticos sejam muito diferentes de país para país.
Em 1998, um mulato chega à Presidência da Venezuela e propõe a revolução bolivariana; em 2002 um operário metalúrgico é eleito Presidente do Brasil e propõe uma mistura de continuidades e rupturas; em 2005 um indígena é eleito Presidente da Bolívia e propõe a refundação do Estado; em 2006 um economista sem passado político é eleito Presidente do Equador e propõe a revolução cidadã; em 2006 e 2007 duas mulheres são eleitas Presidentes do Chile e da Argentina, respectivamente com projectos de continuidade mais ou menos retocada; em 2008 um bispo, teólogo da libertação, é eleito Presidente do Paraguai e põe fim a décadas de domínio do partido oligárquico através da aliança patriótica para a mudança; e ainda em 2008 é provável que um negro chegue à Casa Branca com o slogan: Change, yes we can.
Uma nova política de cidadania e de identidade, sem dúvida mais inclusiva, está a impregnar estes processos democráticos, o que nem sempre significa uma política nova. Por isso, pode ser um sol de pouca dura. De todo modo, é importante que líderes vindos dos grupos sociais que na história da democracia mais tarde conquistaram o direito de voto assumam hoje um papel de proeminência. No caso dos EUA, isto acontece apenas 40 anos depois de os negros conquistarem direitos cívicos e políticos plenos.
A eleição de Obama, a ocorrer, é o resultado da revolta dos norte-americanos ante a grave crise económica e a estrondosa derrota no Iraque, apesar de declarada como vitória até ao último momento, como já aconteceu no Vietname. O fenómeno Obama revela a força e a fragilidade da democracia nos EUA. A força, porque a cor da sua pele simboliza um acto dramático de inclusão e de reparação: à Casa Branca dos senhores chega um descendente de escravos, mesmo que ele pessoalmente o não seja. A fragilidade, porque dois temores assolam os que o apoiam: que seja assassinado por racistas extremistas e que a sua vitória eleitoral, se não for muito expressiva, seja negada por fraude eleitoral, o que não sendo novo (o W. Bush foi «eleito» pelo Supremo Tribunal) representa agora uma ocorrência ainda mais sinistra. Se nada disto ocorrer, um jovem negro, filho de um emigrante queniano e de uma norte-americana, terá o papel histórico de presidir ao fim do longo século XX, o século americano.
A crise financeira é a ponta do icebergue da crise económica que assola o país e tudo leva a crer que a sua resolução não permitirá que os EUA retomem o papel de liderança do capitalismo global que tiveram até aqui. A União Europeia já chegou a esta conclusão e parece ter a veleidade de tomar o lugar dos EUA, apesar de nos últimos 20 anos só não ter sido uma aluna mais fiel do modelo norte-americano porque os cidadãos não permitiram. Acresce que nas relações com os países que na América Latina, na África e na Ásia podiam ser parceiros de um novo modelo económico e social mais justo e solidário a UE persiste em assumir posições imperialistas que lhe retiram credibilidade.
A transformação não virá da UE ou dos EUA. Terá de lhes ser imposta pela vontade dos cidadãos dos países que mais sofreram com os desmandos recentes do capitalismo de casino.
O fim de um mundo falso
Durante quarenta anos ele acreditou na infalibilidade do sistema e na verdade intrínseca do mercado. E, de repente, o mundo que ele ajudara a construir e a impor como coisa inevitável e inquestionável desabou-lhe aos pés. O depoimento de Alan Greenspan, o 'mago' da Federal Reserve, perante o Senado dos Estados Unidos foi um impressionante "mea culpa", porque foi sincero e porque se percebeu que o velho guru do liberalismo estava verdadeiramente estarrecido com as consequências do seu erro decisivo.
Qual foi o erro de Greenspan, qual foi o erro do credo liberal? Foi, de certa forma, o erro inverso da teoria marxista. Marx, que foi um genial analista dos vícios do capitalismo, propôs o socialismo como alternativa, mas uma alternativa filosófica e moral, decorrente da crença de que a propriedade era um roubo. Mas as pessoas não se alimentam de teorias filosóficas nem convicções morais, e sim de coisas mais imediatas como a produtividade e a criação de riqueza. O socialismo, como doutrina económica, nasceu condenado ao fracasso, porque desdenhou o factor humano: a propriedade não é um roubo, é uma legítima ambição de qualquer homem, desde os especuladores de Wall Street até aos miseráveis dos guetos de Bombaim. Mudar a vida para melhor, ser mais rico, graças ao seu esforço, ao seu trabalho, à sua capacidade de inovação e de risco, faz parte da natureza humana e das suas ambições desde que o homem é homem. A livre iniciativa é o factor primeiro de produção de riqueza e de progresso económico. Num mercado aberto e concorrencial, cada um sabe que poderá, pelo seu esforço e pelo se mérito, melhorar a sua condição. Num mercado fechado, numa economia estatizada em que todos são funcionários públicos, não adianta fazer mais nem melhor, porque o Estado é dono de tudo e ninguém tem nada de seu.
Sobre as ruínas da crença socialista, que produziu milhões de deserdados e de miseráveis, os liberais acharam que tinha soado a hora de uma vingança histórica. O Estado mínimo, que Greenspan caucionou e Bush levou ao extremo do dogmatismo, descendo os impostos sobre os mais ricos, cortando nos programas de ajuda social e facilitando em tudo os negócios do grande capital, assentava numa outra pretensa verdade, de que Greenspan se fez eco: a de que o mercado saberia auto-regular-se, pois que era do seu próprio interesse, do das grandes empresas e do sistema financeiro, não criar as condições para a auto-implosão. Mais uma vez, o que ficou esquecido neste "wishfull thinking" foi o factor humano. Se a ambição de ser mais rico é o que faz aumentar a riqueza das nações, a ambição da riqueza desmedida, sem horizonte nem controlo dos meios usados, é o que conduz ao seu colapso.
O que falhou, então, não foi apenas a crença na desregulamentação do mercado, na concentração cada vez maior das empresas, nos lucros pornográficos distribuídos entre accionistas e gestores. O que falhou, antes de mais, foi a noção de ética nos negócios, a lembrança de que a criação de riqueza tem uma finalidade social, não podendo aproveitar apenas ao seu detentor, e que a riqueza fundada na miséria alheia (ou no endividamento de todos perante a banca) conduz, mais cedo ou mais tarde, à falência geral.
A loucura liberal montou um sistema económico à escala planetária fundado na iniquidade e na falta de escrúpulos e de sentido de serviço à comunidade. Pior ainda, permitiu que o sistema financeiro se apoderasse da economia, que os lucros fantásticos acumulados não correspondessem a riqueza efectivamente criada e que a economia real e produtiva fosse canibalizada pela especulação. Os mercados accionistas subiam e desciam, não em resultado do desempenho das empresas cotadas, mas das mais-valias realizados pelos especuladores - que depois corriam a canalizar os seus lucros para os "off-shores", onde ficavam à espera, sem pagar impostos, de nova oportunidade de raide sobre o mercado. As pequenas poupanças foram assim devoradas pela especulação instalada, levando muitos a investir antes no consumo ou a endividarem-se no imobiliário, por não encontrarem melhor destino para o dinheiro.
Esta bebedeira colectiva vinha de trás e de longe, com sinais inequívocos de um fatal estoiro algures, e o que é incompreensível é que homens como Greenspan tenham assistido a tudo, confortados na sua crença de que o capitalismo em caso algum se devoraria a si próprio, ao contrário do que Marx escreveu há mais de um século. Entregue a si mesmo, aos seus instintos mais primários, o homem é um animal perigoso, quer ande pela rua a deambular de revólver na mão quer esteja sentado a uma secretária a gerir o destino de milhares de famílias. E o pior "serial killer" é aquele a quem foi confiado o poder de destruir, por simples ambição, os empregos e as pensões de reforma de tantos outros que trabalharam toda uma vida, confiados na honestidade do sistema. Não estamos apenas perante o falhanço de uma teoria económica, é mais do que isso: estamos perante um verdadeiro crime contra a Humanidade. Milhões de pessoas em todo o mundo estão já a sofrer as consequências da falta de pudor e de escrúpulos de alguns milhares de agentes económicos colocados em lugares privilegiados.
A esta luz, a tentativa - recentemente importada para aqui - de tentar explicar que o que falhou não foi a falta de regulação do mercado, mas sim o seu excesso, é quase uma nova forma de negacionismo. Dizer, como já vi escrito, que o que conduziu ao descalabro foi a legislação deixada por Clinton, que pretensamente obrigaria a banca a financiar negros e pobres sem capacidade de endividamento, sob pena de ser acusada de discriminação, roça as raias do insulto. Teriam sido os pobres, então, quem esteve na origem da crise, fazendo arruinar os ricos, os quais, coitados, só quiseram ajudá-los... O sr. Greenspan, afinal, não tem razões para se angustiar e viver os seus últimos anos atormentado pelos remorsos da sua extraordinária incúria!
Terça-feira que vem, o mundo pode começar a reencontrar o caminho da esperança, com a eleição de Obama como Presidente dos Estados Unidos. Não, ele não tem uma varinha mágica nem vai conseguir, por melhor que tente, tirar a América e o mundo deste atoleiro tão cedo. Mas representa outra gente, outra atitude, outra esperança. Seguramente que acredita numa economia menos iníqua, menos desonesta e menos entregue à lei da selva. E acredita na necessidade de uma América menos arrogante e menos egoísta. Cravará os pregos que forem necessários no caixão do liberalismo e, se tiver a lucidez suficiente para tal, trará a América de volta ao lugar da esperança que já foi seu e que perdeu com estes oito anos de pesadelo que foram os de George W. Bush
INFERNO
António Costa
Não frequento o Bairro Alto. Seja em Lisboa ou no Rio de Janeiro, favelas não fazem o meu género. Mas entendo a medida de António Costa para combater os "graffiti" que abundam pelas ruas do bairro. Segundo parece, António Costa pretende contratar uma empresa para fazer a limpeza regular do espaço. E, a prazo, será entregue a cada morador um "kit" de limpeza com rolo de pintura, extensão, tabuleiro, óculos, luvas, uma embalagem de protecção e líquido removedor de tinta. Talvez António Costa se esteja a esquecer de um revólver, mas eu entendo a ideia: para "não coarctar a expressão artística" (sic), o nosso António deu luz verde para que os delinquentes continuem a destruir a propriedade alheia durante a noite. Impunemente. As vítimas da delinquência que limpem o crime no dia seguinte.
A medida é admirável e demonstra um respeito pelos lisboetas que me comove até às entranhas. Mas pergunto se António Costa estará sintonizado com algumas práticas estrangeiras de combate aos "graffiti". Na Cornualha, por exemplo, li recentemente que as autoridades inglesas resolveram construir um gigantesco muro branco para que os "artistas" locais possam exercer nele a sua arte. Por que não seguir a experiência?
Bem sei que as contas da Câmara de Lisboa não permitem este tipo de investimentos. Mas António Costa podia imitar o gesto e ceder, a título caritativo, a sua própria residência pessoal para que os "artistas" a vandalizem à vontade. Depois, quando a manhã viesse, era só entregar o "kit" de limpeza ao senhor presidente e vê-lo a remover, compreensivo e sorridente, a nobre "arte" da pixação. Fica o desafio.
PURGATÓRIO
Barack Obama
Um amigo meu encomendou, via Amazon, uma camisola de apoio a John McCain. A camisola veio, ele vestiu-a e foi trabalhar. Nada o preparava para o espectáculo posterior: colegas e amigos olhavam para ele com um esgar de incompreensão e nojo. A coisa foi tão ostensiva que, a meio da tarde, ele resolveu mudar de roupa para não arranjar sarilhos num meio maioritariamente artístico, ou seja, de esquerda.
O episódio é interessante porque revela o quadro mental em que a esquerda usualmente chafurda. Creio que foi Roger Scruton quem o resumiu na perfeição: quando um "conservador" critica um "progressista", ele parte do pressuposto de que o adversário está errado. O critério é epistemológico, não ético. Mas quando um "progressista" critica um "conservador", o julgamento é moral; e o adversário, um simples inimigo.
Naturalmente que existem todas as excepções do mundo. Mas as excepções confirmam a tese: o pluralismo não entra na cabeça de uma esquerda moralista e intolerante. Foi precisamente esta arrogância moral da esquerda, a que se junta uma óbvia falta de sentido de humor, que fizeram de mim uma pessoa à direita.
E McCain? E Obama? Sim, gostaria que McCain ganhasse. E ainda acredito que McCain vencerá: as sondagens sempre inflacionaram os Democratas (lembrar Carter contra Reagan). Mas não me repugna que Obama vença. O que ouvi dele sobre política externa (Afeganistão, Paquistão, Irão) chega e sobra para adivinhar duas fatalidades. Primeiro, que a esquerda vai ter uma desilusão profunda com o Santo Obama (para meu infinito riso). E, segundo, que Obama será um digno representante da América democrática e livre de que eu tanto gosto.
Viragem. Não foi um negro que foi eleito. Foi um americano, que tem a circunstância de ser negro, que foi eleito Presidente. Obama fez com que os seus compatriotas se convencessem de que a raça não é importante
Entre a multidão de Chicago que, nos jardins vizinhos ao lago Michigan, celebrava a América, na madrugada passada, as câmaras de televisão detiveram-se na cara de um senhor negro e famoso que chorava. Era o reverendo Jesse Jackson. Ele é filho dos anos 60 que garantiram os direitos cívicos para os negros. "Rosa Parks sentou-se para que Luther King pudesse marchar, que marchou para que Obama pudesse voar", foi uma frase muito dita por estes dias, definindo as etapas encetadas pela senhora negra de Montgomery, Alabama, sentando-se num banco de autocarro só para brancos, e que chegaram agora à celebração do primeiro Presidente americano negro. Jackson chorava de alegria por esse sobressalto que permitia que na vida de um só homem se pudesse ter visto tanto.Mas o reverendo podia também chorar por ter sido ultrapassado pela História. Ele, que também concorreu para a nomeação democrata nas primárias de 1984 e 1988, e não foi longe, reconhecia que o homem daquela madrugada, Barack Obama, era de outro campeonato, o dos vencedores, e não só o dos predicadores. Jackson notabilizou--se nas campanhas pelos direitos cívicos, integrou organizações negras, lançou a sua candidatura em igreja negra - ele era filho de uma geração em que os passos eram esses. Mas colar-se a uma minoria (os negros são 12,8% da população dos EUA) não pode ser táctica ganhadora numa corrida eleitoral. Ainda ontem, um jovem político negro, que pretende agora concorrer ao lugar de senador pelo Ilinóis, deixado em aberto por Obama ir para a Casa Branca, definiu assim o novo Presidente: "Ele não é um afro-americano que foi eleito, ele é um americano, que tem a circunstância de ser afro-americano, que foi eleito." Curiosamente, o jovem chama-se Jesse Jackson Jr. e é filho do reverendo que chorava.Há semanas, em Nova Iorque, num jantar público que fez com John McCain e em que era suposto os discursos usarem o humor, Obama riu--se de si próprio: "Quem me baptizou Barack Hussein estava a torpedear-me a carreira política..." Estava e não estava. Mestiço e com tais nomes muçulmanos, ele poderia assumir a condição minoritária ou, pior, adoptar a condição muito comum nos afro- -americanos de não singrar na vida porque a História cometeu contra eles o pecado mortal da escravatura. O queixume como modo de vida deu cabo de muita carreira num país que reconhece como das virtudes maiores o saber lutar contra o destino. Mas Obama não foi por aí. A provocação dos seus nomes, Barack Hussein, como que serviu de aguilhão para não se desculpar.Deitando fora o colete-de-forças que pretendia fazê-lo só um afro-americano (e neste só traduza--se o que seria o filho de um imigrante português querer fazer carreira em Boston mas desdenhar os Red Sox e ser sócio do Benfica), Obama descobriu-se, afinal, um legítimo filho da América moderna. Pai queniano e mãe branca do Kansas, e nascido no Havai, de tão diversificado, bebia na corrente de fundo que faz a América de hoje - ele é muito mais comum que, por exemplo, um mórmon como Mitt Romney, que esteve para ser o candidato republicano.É verdade que Obama teve 95% dos votos negros. Mas teve também mais votos brancos que o precedente candidato democrata John Kerry (2004). Nas sondagens à boca das urnas, nove em dez votantes disseram que a raça não tinha sido importante nestas eleições. O facto dado como adquirido, os hispânicos não gostam de políticos negros, virou mito: Obama ganhou mais de metade dos votos hispânicos.Essa situação de facto e a vontade ideológica de assumir a tradição americana fizeram a força de fundo, aliada ao talento natural (tornem a ouvir o discurso da madrugada de ontem e reconheçam esse talento). Quando lançou a sua candidatura, Obama escolheu as escadarias do Capitólio de Springfield, Ilinóis, a casa de Abraham Lincoln. E no discurso de ontem, a figura invocada foi de novo Lincoln. A direita portuguesa que se fascinou com Obama vai arrepender-se - ele é um revolucionário porque é da América que tem por vocação transformar-se; a esquerda portuguesa que se fascinou com Obama vai arrepender-se - ele é um conservador que rega as tradições americanas. Se não quiserem enganar-se, vejam nele o essencial: Barack Hussein Obama, um homem da América.
A AMÉRICA ELEGEU UM PRESIDENTE PRETO
América mais universal e menos americana
António Justo
Os Estados Unidos da América elegeram o seu primeiro presidente preto, 150 anos depois da libertação dos escravos. A América apresenta-se com um rosto novo ao mundo!
Barack Obama conseguiu entusiasmar a América pela política. A participação eleitoral alcança um novo recorde. 153 milhões de cidadãos participaram nas eleições conseguindo Obama já 57,7 % dos votos para si. O 44.° Presidente da USA apresenta muitas semelhanças com o presidente Kennedy que então foi o símbolo duma nova América.
A América ao eleger um presidente preto reconcilia-se consigo mesma e com o mundo.
Com a derrota de McCain a USA despede-se duma era histórica nostálgica de vitória e de força no mundo.
Num momento em que o sonho americano sofre as primeiras arranhaduras com a crise financeira, a USA procura um novo papel na história. Barack Obama personifica o sonho americano de vida, liberdade e felicidade. Ele consegue subir, com o próprio esforço, duma situação modesta ao mais majestoso cargo da América. Os votos em Obama são mais que os votos num partido. São os votos dum movimento, o grito da esperança que surge da profundeza da sociedade americana. Na vitória do partido democrático está presente a desilusão de políticas falhadas e a esperança daqueles que levantam a mão, no desejo de verem os seus interesses chegarem à ribalta da nação. Por todo o lado se torna latente o desejo dum novo começo.
Obama, na sua campanha eleitoral, procurou um novo estilo de discurso. Tentou superar os clichés ideológicos de direita e de esquerda, de Etablishment e de carenciados. Com estilo deixou alguns alertas dignos de escrita no álbum dos partidos: "Não há uma América liberal e uma América conservativa – há os Estados Unidos da América". Aqui, Obama não se revela como um político normal. Ele quer construir pontes para melhor servir o povo americano.
Às águias do poder, que questionavam a sua experiência, ele responde:"Trata-se da capacidade de discernimento e não da experiência". A América, tal como ele, é jovem e na sua juventude antecipa o futuro. Obama fala, no plural, dum futuro melhor onde "nós todos encheremos o sonho americano com nova vida, onde todos terão, verdadeiramente, as mesmas chances". A América é sempre jovem porque a sua elite sonha e com ela o povo também. Nela a elite, com todos os seus paradoxos, não deixou de ser povo.
O povo americano elegeu uma biografia e não um programa. Na sua pessoa os americanos vêem a história da América, reconhecendo-se na sua mensagem de esperança e entusiasmo.
Todo o Mundo olha para a América porque sabe que grande parte do seu destino depende dela.
A concorrência da Rússia e da China, o ressentimento árabe, o terrorismo e a inveja europeia terão um novo peso na nova era que agora se anuncia.
Embora o tema da guerra do Iraque tenha estado ausente durante a propaganda eleitoral, o seu fim não pode ser adiado indefinidamente. A sua vontade de reformar o sistema de saúde é mais que pertinente. Embora se incline para o proteccionismo económico (o que assusta os chineses) mostra-se mais liberal na política de segurança. Com ele talvez a presença militar da USA no mundo, com as suas 761 bases militares em 151 países, se faça sentir menos e a ideia imperialista presente em todas as civilizações se comece a embaçar. Com ele, os europeus querem ser tomados mais a sério. Esperam uma política que não se aproveite da rivalidade entre os Estados europeus e que assuma compromissos internacionais em questões de protecção do clima e do controlo de armamento. (O problema para Obama em relação à União Europeia será saber o que esta quer!) Os poderes que Obama tem de enfrentar são hercúleos: um mundo contraditório em si, os serviços secretos, as forças militares e económicas e uma pratica mundial em que o ser humano ainda não é tema prioritário.
Obama, filho de pai queniano e de mãe americana, desperta muitas esperanças também na África. Espera-se que ele não escreva apenas história americana. Os russos esperam, com ele, ser mais fácil recuperar o velho brilho de potência que tinham no tempo da União Soviética.
Obama não será nenhum santo. Neste sentido fala a sua carreira de político. Consta que nas escadas do poder partidário ninguém sobe sem cadáveres na cave. Além disso, as esperanças, nele colocadas, tornarão mais difícil o seu papel de presidente. As projecções colocadas no presidente eleito são de tal ordem que exigiriam dele uma pessoa sobre-humana para as satisfazer. Só resta lugar para o desencanto.
A crise financeira mostrou a necessidade duma nova ordem mundial. Uma mudança radical seria mais que óbvia.
Obama encontra, como hipoteca, a guerra do Iraque que terá de pôr fim em tempo determinado. O conflito israelo-árabe espera também por solução. A necessidade da USA se libertar da dependência dos regimes do petróleo possibilitará o renascimento da ecologia. Ele quer "um governo do povo para o povo". A crise histórica em que o mundo se encontra não facilita o papel do presidente. Não será fácil tirar o carro da lama.
O novo presidente pode tornar-se numa oportunidade de reconciliação de muitos países com os Estados Unidos. Ele é o símbolo da nova era. Nele pode torna-se possível a integração da potência e da impotência e assim se passar da era do diálogo para a era do triálogo. A chama da liberdade deixará então de ser tão deslumbrante.
A sua vitória, integrada na sua biografia, revela a possibilidade de integração das forças do Sul com as do norte. Na sua personalidade se encontra a mistura americana, a mistura racial e religiosa. Barack Obama representa na sua pessoa a post-américa, a vontade de integração do mundo do norte e do mundo do sul. A América permanecerá sempre uma nação universal, um luzeiro que integra em si todas as culturas.
A América continuará a ser a AMÉRICA: talvez mais universal e menos americana!
António da Cunha Duarte Justo
Simbolismo e esperança
00h30m
A América elegeu um presidente negro. A América mudou. A primeira afirmação é um facto; a segunda, parecendo sê-lo, pode não passar de uma percepção. Como depois da bebedeira vem a ressaca, depois da "Obamania" - emoção e entusiasmo, expectativas sem freio - vem a realidade. Sombria e incerta, nos tempos que correm.
A partir de Janeiro, quando Barack Obama oficializar a sua entrada na Casa Branca, é que é a doer. Por enquanto, duas palavras ganharam primazia: simbolismo e esperança. Ambas são indispensáveis em política, porque mobilizadoras dos cidadãos. Mas não constituindo um programa político, muito menos automática garantia de bem-estar, correm o risco de esfumar-se em pouco tempo.
A América mudou por fazer as pazes com o passado, por reconhecer, finalmente, que os afro-americanos também integram o seu código genético? Talvez, embora a perspectiva pareça excessivamente simplificadora da realidade. Mais avisado é dar tempo ao tempo, para perceber em que consiste, se consiste, a mudança.
Numa nação habituada à hegemonia no mundo, o peso da história continua a ser mais decisivo do que o papel circunstancialmente desempenhado pelos indivíduos. Os Estados Unidos não se tornaram mais conservadores do que eram durante o consulado de George W. Bush, nem a eleição de Obama representa uma ruptura - quanto mais uma revolução! - tão absoluta como tendemos a acreditar na Europa. Quanto mais não seja porque a erupção da crise em Wall Streeet, já toda a gente teve oportunidade de o constatar, entrou sem pedir licença para o topo da agenda política do novo presidente.
O seu mais imediato desafio é esse: pôr em ordem a economia interna. Não é pêra doce, sabendo-se que o sistema financeiro bateu no fundo. Nem é tarefa que diga exclusivamente respeito aos Estados Unidos, na medida em que a globalização se encarregou de espalhar metástases da crise por todo o planeta. A política interna norte-americana, hoje mais do que nunca, tem impacto externo, que nenhum país pode ignorar.
Só depois de arrumar a casa Obama poderá concentrar energias na política externa. É provável que, entretanto, encerre a prisão de Guantanamo, como sinal de mudança (lá está: simbolismo). A resolução dos mais quentes dossiês - Iraque, Irão, Afeganistão, Médio Oriente - requer um fôlego suplementar. Exige-se que adopte uma estratégia menos "imperial" e mais multilateral, em cumprimento das promessas feitas em campanha. O palco internacional constituirá, por excelência, o verdadeiro teste à mudança. Obama, vaticina-se, precisa de um prolongado "estado de graça". Não é seguro que lhe seja proporcionado.
Uma eleição histórica e que traz esperança
A crise internacional será o grande desafio a enfrentar de imediato por Barack Obama, o primeiro negro a ser eleito Presidente dos Estados Unidos. E cujo triunfo foi recebido um pouco por todo o mundo com palavras como "mudança", "histórico" e "esperança". As reacções à clara vitória sobre John McCain foram entusiasmadas, tanto nos Estados Unidos, onde a mobilização eleitoral foi surpreendente, como no exterior, sobretudo entre os aliados europeus. Mas também por parte de países como Cuba ou Irão, que surgem na lista dos tradicionais inimigos dos americanos. E o discurso de vitória, celebrado em Chicago perante centenas de milhares de apoiantes entusiasmados, correspondeu às expectativas. Não só pelo tom, cativante como sempre, mas sobretudo pelo conteúdo: Obama prometeu relançar a economia, combater a crise financeira, retirar as tropas responsavelmente do Iraque e investir o potencial militar dos Estados Unidos na luta à Al-Qaeda e aos seus aliados talibãs no Afeganistão. Foi um discurso de mudança, cheio de sentido histórico e com uma mensagem de esperança, a reflectir a forma como foi acolhido pelo mundo. Depois de uma era Bush marcada pelo unilateralismo - em que a invasão do Iraque sem o aval da ONU foi a marca mais visível - Obama promete agora uma América dialogante, capaz, porém, de se mostrar forte também quando for preciso. O derrotado McCain, candidato republicano, reconheceu a derrota sem demoras e amargura, ao contrário do que sucedeu há oito e há quatro anos por parte dos democratas. E prometeu colaboração com o adversário, apesar da diferença de opiniões que se revelou durante a campanha. Mesmo George W. Bush, que termina sem glória uma passagem pela Casa Branca que também começou de forma cinzenta (com a polémica vitória de 2000 sobre Al Gore na Florida, que teve mais votos populares a nível nacional), prepara-se para apoiar o seu jovem sucessor neste momento delicado de transição que se arrastará até à tomada de posse a 20 de Janeiro, em Washington.Da América e destas eleições sai ainda uma tremenda mensagem. O racismo que era desmentido há décadas pelos inquéritos sociológicos, mas que subsistia nas diferenças sociais e económicas, foi agora derrotado sem hesitações nas urnas. Os americanos - que, apesar de Thomas Jefferson ter proclamado que todos os homens nasceram iguais, tardaram um século a abolir a escravatura e outro a reconhecer direitos cívicos aos negros - mostraram na terça-feira serem capazes de ter heróis negros. Já não um basquetebolista , um cantor ou uma apresentadora de televisão, mas um político. Isso é um passo gigantesco. Sobretudo, porque o futuro inquilino da Casa Branca se chama Barack Hussein Obama e é filho de um imigrante do Quénia e de uma branca do Kansas. Um homem do mundo.
HOMEM QUE NÃO PODE FALHAR
Pedro LombaJurista - pedro.lomba@eui.eu
Já são tantas e tão variadas as explicações para a vitória de Obama que eu devia ter o cuidado de não me meter nisso. Mas tenho verificado que cada um tem o seu Obama. Nada de anormal, diga-se. Se alguém se torna Presidente da nação mais dividida do mundo, é porque chegou com êxito a públicos diferentes. Pode ser o Obama "espiritual" que ilumina os descontentes com homilias. Pode ser o "social-democrata" que promete o que nunca existiu na América: um Estado social europeu. Pode ser o membro da geração pós-anos 60 que apareceu na altura exacta em que os americanos se fartaram quase em absoluto das guerras culturais. Ou podem ser coisas mais elementares que até encaixam numa visão realista sobre o que deve ser a política. Primeiro, uma autoridade ética que ele sempre invocou nos seus ataques à Administração Bush (era fácil) e que lhe granjeou apoios à esquerda e à direita, dentro e fora de portas. Depois, a capacidade para a liderança: num tempo de crise e insegurança a sério, já ninguém tem paciência para políticos que causam um ruído dispensável e cuja competência para altas andanças é mais que duvidosa (e foi esse o problema de McCain no momento em que cedeu à escolha de Palin para "vice"). Ninguém sabe que tipo de líder vai ser Obama, mas uma coisa é certa: as pessoas querem recuperar o respeito por aqueles que as governam. Finalmente, Obama promete mudanças e algumas boas mudanças como o fim de Guantánamo, a abolição da tortura, reduções de impostos para a classe média e novas políticas na saúde, energia e ambiente que parecem justas e acertadas. O filósofo político inglês, Edmund Burke, dizia que "um estado sem meios de mudança é um estado sem meios de conservação" e tinha razão.As condições políticas ao dispor de Obama também são únicas. Os americanos estão com ele, o congresso está com ele, a Europa e o mundo também. Tanta "unanimidade" pode ser perigosa, mas foi esta mesma "unanimidade" que o elegeu. Já se diz por aí que ele irá errar muitas vezes e por certo que irá errar muitas vezes. Mas também ninguém espera que ele seja um presidente normal e inconsequente. A obamania precisa de continuar.Obama tem agora muito trabalho pela frente. Pela primeira vez na sua História, a América enfrenta a hipótese do seu próprio declínio económico e, por arrastamento, internacional. Há a crise financeira, mas não há apenas a crise financeira. Um pouco por toda a parte tem-se formado a ideia de que um certo tipo de capitalismo, o anglo- -saxónico, está esgotado e que os próximos tempos vão pôr em confronto tipos diferentes de capitalismo. É verdade que Obama não é um utópico e experimentalista, graças a Deus, mas sensato e moderado. Sabe falar e ouvir; vamos ver se também sabe fazer.
AMÉRICA VOTOU - NOVO CICLO
Maria José Nogueira PintoJurista
As dúvidas dissiparam-se, pelas duas e trinta da madrugada, quando as projecções das grandes estações de TV deram a vitória de Obama no Ohio e na Pensilvânia.São dois Estados com uma forte componente de operariado e pequena classe média branca, em que McCain investira na fase final da campanha e que tinham parte da decisão nas mãos, com os seus 41 votos no colégio eleitoral. A queda para Obama destes Estados lembrava também a grande viragem na campanha e o decisor da eleição: o crash de Wall Street na ocasião precisa em que as sondagens revelavam que McCain começava a chegar à frente. Mas a catástrofe económica, a recusa de uma parte dos congressistas republicanos de votar o Plano Paulson, as hesitações do candidato, tocaram de morte a causa do duo McCain-Palin.A economia liquidava o candidato republicano, como em 1992. Sobretudo nestes Estados com uma componente de blue-collars conservadores em religião e costumes. E ressurgiu, nesse sector do eleitorado, aquela impressão de que a Presidência Bush, que, além da guerra do Iraque, corporizava um "governo dos ricos, pelos ricos e para os ricos". Impressão excessiva, mas que, juntando às desgraças da economia e do povo a ideia de que umas dúzias de gestores, de lobbystas e de políticos corruptos, forrados com milhões de dólares de comissões e especulação, deu o golpe final nas aspirações dos republicanos.Porque muito fez McCain, para conseguir o resultado que conseguiu, com uma etiqueta republicana que a equipa no poder tinha posto pelas ruas da amargura.Assim se fecha um longo ciclo de hegemonia conservadora na política americana - apoiado a partir de Reagan em 1980 na aliança Sul-Middle West, blue-collars, evangélicos e republicanos tradicionais, que mesmo na era Clinton manteve o Congresso. A gestão de George W. Bush e Dick Cheney deu cabo dessa aliança. Como no Congresso e nos governos estaduais, a vitória dos democratas foi muito significativa, começa um novo ciclo político.Não me preocupa a vitória de Obama; só vai incomodar um bocadinho o barulho que a "esquerda festiva", por cá, vai fazer à sua volta. Até começar, daqui a seis meses, a manifestar a sua desilusão com o novo Presidente americano… Porque Obama é um político e estratega consumado no modo como apareceu, ganhou a nomeação democrática à todo-poderosa Hillary Clinton, captou as forças do capital - de Warren Buffet a Paul Volcker - e parte do establishment conservador americano e internacional.Por isso teve 600 milhões de dólares para a campanha. Que não podiam vir de "pequenas" contribuições de 50 dólares na Internet, num país de 300 milhões de habitantes! E acabou endossado por toda a gente, incluindo intelectuais conservadores - como o incontornável Fukuyama, do "fim da História" - e uma série de personalidades que na semana final se juntaram ao carro do vencedor.Obama vai ter uma das mais difíceis presidências da história americana: duas frentes de guerra - Iraque, difícil e vital para a política do Médio Oriente, e o Afeganistão, que nem sequer é um país, mas um conglomerado tribal, de "senhores da guerra" e fanáticos, que serviu de cemitério, sucessivamente a ingleses e soviéticos. O risco de recessão, com o acréscimo da dívida pública para a cobertura de Bancos e Seguradoras falidos. A questão do macroterrorismo. E os problemas de que fez bandeira - a saúde, a educação, as cidades, a pobreza.E também, a necessidade de redefinir o papel dos Estados Unidos perante um mundo que mudou muito. E onde não é possível, ao mesmo tempo, enfrentar o islamismo radical, hostilizar a Rússia e inquietar a China, e ter a política externa condicionada por lobbies de interesses e agendas ideológicas.Mas Obama tem, com um Congresso da sua cor e uma grande dose de expectativa favorável interna e externa, uma oportunidade de refazer, em face a face com o resto do mundo, uma ordem internacional estável e equilibrada. Deus o ajude, e a nós também.
A grande virada
De:JVerdasca
Os Estados Unidos da América acabam de dar - ao mundo - a maior lição de DEMOCRACIA e HUMILDADE do século. Elegendo um afro-americano (está errado designá-lo negro, muito menos preto) para o mais alto cargo político-administrativo, do mais RICO, PODEROSO e AVANÇADO Estado do Planeta, e - NOTE-SE - DE ESMAGADORA MAIORIA BRANCA - os americanos agira com a razão, escolheram o mais indicado para o cargo e neste momento, optaram PELAS MUDANÇAS POSSÍVEIS (que não se esperem loucuras e irresponsabilidades tipo PREC português). É certo que a DESILUSÃO de mais de metade dos americanos com o STATU QUO foi grande e traumática, dado o desastre econômico-financeiro-social provocado pela ganância, pela incompetência, pela irresponsabilidade de muitos gestores do grande capital e pelos governantes cuja obrigação era FISCALIZAR operações fraudulentas, salários ASTRONÓMICOS COMO O DO PRESIDENTE DO BANCO DE PORTUGAL, onde as mazelas se seguem umas às outras, dizia, que a desilusão foi traumática, e deve ter influenciado a escolha do candidato e do partido, a revelar que a ÉTICA está viva, a DIGNIDADE ainda mora nos corações e o sentido de justiça está de novo aflorando, com a honestidade sobrepondo-se à sem-vergonhice.
LIÇÂO de DEMOCRACIA e HUMILDADE, que decerto será muito absorvida e aproveitada, dado que todo o Planeta esteve e continua virado para a grande nação lider do mundo, exemplo de democracia, ordem e liberdade, mas que sabe MANTER a AUTORIDADE quando necessário se torna proteger cidadãos e bens, princípios e leis, sem discursos lamechas ou pseudo-direitos bandidos para quem os direitos do verdadeiro cidadão não existem, são letra morta, enfim, quando se sabe QUE TODO O DIREITO IMPÕE UM DEVER, e se um dia - e BEM - foi proclamada a DECLARAÇÃO dos DIREITOS do HOMEM e do CIDADÃO, ficou faltando a correspondente DECLARAÇÃO dos D E V E R E S do HOMEM E DO CIDADÃO. À NÃO-discriminação terá que - obrigatoriamente - seguir-se A FORMAÇÃO total e geral dos cidadãos com vistas aos aproveitamento de todas as inteligências; uma mais equitativa distribuição de renda, e uma mais JUSTA IGUALDADE de OPORTUNIDADES, para todas as etnias, para todas as classes sociais, para todos so cidadãos. HÁ muitas classes de indivíduos, muitos "líderes", muitos privilegiados e outros que AINDA se levam demasiadamente a sério, julgando-se SUPERIORES, quando, na realidade, são inferiores em muitos aspetos, podendo, embora, ser superiores em um ou outro. O MUNDO TEM QUE MUDAR e MELHORAR.
Caminhemos nesse sentido. Jverdasca
Opinião
A cara da mudança
A histórica vitória de Obama vem carregada de simbolismo e propõe-nos várias leituras. O povo americano revelou-se farto do rumo republicano e fê-lo votando num democrata afro-americano. Para mim, um presidente negro nos Estados Unidos era uma imagem que pertencia exclusivamente ao domínio da ficção.
Até ontem. É impossível não pensar nas palavras de Martin Luther King aquando do brilhante discurso em Washington que viria a ficar gravado na nossa memória colectiva. "Eu tenho um sonho: que os meus quatro pequenos filhos venham a viver numa nação onde não sejam julgados pela cor da sua pele mas pelo conteúdo do seu carácter." O novo residente da Casa Branca veio mostrar que o tal dia sonhado chegou. Há 50 anos, um negro nem se podia sentar ao pé de um branco no autocarro. Neste preciso momento, nos EUA nascem meninos e meninas que crescerão num país governado por um afro-americano. Mesmo que as coisas não lhe corram de feição na dura missão que tem pela frente, até porque a tarefa não lhe será facilitada, Barack Obama já marcou a história e a nossa era. Os americanos votaram na cara da mudança. Não votaram na cor da pele dessa cara. E nós, por todo o Mundo, voltamosa acreditar. Na capacidade de mudança e na evolução da raça humana.
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06 Novembro 2008 - 00h30
Quintas do Norte
Promessa para 2009
Obama traz optimismo para mudar os EUA e o Mundo. Por cá, o Governo apresenta um Orçamento do Estado que promete controlar uma crise de que ainda não sabemos a verdadeira dimensão e cuja duração depende essencialmente do comportamento das grandes economias internacionais.
Aqui pelo Norte, as PME olham com expectativa positiva o anúncio de que o Estado vai pôr as suas dívidas em dia – felizmente, a polémica à volta do salário mínimo morreu - e os cidadãos olham com esperança as promessas de melhoria e de apoio ao desenvolvimento da região. O ano que aí vem está envolto em boas promessas, para o Mundo, para o País e para a Região. Pois, que se cumpram!
Rogério Gomes, Colunista
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06 Novembro 2008 - 09h00
Opinião
Passar à frente
“Os EUA querem enterrar a Administração Bush, a Cimeira das Lajes, a guerra no Iraque e Guantanamo”
Num instante os EUA passaram para a frente da civilização. Acabam de eleger um afro-americano para a Casa Branca, revalidando o mito do ‘Melting pot’ com que iniciaram a fusão de populações de vários continentes que emigraram para o Novo Mundo. Há outras sociedades ocidentais com boas intenções sobre a integração racial mas nenhuma elegeu ainda um presidente negro. Lá nas alturas ressoam as orações de Luther King: "Tive um sonho" ou o profético "Subi ao alto da montanha…" Luther King é um dos maiores vencedores destes novos dias, quarenta anos depois do movimento dos direitos cívicos. A eleição presidencial de Barack Obama não se esgota nessa ilustração excepcional da igualdade de oportunidades. Ela é um indicador de que os EUA querem enterrar a Administração Bush, a Cimeira das Lajes, a guerra no Iraque e as torturas em Guantanamo. Querem reaparecer com a face rejuvenescida de ‘potência benevolente’ perante um mundo em mudança e a requerer mais cooperação do que guerras. Por isso, nem um moderado como McCain chegou para evitar a derrota dos conservadores nas Presidenciais e nas eleições para o Congresso.
É verdade que Obama teve enormes meios financeiros para levar por diante a campanha, a mais cara de sempre de um candidato democrata. Mas isso não explica tudo, sobretudo o significado da vitória. Não explica a mobilização dos apoiantes nem a expressiva participação eleitoral. E muito menos o movimento de esperança que, com epicentro em Chicago, se espalhou pela Terra inteira.
São exigentes os desafios que o novo presidente tem pela frente. Em primeiro lugar, organizar a resposta à crise económica e financeira e avançar com um esquema de maior governança mundial da globalização; depois, responder aos anseios de disciplina ambiental e energética sem diminuir o crescimento sustentável; e ainda contribuir para que os conflitos sejam resolvidos dentro das regras do Direito Internacional e pelo sistema das Nações Unidas, de preferência. No imediato, vamos assistir aos sinais emitidos pela escolha dos mais directos colaboradores, certamente uma mistura entre antigos conselheiros de Bill Clinton e gente descomprometida com os vícios de Washington. Vícios de Washington que tanto animaram as primárias. Obama bem disse no discurso de vitória que os desafios que tinha pela frente requeriam tempo para serem ultrapassados. Falou mesmo em mais do que um mandato. Ele não quer ficar na História como alguém que foi eleito para desiludir.
José Medeiros Ferreira, Professor Universitário
Opinião
Blog
Obama é jovem. É o primeiro negro na Casa Branca. Ganhou civilizadamente a um civilizado McCain (o seu discurso de aceitação da derrota é exemplar). Esperam-no tarefas difíceis dentro e fora dos EUA, sobretudo porque a expectativa é grande e perigosa. Mas, também, porque a América precisa de confiança, de prosperidade e de paz.
Obama é o colírio ideal para devolver à América um pouco de orgulho e de ambição, coisas que Bush desperdiçou sem obter nada em troca. Por outro lado, o fim da era Bush é um momento de esperança para o pensamento liberal e para os conservadores, que têm a oportunidade de se libertar do ‘republicanismo velho’. Mas a hora é de Obama. Pode ser que ele tenha jeito de fingidor e tenha um sorriso de plástico – mesmo assim. A América precisa de sorrir.
Francisco José Viegas, escritor
Bilhete Postal
Ganhou porquê?
Obama ganhou porque soube personificar a diferença face a um dos piores presidentes da História americana. Porque conseguiu aglutinar em torno de si as muitas vertentes do descontentamento que os últimos oitos anos despertaram. Ganhou porque é o melhor comunicador político de que me consigo lembrar.
Porque fez uma campanha sem erros estratégicos. Obama ganhou porque é um daqueles raros líderes que conseguem animar esperanças novas e diferentes nas pessoas mais desiguais. Obama ganhou porque o partido republicano se converteu numa união impossível de ideologias discrepantes. Porque a direita americana não realizou a separação higiénica entre política e religião. Obama ganhou porque essa é a melhor forma de os Estados Unidos consolidarem a sua supremacia mundial.
Carlos Abreu Amorim, Professor Universitário
OS DESILUDIDOS António VitorinoJurista
Os órfãos e as viúvas da Administração Bush consolam-se da derrota antecipando que o novo Presidente americano irá inevitavelmente desiludir os seus fervorosos apoiantes europeus, que situam sobretudo à esquerda.Cometem um duplo erro.Os índices de apoio à eleição de Obama na Europa são muito mais transversais no espectro político do que nos querem fazer crer. Eles exprimem mais o cansaço com a política americana destes últimos anos e o impasse a que chegou a relação transatlântica do que propriamente uma identificação ideológica em sentido estrito.Por outro lado, esse apoio e a atenção com que toda a eleição presidencial americana foi seguida aqui no Velho Continente constituem o mais eficaz antídoto contra o sentimento anti-americano tanto de sectores da esquerda como da direita europeia.Logo, nem a vitória de Obama é apropriável pelo conjunto da esquerda europeia nem representa um momento de reconversão de certas direitas europeias.À esquerda, as correntes antiamericanas provavelmente até teriam preferido que prevalecesse uma lógica de quanto pior melhor, uma lógica de continuidade em relação à cessante Administração americana. E à direita a linha de demarcação é bem mais ideológica: independentemente dos erros e das falhas da candidata a vice-presidente Sarah Palin, é ela e o que representa que verdadeiramente mais entusiasmam os que agora carpem mágoas pela derrota de McCain.No meio disto tudo será fácil fazer de George W. Bush o bode expiatório da derrota republicana. Claro que a impopularidade do Presidente cessante terá pesado no resultado eleitoral (não tanto o Iraque, mas sobretudo a crise financeira, preocupação maior de quase dois terços dos eleitores americanos a 4 de Novembro). Mas o resultado desta eleição é também o julgamento (e sanção) de oito anos de hegemonia neoconservadora, cujos resultados estão à vista. Importa que tal sanção não seja levada apenas a débito da inépcia do ainda Presidente, deixando passar entre as malhas do resultado os seus autores morais.E é aqui que reside a fonte da vitória de Obama. Para além de beneficiar da crise financeira (a qual lhe permitiu algumas tiradas mais eleitoralistas de que ainda poderá vir a arrepender-se no futuro), a grande linha de demarcação foi a de um contraponto ideológico e até cultural, um sentido de coesão e de respeito pela diversidade, expresso tanto no plano da política interna como no da política externa. Por isso, a primeira prioridade do novo Presidente será a de reunificar política e culturalmente a América em torno dos valores que os eleitores sufragaram tão expressivamente, o que aqui e além poderá até desiludir alguns dos seus apoiantes europeus... Mas nenhuma ingenuidade é consentida: Obama foi eleito Presidente dos EUA e é em nome e em função dos interesses da América e dos americanos que irá governar!A eleição de Obama tem um significado simbólico incontornável, tratando-se do primeiro Presidente proveniente da comunidade de origem africana. Nesse significado vai um mundo de sentimentos e de esperanças que apela ao imaginário colectivo não apenas nos EUA mas também à escala planetária. Mas por muito importante que seja a eleição de um Presidente de raça negra, não seria justo para o próprio Obama que a sua eleição se reconduzisse apenas a essa dimensão histórica e simbólica. Aliás a forma como Obama calibrou a questão racial durante os dois anos da sua campanha pode ser considerada magistral e a sua eleição premiou essa clarividência e esse sentido de equilíbrio.A eleição de Obama representa também uma janela de oportunidade de relançamento da relação transatlântica, essencial tanto para os EUA como para a Europa. Perante a magnitude dos problemas com que estamos confrontados, o sucesso desta reaproximação dependerá tanto da forma como Obama a liderar como da resposta conjunta que os europeus estiverem dispostos a dar-lhe.Cabe agora ao resto do mundo aproveitar o espaço aberto pela eleição de Obama. Até porque a maior desilusão é sempre aquela que vem de não fazermos aquilo que nos compete a nós próprios fazer.
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16 Agosto - Os jogadores do Sporting mostram ao mundo a mais recente conquista, após baterem a Supertaça frente ao FC Porto
Porto, 26 Julho - O FC Porto apresentou a equipa para a época 2008/09 e para a posteridade ficou a foto de família em pleno relvado do Estádio do Dragão
Os Benfiquistas não esquecem o cebola....
Lisboa, 9 Agosto - A apresentação do Benfica aos sócios decorreu este sábado no meio de grande entusiasmo. Antes do embate com o Feyenoord, os artistas mostraram-se aos adeptos.
Porto, 9 Maio - A decisão da Liga em castigar o Boavista com a pena de descida de divisão deixou os adeptos boavisteiros desolados e revoltados. Manuel do Laço, conhecido simpatizante do clube, não escondeu mesmo as lágrimas
Porto, 11 Janeiro - O FC Porto apresentou o monolugar com que irá competir na Superleague Fórmula. Na cerimónia, "apadrinhada" pelo plantel do futebol, marcaram presença, entre outros, os pilotos Tiago Monteiro, Álvaro Parente, Armindo Araújo, Pedro Matos Chaves e Ni Amorim
Porto, 8 Julho - O FC Porto apresentou ao início da tarde os equipamentos para a temporada 2008/09, destacando-se o alternativo azul celeste
Appiano Gentile, 18 Julho - O Inter Milão apresentou os novos equipamentos para 2008/09. Adriano, Zanetti, Júlio César, Materazzi e Mancini, acompanhados por Mourinho, serviram como modelos.
Roma, 7 de Maio - Antes de defrontar a Lazio a contar para as meias-finais da Taça de Itália, o plantel do Inter de Milão, com Figo, Maniche e Pelé, foi recebido pelo Papa Bento XVI. É a segunda vez que Maniche vai ao Vaticano.
Milão, 2 Junho - Mourinho junto com funcionário do Inter pouco depois da chegada à capital lombarda, que ocorreu às 22.30. No aeroporto foi notório o acotovelamento dos jornalistas para tirar o melhor "boneco" ao "Special One
Milão, 3 Junho - Mourinho apresentado oficialmente como treinador do Inter. O português respondeu durante quase uma hora a perguntas de dezenas de jornalistas. Foi o primeiro show “Il Speciale” em Itália
simple THE BEST
ROKET
Paris, 8 Junho - Nadal recebeu um troféu que já conhece bem pela quarta vez consecutiva. Na final de Roland Garros, o tenista espanhol venceu Roger Federer por 6-1, 6-3 e 6-0
Freetwon, 20 Janeiro - Freetwon, 20 Janeiro - David Beckham esteve Serra Leoa como Embaixador da Boa Vontade da UNICEF. O ex-capitão da selecção inglesa esteve na capital e também viajou por diversas áreas rurais. Como não podia deixar de ser rolou a bola...
capitão sul-africano John Smit, ladeado pelo presidente Thabo Mbeki, levanta o troféu de campeão do Mundo de râguebi após triunfo (15-6) sobre a Inglaterra na final
Stefano Gabbana --- Madonna ---- Domenico Dolce
New Jersey, 5 Fevereiro - O espanhol Pau Gasol, ex-Memphis Grizzlies, contribuiu com 24 pontos e 12 ressaltos para a vitória dos Lakers por 105-90 sobre os New Jersey Nets. Foi uma estreia em grande
São Petersburgo, 18 Fevereiro - O tenista Roger Federer venceu a categoria de "Atleta Masculino do Ano" no decorrer da cerimónia dos Laureus World Sports Awards, realizada em São Petersburgo. É a quarta vez consecutiva que o suíço, de 25 anos, recebe esta distinção, um recorde
Londres, 5 Julho - Venus Williams, ao superar a irmã Serena em dois sets - 7-5 e 6-4, conquistou o Torneio de Wimbledon pela quinta vez na sua carreira. Venus tinha já triunfado na relva de Wimbledon em 2000, 2001, 2005 e 2007
Melbourne, 25 Janeiro - As ucranianas Alona e Kateryna Bondarenko conquistaram o título de pares do Open da Austrália, ao baterem na final a dupla composta pela bielorrusa Victoria Azarenka e pela israelita Shahar Peer
Londres, 6 Julho - Rafael Nadal trinca a taça de Wimbledon, depois da épica vitória sobre Federer, numa maratona de ténis que durou quase cinco horas (4:48) e interrompida duas vezes devido à chuva
Opinião - Pedro Camacho
Um novo mundo?
Começando pelos primeiros. O intenso debate sobre a legislação para evitar o colapso do sistema financeiro e da economia americana mostra a dimensão da revolta e desconfiança de importantes sectores da sociedade americana em relação às suas lideranças políticas. Este ponto tem sido pouco acentuado entre nós.
Quando a Câmara dos Representantes chumbou a legislação inicialmente submetida pelo secretário do Tesouro Hank Paulson ao Congresso no início da semana, concentrámos toda a nossa atenção e perplexidade na revolta dos republicanos contra George W. Bush. Esquecemo-nos de que os democratas têm a maioria absoluta na Câmara dos Representantes e que 95 dos seus representantes também votaram contra a legislação negociada, aprovada e anunciada por Nancy Pelosi, líder da maioria democrata, e Barney Frank, presidente do Comité dos Serviços Financeiros.
O que é que isto mostra? Mostra que, para lá de uma revolta republicana contra George W. Bush - que é real -, há uma enorme desconfiança e desprezo de largos sectores da sociedade americana em relação aos seus líderes políticos democratas e republicanos. Tal como muitos bancos e empresas, Washington está sem capital político e sem crédito.
Em termos externos, o principal desafio de Washington será mudar a percepção que os líderes políticos estrangeiros e as suas sociedades têm dos EUA. Esta percepção tende hoje em dia a ser bastante negativa. Uma das grandes acusações que são feitas a George W. Bush é ter transformado os EUA numa "nação perigosa" e ideológica. Do ponto de vista histórico a acusação não faz sentido. Como John Quincy Adams, o sexto Presidente dos EUA, escreveu em 1817, a Europa via a América como "um membro muito perigoso da sociedade das nações". Um olhar para os discursos de Adams mostra também que os EUA foram desde a sua fundação um país extremamente ideológico. Ao contrário do que as pessoas pensam, dizem e escrevem, a Administração W. Bush não é uma aberração na história política americana.
O que é novo e significativo do ponto de vista estratégico é a dimensão da oposição e ressentimento em relação aos EUA e às suas políticas. Esta oposição e ressentimento são hoje em dia generalizadas e são também o grande acontecimento político da geração que cresceu à sombra do 11 de Setembro. Como Geoffrey Wheatcroft escreveu no 'International Herald Tribune' no início de Setembro, os EUA "não são temidos nem respeitados". Do ponto de vista da credibilidade política, ideológica e financeira, as últimas semanas foram péssimas para os EUA. Os próximos anos prometem dificuldades. Nada será como dantes, dizem-nos.
É provável. A política internacional, felizmente, não é uma coisa estática. A ascensão e declínio dos impérios, cidades-estado e países é uma coisa natural. O declínio dos EUA é algo que tem vindo a ser regularmente previsto e intensamente desejado nas últimas décadas. As previsões de declínio ignoram os tendões e os músculos do país - a pujança demográfica da América, a dimensão do seu mercado interno, a sua enorme produtividade e capacidade de inovação, a qualidade das suas universidades e instituições de investigação científica, a capacidade empreendedora dos americanos e a sua enorme determinação perante dificuldades e desafios. Nos dias que correm, apostar publicamente a favor dos EUA não é fácil. Pela parte que me toca, estou disposto a fazê-lo. A América continua a ter tudo o que é necessário para ter um futuro brilhante. Aceito apostas. Haverá interessados?
O vice-almirante James Bond Stockdale (1923-2005) foi um candidato improvável à vice-presidência dos EUA em 1992. "Quem sou eu? O que é que eu faço aqui?", perguntou ele no início do debate com Al Gore e Dan Quayle perante a incompreensão geral. Do ponto de vista político, o debate foi um desastre para Stockdale, que rapidamente foi esquecido. Stockdale merece ser relembrado na semana do debate vice-presidencial entre Sarah Palin e Joseph Biden pela sua extraordinária carreira militar e pela sua liderança dos prisioneiros de guerra americanos no Vietname entre 1965 e 1973. O seu livro 'Confessions of a Philosophical Fighter Pilot' (Stanford, Califórnia: Hoover Institution Press, 1995) é um grande livro sobre liderança e sobrevivência em situações extremas.
Miguel Monjardino
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Vamos a factos. O capitalismo, com mais ou menos crises, representou um enorme avanço civilizacional na autonomia e liberdades individuais. Essa pulsão, que vem desde o Renascimento, mantém-se ainda hoje. As sociedades mais livres, onde o homem consegue maiores realizações pessoais, artísticas e empreendedoras, são capitalistas.
As alternativas ensaiadas a este modelo resultaram ou em anarquias improdutivas (recorde-se Robert Owen e a sua experiência em New Harmony) ou - o que foi mais frequente - em ditaduras ferozes, apenas capazes de distribuir riqueza pelas suas próprias oligarquias. Hoje em dia, o capitalismo funciona em todo o mundo e, se nos EUA e na Europa sofre uma crise, continua vigoroso, por ora, na China, na Venezuela ou em Angola. Nesses países em que o Estado intervém de forma total na economia e mesmo nos mercados financeiros, a distribuição da riqueza resume-se aos aliados, amigos e afilhados dos respectivos regimes.
O que falhou, então, no nosso capitalismo? A resposta deu-a em parte Miguel Sousa Tavares na sua crónica da semana passada: falhou a ética e abundou a ganância e o crime económico.
O capitalismo pode funcionar com mais ou menos intervenção estatal, mas regula mal, é totalmente pérfido se não estiver associado àquela ética estrita de que falava Max Weber em 'A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo'.
Nesse aspecto, não foi preciso vir a esquerda alertar para os danos do capitalismo - a Igreja Católica andava a pregar isso mesmo há anos.
Não foi o mercado em si, nem tão pouco a ausência de reguladores que provocou esta crise. Foi a falta de senso e a cobiça extrema. Ora, estes são males que não são específicos do capitalismo, mas do género humano. A crise resulta, de facto, de uma maneira de ver e de uma organização social. Mas, infelizmente para certa esquerda, não se compõe com as suas receitas.
Henrique Monteiro
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Comentadores de bancada cheios de razão. O pior de Portugal nestes campeonatos foi contentar-se com pouco e usar o futebol e as pequenas vitórias para as piores exibições de marialvismo e bacoca exaltação patriótica.
Portugal precisa de uma vitória, e não é de uma pequena vitória. Não precisa do culto da personalidade a que temos assistido. Os "posters" de Ronaldo, as pancartas de Ronaldo, os anúncios de Ronaldo, as revistas detalhando a vida íntima da Ronaldo e das amigas de Ronaldo, a família de Ronaldo, os milhões de Ronaldo. Vencidos à procura de um vencedor. A política, como o futebol, precisa de vitórias e de mobilização, e nada nos últimos tempos parece estar em condições de tirar Portugal da mais funda depressão, nem o Ronaldo e os seus milhões, nem o futebol e a Selecção, nem as prédicas de Sócrates e Ferreira Leite. Muito menos os avisos banais do Presidente da Republica.
Os espanhóis não são muito diferentes dos portugueses, nem de outros povos, no que toca a derrotas e vitórias. A crença na vitória em Espanha, pelo menos no futebol, adoptou um slogan roubado a Obama, "Juntos Podemos". Este "Juntos Podemos" serviu de mantra e de oração, serviu de mote e de poema, e foi repetido como um acto de fé até se tornar uma realidade. Quem ouviu como eu os comentários da população e das televisões, ouvia estas palavras repetidas como se não houvesse outro caminho a não ser este. O colectivo. Em Espanha, país de um individualismo extremo, é um fenómeno novo. Um cínico diria que tudo isto é um disparate, mas estes disparates têm um efeito poderoso nos comportamentos colectivos. Portugal não tem, em nenhuma das suas frentes mobilizadores do orgulho nacional ou da satisfação do trabalho bem feito, um única acção ou frase que o mobilize. Somos um povo quebrado por anos de sacrifícios inúteis. De privações, de malícias e péssimas governações. E quebrado pelo provincianismo que faz com que saudemos como providencial o que é medíocre e como genial o que vem do estrangeiro.
O presidente da TAP dizia há pouco tempo que está cansado e que será muito difícil recuperar a TAP outra vez. Grande frase de derrota. A frase aplica-se a Portugal, estamos cansados. Cansados de dificuldades. Em vez de trabalho colectivo, veneramos o sucesso individual e o dinheiro dos outros. Assim, não vamos lá. Juntos, não pudemos. Num tempo de medo e recessão, de dúvida e lassidão, o país pensa em que vai substituir Scolari, o homem providencial. Não pensa no que o país é capaz de fazer sem Scolaris, sem Mourinhos, sem Ronaldos. Muitos contratos, muito dinheiro, pouco trabalho. Bem dizem os espanhóis, que vivem muito melhor do que nós.
Clara Ferreira Alves
Seria de esperar da sua parte talvez alguma humildade, algum embaraço, quem sabe mesmo, alguma vergonha: afinal de contas, ele foi um dos principais responsáveis pelo estado do mundo e ainda anda a facturar fortunas a falar dos 'problemas' que ajudou decisivamente a criar! Mas, se alguém esperava tal coisa, esperou em vão. Descontraído e sorridente, Tony Blair puxou de umas notas avulsas e deu conta das suas recentes andanças pelo mundo: esteve em Pequim, nos Jogos Olímpicos, esteve no deserto, numa tenda com Kadhafi, esteve aqui e ali, derramando a sua vasta experiência sobre os 'problemas', para poder concluir em Lisboa que "os problemas são globais e precisam de soluções globais". Mais uns quantos lugares-comuns de profundidade semelhante e a repetição de que o trabalho tem de ser flexível e a Segurança Social tem de ser reestruturada. E pronto. Suponho que lhe terão batido palmas e agradecido muito a lição e o incómodo. E lá se foi Tony Blair, sorridente, para o seu próximo compromisso global. É assim que se governa o mundo, nos tempos de agora.
2 Já aqui falei antes sobre um problema particular que o PSD, o país e todos nós temos: ter de estar sempre a encontrar uma ocupação para Santana Lopes. E tem de ser uma ocupação política e um cargo público, porque é tudo o que ele quer e pode. Agora, germina no PSD a originalíssima ideia de voltar a entregar ao 'menino-guerreiro' o 'combate' pela Câmara de Lisboa. Não admira que o próprio tenha já esclarecido que combates desses "não se recusam". O que admira e confrange é que a gente que sabe o que a casa gasta, como Manuela Ferreira Leite ou Marcelo Rebelo de Sousa, estejam dispostos a voltar a entregar Lisboa ao pior presidente da Câmara que Lisboa teve, desde um tal Aquilino, do PS. O raciocínio é este: nós livramo-nos do Santana e, se os lisboetas votarem nele, o problema é deles. Sim, eu sei, a culpa é da ordem natural das coisas: a democracia é uma senhora sem memória nem pudor, uma espécie de maria-vai-com-todos. E, se são os próprios eleitores que estão dispostos a cobrir tudo com um manto de impunidade, porque não aproveitar?
4 A história de capa da última edição do EXPRESSO, sobre as 3200 casas atribuídas discricionariamente e em condições privilegiadíssimas pela CML, ao sabor das 'cunhas' e dos favores pessoais, é, de certo modo, a história deste país - desde, pelo menos, o tempo das Descobertas, quando se comandavam naus por 'cunhas' e favores. Em si mesma, a história apenas confirma hábitos de há muito conhecidos e factos concretos de há muito suspeitados. Isso não espanta, o que espanta são as explicações fornecidas pelos beneficiários do sistema instalado. Há a vereadora da Habitação, a quem compete atribuir casas e que acha que o facto de ela própria ter sido no passado uma das felizes contempladas em nada a desqualifica para as suas funções. Há o director de serviços da CML, que recebeu uma casa porque se tinha divorciado e precisava de outra e que, embora entretanto já se tenha recasado e mudado, mantém a casa da Câmara, com uma renda simbólica, porque, diz ele, nunca se sabe se amanhã não se volta a divorciar e a precisar outra vez da casa. Há os presidentes das Juntas de Freguesia, que acham 'normal' que os filhos tenham beneficiado de casas, porque "são cidadãos como outros quaisquer" (embora na altura tivesse constado na praça que não valia a pena concorrer porque as casas já estavam destinadas às famílias dos senhores membros das Juntas de Freguesia). E há o grande jornalista BB, campeão da indignação e da ética, que recebeu uma casinha porque a sua estava velha e atravessava problemas financeiros, mas que acha que revelar qual é a renda que paga por coisa pública, para que melhor se possa avaliar o favor de que beneficia, é "um assunto privado". Todos sem excepção acham a sua situação normalíssima e o grande jornalista até acha que tudo não passa de uma cabala dos seus inimigos e do preço a pagar pela sua frontalidade. De facto, como ele diz, "ser livre é muito difícil". Então não é?
Para o escritor nova-iorquino, essa auto-regulação é "falsa", pois o "capitalismo tende a auto-devorar-se, a assumir cada vez mais riscos, e o que agora vemos são as consequências da execução de más ideias".
Auster defendeu ainda a existência de um Governo que tome medidas de maior carácter regulatório. "Se não o fizer, em dois anos pode ser que comecemos a passar fome", acrescentou.
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1 -Todos os Verões, Portugal e muitos outros países se debatem com o flagelo dos fogos florestais. A explicação, quando não tem origem criminosa, radica na acumulação de combustíveis florestais (matos, caruma, etc.) em terrenos que não são limpos pelos seus proprietários ou estão ao abandono. Além do mais, a limpeza dos terrenos custa muito esforço e bastante dinheiro.
Esta semana, a Impresa, empresa proprietária do Expresso, e a Água do Luso entregaram o Prémio Ideias Verdes aos responsáveis de um projecto já testado, que é um verdadeiro ovo de Colombo: utiliza cabras que, controladas por cercas, devoram literalmente todos os resíduos florestais que estão na origem dos fogos.
Os projectos-piloto na serra de Sintra e em Grândola foram um sucesso. Segue-se o primeiro projecto em larga escala nas serras de Aires e Candeeiros. As cercas que controlam a zona de actuação das cabras são alimentadas com energia solar e cada animal leva um chip na coleira, que permite a sua localização via GPS num telemóvel. É a junção da modernidade à ruralidade, à ecologia e à defesa do ambiente. E a prova de que uma excelente ideia não precisa de milhões para se concretizar.
3 - A Chevrolet promoveu um concurso de Artes Aplicadas. Houve 41 propostas de 15 países. Paulo Branco, 23 anos, ficou em terceiro na categoria de fotografia, Ricardo Trindade e Rafael Gonçalves, ambos com 22, ficaram em segundo na categoria de artes visuais. E Trindade não tem pejo em dizer: "Quero ser o próximo designer da GM". Quem disse que esta é uma geração mal preparada e sem ambição?
Se Barack Obama for eleito em Novembro - e vale a pena acentuar a dúvida - e estes equívocos não forem esclarecidos, 2009 promete surpresas muito desagradáveis em ambos os lados do Atlântico. Obama, obviamente, sabe isto melhor do que ninguém. Num discurso em Washington na terça-feira, o senador democrata disse que a sua estratégia de segurança nacional assentará em cinco pontos: pôr fim à guerra no Iraque de uma forma responsável; acabar a luta contra a Al-Qaeda e os talibã no Paquistão e Afeganistão; impedir os terroristas e os estados-pária de ter acesso a armas e material nuclear; conseguir a segurança energética; reconstruir as alianças dos EUA para enfrentar os desafios do século XXI.
A mensagem para os líderes e eleitorados europeus foi clara - "Sim, nós podemos!". Dito de outra forma, Obama espera que os países europeus façam muito mais nas áreas da política e segurança internacional. O Afeganistão é o melhor exemplo. Nos próximos dias, os recados públicos e privados do candidato presidencial democrata aos líderes e sociedades europeias serão óbvios. Muitos destes recados serão politicamente incómodos no Velho Continente. Acima de tudo por tornarem excessivamente visível o fosso entre a retórica e a vontade política das capitais europeias.
-jornalistas presentes, portugueses e estrangeiros. Foi, aliás, preenchida por quatro conferências feitas por grandes especialistas de reputação mundial, duas senhoras e dois homens. Uma delas, uma portuguesa, dr.ª Maria da Graça Carvalho, ex-ministra da Ciência e do Ensino Superior, engenheira e actual conselheira do presidente da Comissão Europeia, dr. Durão Barroso, para as questões energéticas, que aliás estava também em sua representação.A segunda parte do fórum, da parte da tarde, foi à porta fechada, ao público e aos jornalistas, para que o debate entre os altos representantes das empresas pudesse decorrer com total fluidez e, portanto, fosse mais interessante para todos. Foi a novidade deste fórum, muito louvada pelos interessados.Dada a crise global a que estamos todos sujeitos - e as subidas e descidas especulativas dos preços do petróleo e do gás -, foi realmente muito mais produtivo assim.
arranha-céus do banco Wachovia é o que mais alto rasga o perfil de Charlotte, a maior cidade da Carolina do Norte. Charlotte é, depois de Nova Iorque, a capital financeira americana, sede de grandes bancos como esse Wachovia, há pouco comprado a correr para não falir. Deve estar aí uma das razões - ali se percebe melhor a crise na América - que explica o abalo político vivido na Carolina do Norte, estado do Sul que nem por Clinton votou. Agora, o democrata Obama chega ao dia de voto empatado com o republicano McCain. A Carolina do Norte (77% brancos, 23% negros) vai votar, pela primeira vez em muitas décadas, num democrata, ainda por cima negro? Barack Obama acredita tanto nisso que reservou o seu penúltimo comício, ontem, para Charlotte (escrevo na Universidade da Carolina do Norte, onde ele é esperado, e onde acaba de se saber que a sua avó morreu, no Havai). A Carolina do Norte é dos primeiros estados a votar e o seu resultado pode indiciar o novo presidente. Às 00.30 de quarta-feira (hora de Lisboa) conhecem-se as projecções: se Obama ganhar aqui, é porque a América virou democrata. Se não, vai ter de se esperar pela madrugada.
Tudo começou há 11 meses, quando dei por mim a ver a CNN às tantas da madrugada e a assistir ao discurso de Barack Obama após a sua vitória no caucus do Iowa, primeira etapa das primárias democratas no caminho para a Casa Branca. Eu já tinha lido alguns textos sobre Obama em 2007, sobre o seu nome surpreendente, a sua cor de pele e o seu talento político, mas estávamos numa época em que ninguém acreditava que ele pudesse bater a máquina Clinton. Obama era uma boa história, muito mais do que um bom candidato. Só que o frio Iowa, com a sua população esmagadoramente branca e um método de eleição que beneficiava as campanhas mais empenhadas e fervorosas, veio mudar tudo. Para a América, com certeza. Mas, em parte, também para mim.Ler sobre Barack Obama nos jornais é uma coisa. Ouvi-lo discursar em directo é outra muito diferente. E eu jamais esquecerei a sensação de deslumbramento com que o escutei pela primeira vez na madrugada de 4 de Janeiro de 2008. Lembro-me de ter pensado "uau, mas quem é este tipo?", e num arroubo de romantismo político (coisa que nunca pensei existir) ir buscar a minha mulher para partilhar comigo aquele momento. Quatro dias depois publicava no DN um texto intitulado "Convém fixar uma nova palavra: obamamania", que começava assim: "Se no mundo desencantado em que vivemos ainda houver espaço para acreditar em homens providenciais, então eu quero acreditar neste." E de seguida apostava na sua vitória nas primárias de New Hampshire - uma asneira de todo o tamanho, já que as famosas lágrimas de Hillary Clinton acabaram por o derrotar. Ainda assim, foi sua a festa. O seu discurso no New Hampshire, depois condensado no vídeo de will.i.am e Jesse Dylan Yes We Can - que ainda hoje me maravilha quando o vejo -, é certamente um dos mais espantosos discursos de derrota dos tempos modernos. Eu sei que no mundo em que vivemos, e nos jornais em que escrevemos, estas palavras parecem ingénuas. Sei também que dificilmente Obama estará à altura das expectativas que criou para si próprio. Não importa. Não o vejo - nem nunca o vi - como um Messias que revolucionará a forma de fazer política. Isso não existe. Mas é de facto um enorme prazer, ao fim de 35 anos de vida, pela primeira vez olhar para um político e poder dizer: "Eu realmente acredito neste homem." Não por ser imune ao erro, ou sequer concordar com 100% do que ele diz, mas por ter todas as condições de carácter para, em cada momento, poder decidir da melhor maneira. Que ele seja negro e se chame Barack Hussein Obama apenas demonstra que o sonho americano continua vivo. E só quem tiver perdido toda a esperança pode não encontrar aí algum conforto.
tempo de salvar milhões da fome, da tirania, do ex-tremismo e da violência
1- Na Somália há caos, fome, senhores da guerra, tribunais islâmicos. Não há Governo, não há comida, não há justiça. Mas há telefones. E foi por telefone que Asha Dhuhulow explicou ao pai que ia morrer. Executada por lapidação. Tinha 14 anos.
Foi na semana passada que a curta história de vida de Asha se transformou numa história de morte. A família enviara-a para Norte e para longe do campo de refugiados onde nasceu, na esperança de lhe conseguir melhores cuidados médicos.
A viagem foi interrompida em Kismayo, cidade do Sul da Somália, entretanto tomada pelas milícias Al Shabab (A Juventude), organização terrorista com ligações à Al Quaeda. E o que deveria ter sido um julgamento de três homens pela brutal violação de uma menina, transformou-se numa farsa para condenar uma adúltera.
Como é hábito, a execução foi pública, tendo sido arrebanhada uma pequena multidão de deserdados e famintos para o estádio local. Alguns revoltaram-se contra o horror com que os confrontaram. Foram silenciados a rajadas de metralhadora. O ritual prosseguiu. Um camião trouxera atempadamente o carregamento de pedras. Cinquenta homens rodearam Asha, enterraram-na até ao pescoço, para a imobilizar, e cobriram-lhe a cabeça com um capuz. E assim a mataram. À pedrada.
2 - Se o Mundo pudesse votar, Barack Obama seria presidente dos Estados Unidos da América. Por uma dúzia de boas razões. Mas também por ser negro. E assim se demonstrar que é possível quebrar o preconceito racial e, associado a ele, um destino de pobreza e de falência.
Filho de um queniano, tem neste país [e no continente] de "origem" um apoio quase incondicional. Não será o novo messias, mas é visto como o homem que poderá assegurar um Mundo mais pacífico. Sobretudo, a paz para África. Os africanos sabem que só a paz trará a prosperidade de que desesperadamente necessitam. Para inverter o ciclo de pobreza e de violência endémicas.
Notícias desta semana davam conta da ameaça de fome que atinge vários países do chamado Corno de África - Quénia e Somália incluídos. 18 milhões de pessoas enfrentam aquela que se poderá tornar, nos próximos meses, segundo os relatos que chegam da zona, na pior tragédia humanitária da década.
Não é provável que o extraordinário carisma de Barack Obama seja suficiente para inverter a hipocrisia que habitualmente se move a política internacional. Mas é ainda assim razoável esperar que exporte, para fora dos EUA, a sua crença e a sua ambição de mudança. Já será tarde para Asha. Mas pode ser que seja a tempo de salvar milhões de africanos da fome, da tirania, do extremismo e da violência.
Opinião
A semana negra
O horror do desastre das finanças e da economia americana foi um descalabro anunciado há alguns meses mas em que os americanos e economistas reputados, da América e da Europa, não queriam acreditar ou não achavam conveniente denunciar. No entanto, no final da semana anterior à semana negra, Bush resolveu falar ao país e soltar a língua: denunciou, sem qualquer espírito de autocrítica, o descalabro das finanças, a iminência de várias falências de grandes bancos e a necessidade de um «plano de salvação», da responsabilidade do secretário de Estado do Tesouro, Henry Paulson, aprovado por ele, de 700 mil milhões de dólares para evitar as falências e dar um pouco de confiança ao país, uma vez que o desemprego está a crescer em flecha e as pequenas e médias empresas a ser obrigadas a fechar as suas portas.
As bolsas, em enorme baixa, foram detidas e encerraram, no fim da semana, com sinais de alguma esperança. Veio, então, a segunda-feira negra, com a péssima notícia de que a Câmara dos Representantes tinha votado contra o plano pseudo-salvador, distinguindo-se, nesse voto, precisamente os deputados republicanos, amigos e partidários de Bush. Porquê?
Porque o plano resultou extremamente impopular para a maioria da população americana e, dentro de um mês, há eleições, tanto para Presidente como para a Câmara dos Representantes. Ora, os republicanos têm mais medo do que os democratas – o que se compreende – de as perder... Depois, por serem convictos neoliberais, contestatários da intervenção do Estado na economia e ao nacionalizarem os bancos – ou os prejuízos dos bancos – estavam a ser completamente contraditórios com a sua doutrina (ideologia) bem amada... Querem remediar a crise, salvando o sistema que a criou. O que é incoerente – impossível – porque o sistema está podre e entrou em agonia irremediável.
Resultado: Obama, que quer a mudança, como sempre tem dito, sobe, de imediato, nas sondagens, e a inquietação nas bolsas, não só já nos Estados Unidos, mas também na Europa, como se está a ver com os dirigentes dos 4, reunidos em Paris, a comportarem-se como baratas tontas. Bush fez novos apelos: sabe bem que não tem outro remédio para evitar o descalabro. A um mês de terminar o seu mandato, a pior coisa que lhe podia acontecer era o colapso económico do sistema, sem remédio nem esperança.
O plano Henry Paulson voltou a ser feito e refeito, nessa semana de enorme angústia, com reflexos muito negativos na Europa e no mundo. O Senado votou-o pressurosamente. Mas as hesitações, na Câmara dos Representantes, continuaram. Será que o plano vai resolver alguma coisa e que há garantias sérias de que o dinheiro entregue aos bancos vai ser aplicado com razoabilidade e em favor das vítimas, em vias de perder o seu dinheiro? Foram dadas algumas garantias, mas há muitas dúvidas que persistem. Finalmente, na sexta-feira passada, o plano refeito foi aprovado, sem entusiasmo e com muitos votos ainda contra. Mas Bush ficou feliz. Imagina-se, tiraram-lhe um imenso peso de cima dos ombros...
Uma coisa é certa. A América, quer se queira quer não, entrou num novo ciclo. O neoliberalismo – e a «terceira via», como se chamava em Londres e não só – morreu sem glória. Não foi a vitória do socialismo, como alguns dizem, com ironia. Mas se for a vitória da Esquerda americana – e de Barack Obama – já é muito bom. Significa que os ventos de mudança – a sério – vão voltar a soprar, sobre a Europa e o mundo!
Opinião
Uma Casa Branca negra
O fenómeno Obama revela a força e a fragilidade da democracia nos EUA
Lisboa, 9 de Outubro de 2008
É provável que o próximo presidente dos EUA seja um afro-descendente. O significado de tal facto é enorme e insere-se num processo histórico mais amplo. As três últimas décadas foram de muita esperança e desilusão a respeito da democracia. Muitos países conquistaram ou reconquistaram a democracia neste período, mas a garantia dos direitos cívicos e políticos ocorreu de par com a degradação dos direitos sociais, o aumento da desigualdade social e da corrupção.
O desencanto, numa época em que a revolução não foi uma alternativa credível à democracia, fez com que surgissem novos actores políticos, movimentos sociais e líderes, na maioria dos casos com poucas ou nenhumas vinculações à classe política tradicional. As Américas são uma ilustração eloquente disto, ainda que os processos políticos sejam muito diferentes de país para país.
Em 1998, um mulato chega à Presidência da Venezuela e propõe a revolução bolivariana; em 2002 um operário metalúrgico é eleito Presidente do Brasil e propõe uma mistura de continuidades e rupturas; em 2005 um indígena é eleito Presidente da Bolívia e propõe a refundação do Estado; em 2006 um economista sem passado político é eleito Presidente do Equador e propõe a revolução cidadã; em 2006 e 2007 duas mulheres são eleitas Presidentes do Chile e da Argentina, respectivamente com projectos de continuidade mais ou menos retocada; em 2008 um bispo, teólogo da libertação, é eleito Presidente do Paraguai e põe fim a décadas de domínio do partido oligárquico através da aliança patriótica para a mudança; e ainda em 2008 é provável que um negro chegue à Casa Branca com o slogan: Change, yes we can.
Uma nova política de cidadania e de identidade, sem dúvida mais inclusiva, está a impregnar estes processos democráticos, o que nem sempre significa uma política nova. Por isso, pode ser um sol de pouca dura. De todo modo, é importante que líderes vindos dos grupos sociais que na história da democracia mais tarde conquistaram o direito de voto assumam hoje um papel de proeminência. No caso dos EUA, isto acontece apenas 40 anos depois de os negros conquistarem direitos cívicos e políticos plenos.
A eleição de Obama, a ocorrer, é o resultado da revolta dos norte-americanos ante a grave crise económica e a estrondosa derrota no Iraque, apesar de declarada como vitória até ao último momento, como já aconteceu no Vietname. O fenómeno Obama revela a força e a fragilidade da democracia nos EUA. A força, porque a cor da sua pele simboliza um acto dramático de inclusão e de reparação: à Casa Branca dos senhores chega um descendente de escravos, mesmo que ele pessoalmente o não seja. A fragilidade, porque dois temores assolam os que o apoiam: que seja assassinado por racistas extremistas e que a sua vitória eleitoral, se não for muito expressiva, seja negada por fraude eleitoral, o que não sendo novo (o W. Bush foi «eleito» pelo Supremo Tribunal) representa agora uma ocorrência ainda mais sinistra. Se nada disto ocorrer, um jovem negro, filho de um emigrante queniano e de uma norte-americana, terá o papel histórico de presidir ao fim do longo século XX, o século americano.
A crise financeira é a ponta do icebergue da crise económica que assola o país e tudo leva a crer que a sua resolução não permitirá que os EUA retomem o papel de liderança do capitalismo global que tiveram até aqui. A União Europeia já chegou a esta conclusão e parece ter a veleidade de tomar o lugar dos EUA, apesar de nos últimos 20 anos só não ter sido uma aluna mais fiel do modelo norte-americano porque os cidadãos não permitiram. Acresce que nas relações com os países que na América Latina, na África e na Ásia podiam ser parceiros de um novo modelo económico e social mais justo e solidário a UE persiste em assumir posições imperialistas que lhe retiram credibilidade.
A transformação não virá da UE ou dos EUA. Terá de lhes ser imposta pela vontade dos cidadãos dos países que mais sofreram com os desmandos recentes do capitalismo de casino.
O fim de um mundo falso
Durante quarenta anos ele acreditou na infalibilidade do sistema e na verdade intrínseca do mercado. E, de repente, o mundo que ele ajudara a construir e a impor como coisa inevitável e inquestionável desabou-lhe aos pés. O depoimento de Alan Greenspan, o 'mago' da Federal Reserve, perante o Senado dos Estados Unidos foi um impressionante "mea culpa", porque foi sincero e porque se percebeu que o velho guru do liberalismo estava verdadeiramente estarrecido com as consequências do seu erro decisivo.
Qual foi o erro de Greenspan, qual foi o erro do credo liberal? Foi, de certa forma, o erro inverso da teoria marxista. Marx, que foi um genial analista dos vícios do capitalismo, propôs o socialismo como alternativa, mas uma alternativa filosófica e moral, decorrente da crença de que a propriedade era um roubo. Mas as pessoas não se alimentam de teorias filosóficas nem convicções morais, e sim de coisas mais imediatas como a produtividade e a criação de riqueza. O socialismo, como doutrina económica, nasceu condenado ao fracasso, porque desdenhou o factor humano: a propriedade não é um roubo, é uma legítima ambição de qualquer homem, desde os especuladores de Wall Street até aos miseráveis dos guetos de Bombaim. Mudar a vida para melhor, ser mais rico, graças ao seu esforço, ao seu trabalho, à sua capacidade de inovação e de risco, faz parte da natureza humana e das suas ambições desde que o homem é homem. A livre iniciativa é o factor primeiro de produção de riqueza e de progresso económico. Num mercado aberto e concorrencial, cada um sabe que poderá, pelo seu esforço e pelo se mérito, melhorar a sua condição. Num mercado fechado, numa economia estatizada em que todos são funcionários públicos, não adianta fazer mais nem melhor, porque o Estado é dono de tudo e ninguém tem nada de seu.
Sobre as ruínas da crença socialista, que produziu milhões de deserdados e de miseráveis, os liberais acharam que tinha soado a hora de uma vingança histórica. O Estado mínimo, que Greenspan caucionou e Bush levou ao extremo do dogmatismo, descendo os impostos sobre os mais ricos, cortando nos programas de ajuda social e facilitando em tudo os negócios do grande capital, assentava numa outra pretensa verdade, de que Greenspan se fez eco: a de que o mercado saberia auto-regular-se, pois que era do seu próprio interesse, do das grandes empresas e do sistema financeiro, não criar as condições para a auto-implosão. Mais uma vez, o que ficou esquecido neste "wishfull thinking" foi o factor humano. Se a ambição de ser mais rico é o que faz aumentar a riqueza das nações, a ambição da riqueza desmedida, sem horizonte nem controlo dos meios usados, é o que conduz ao seu colapso.
O que falhou, então, não foi apenas a crença na desregulamentação do mercado, na concentração cada vez maior das empresas, nos lucros pornográficos distribuídos entre accionistas e gestores. O que falhou, antes de mais, foi a noção de ética nos negócios, a lembrança de que a criação de riqueza tem uma finalidade social, não podendo aproveitar apenas ao seu detentor, e que a riqueza fundada na miséria alheia (ou no endividamento de todos perante a banca) conduz, mais cedo ou mais tarde, à falência geral.
A loucura liberal montou um sistema económico à escala planetária fundado na iniquidade e na falta de escrúpulos e de sentido de serviço à comunidade. Pior ainda, permitiu que o sistema financeiro se apoderasse da economia, que os lucros fantásticos acumulados não correspondessem a riqueza efectivamente criada e que a economia real e produtiva fosse canibalizada pela especulação. Os mercados accionistas subiam e desciam, não em resultado do desempenho das empresas cotadas, mas das mais-valias realizados pelos especuladores - que depois corriam a canalizar os seus lucros para os "off-shores", onde ficavam à espera, sem pagar impostos, de nova oportunidade de raide sobre o mercado. As pequenas poupanças foram assim devoradas pela especulação instalada, levando muitos a investir antes no consumo ou a endividarem-se no imobiliário, por não encontrarem melhor destino para o dinheiro.
Esta bebedeira colectiva vinha de trás e de longe, com sinais inequívocos de um fatal estoiro algures, e o que é incompreensível é que homens como Greenspan tenham assistido a tudo, confortados na sua crença de que o capitalismo em caso algum se devoraria a si próprio, ao contrário do que Marx escreveu há mais de um século. Entregue a si mesmo, aos seus instintos mais primários, o homem é um animal perigoso, quer ande pela rua a deambular de revólver na mão quer esteja sentado a uma secretária a gerir o destino de milhares de famílias. E o pior "serial killer" é aquele a quem foi confiado o poder de destruir, por simples ambição, os empregos e as pensões de reforma de tantos outros que trabalharam toda uma vida, confiados na honestidade do sistema. Não estamos apenas perante o falhanço de uma teoria económica, é mais do que isso: estamos perante um verdadeiro crime contra a Humanidade. Milhões de pessoas em todo o mundo estão já a sofrer as consequências da falta de pudor e de escrúpulos de alguns milhares de agentes económicos colocados em lugares privilegiados.
A esta luz, a tentativa - recentemente importada para aqui - de tentar explicar que o que falhou não foi a falta de regulação do mercado, mas sim o seu excesso, é quase uma nova forma de negacionismo. Dizer, como já vi escrito, que o que conduziu ao descalabro foi a legislação deixada por Clinton, que pretensamente obrigaria a banca a financiar negros e pobres sem capacidade de endividamento, sob pena de ser acusada de discriminação, roça as raias do insulto. Teriam sido os pobres, então, quem esteve na origem da crise, fazendo arruinar os ricos, os quais, coitados, só quiseram ajudá-los... O sr. Greenspan, afinal, não tem razões para se angustiar e viver os seus últimos anos atormentado pelos remorsos da sua extraordinária incúria!
Terça-feira que vem, o mundo pode começar a reencontrar o caminho da esperança, com a eleição de Obama como Presidente dos Estados Unidos. Não, ele não tem uma varinha mágica nem vai conseguir, por melhor que tente, tirar a América e o mundo deste atoleiro tão cedo. Mas representa outra gente, outra atitude, outra esperança. Seguramente que acredita numa economia menos iníqua, menos desonesta e menos entregue à lei da selva. E acredita na necessidade de uma América menos arrogante e menos egoísta. Cravará os pregos que forem necessários no caixão do liberalismo e, se tiver a lucidez suficiente para tal, trará a América de volta ao lugar da esperança que já foi seu e que perdeu com estes oito anos de pesadelo que foram os de George W. Bush
INFERNO
António Costa
Não frequento o Bairro Alto. Seja em Lisboa ou no Rio de Janeiro, favelas não fazem o meu género. Mas entendo a medida de António Costa para combater os "graffiti" que abundam pelas ruas do bairro. Segundo parece, António Costa pretende contratar uma empresa para fazer a limpeza regular do espaço. E, a prazo, será entregue a cada morador um "kit" de limpeza com rolo de pintura, extensão, tabuleiro, óculos, luvas, uma embalagem de protecção e líquido removedor de tinta. Talvez António Costa se esteja a esquecer de um revólver, mas eu entendo a ideia: para "não coarctar a expressão artística" (sic), o nosso António deu luz verde para que os delinquentes continuem a destruir a propriedade alheia durante a noite. Impunemente. As vítimas da delinquência que limpem o crime no dia seguinte.
A medida é admirável e demonstra um respeito pelos lisboetas que me comove até às entranhas. Mas pergunto se António Costa estará sintonizado com algumas práticas estrangeiras de combate aos "graffiti". Na Cornualha, por exemplo, li recentemente que as autoridades inglesas resolveram construir um gigantesco muro branco para que os "artistas" locais possam exercer nele a sua arte. Por que não seguir a experiência?
Bem sei que as contas da Câmara de Lisboa não permitem este tipo de investimentos. Mas António Costa podia imitar o gesto e ceder, a título caritativo, a sua própria residência pessoal para que os "artistas" a vandalizem à vontade. Depois, quando a manhã viesse, era só entregar o "kit" de limpeza ao senhor presidente e vê-lo a remover, compreensivo e sorridente, a nobre "arte" da pixação. Fica o desafio.
PURGATÓRIO
Barack Obama
Um amigo meu encomendou, via Amazon, uma camisola de apoio a John McCain. A camisola veio, ele vestiu-a e foi trabalhar. Nada o preparava para o espectáculo posterior: colegas e amigos olhavam para ele com um esgar de incompreensão e nojo. A coisa foi tão ostensiva que, a meio da tarde, ele resolveu mudar de roupa para não arranjar sarilhos num meio maioritariamente artístico, ou seja, de esquerda.
O episódio é interessante porque revela o quadro mental em que a esquerda usualmente chafurda. Creio que foi Roger Scruton quem o resumiu na perfeição: quando um "conservador" critica um "progressista", ele parte do pressuposto de que o adversário está errado. O critério é epistemológico, não ético. Mas quando um "progressista" critica um "conservador", o julgamento é moral; e o adversário, um simples inimigo.
Naturalmente que existem todas as excepções do mundo. Mas as excepções confirmam a tese: o pluralismo não entra na cabeça de uma esquerda moralista e intolerante. Foi precisamente esta arrogância moral da esquerda, a que se junta uma óbvia falta de sentido de humor, que fizeram de mim uma pessoa à direita.
E McCain? E Obama? Sim, gostaria que McCain ganhasse. E ainda acredito que McCain vencerá: as sondagens sempre inflacionaram os Democratas (lembrar Carter contra Reagan). Mas não me repugna que Obama vença. O que ouvi dele sobre política externa (Afeganistão, Paquistão, Irão) chega e sobra para adivinhar duas fatalidades. Primeiro, que a esquerda vai ter uma desilusão profunda com o Santo Obama (para meu infinito riso). E, segundo, que Obama será um digno representante da América democrática e livre de que eu tanto gosto.
Viragem. Não foi um negro que foi eleito. Foi um americano, que tem a circunstância de ser negro, que foi eleito Presidente. Obama fez com que os seus compatriotas se convencessem de que a raça não é importante
Entre a multidão de Chicago que, nos jardins vizinhos ao lago Michigan, celebrava a América, na madrugada passada, as câmaras de televisão detiveram-se na cara de um senhor negro e famoso que chorava. Era o reverendo Jesse Jackson. Ele é filho dos anos 60 que garantiram os direitos cívicos para os negros. "Rosa Parks sentou-se para que Luther King pudesse marchar, que marchou para que Obama pudesse voar", foi uma frase muito dita por estes dias, definindo as etapas encetadas pela senhora negra de Montgomery, Alabama, sentando-se num banco de autocarro só para brancos, e que chegaram agora à celebração do primeiro Presidente americano negro. Jackson chorava de alegria por esse sobressalto que permitia que na vida de um só homem se pudesse ter visto tanto.Mas o reverendo podia também chorar por ter sido ultrapassado pela História. Ele, que também concorreu para a nomeação democrata nas primárias de 1984 e 1988, e não foi longe, reconhecia que o homem daquela madrugada, Barack Obama, era de outro campeonato, o dos vencedores, e não só o dos predicadores. Jackson notabilizou--se nas campanhas pelos direitos cívicos, integrou organizações negras, lançou a sua candidatura em igreja negra - ele era filho de uma geração em que os passos eram esses. Mas colar-se a uma minoria (os negros são 12,8% da população dos EUA) não pode ser táctica ganhadora numa corrida eleitoral. Ainda ontem, um jovem político negro, que pretende agora concorrer ao lugar de senador pelo Ilinóis, deixado em aberto por Obama ir para a Casa Branca, definiu assim o novo Presidente: "Ele não é um afro-americano que foi eleito, ele é um americano, que tem a circunstância de ser afro-americano, que foi eleito." Curiosamente, o jovem chama-se Jesse Jackson Jr. e é filho do reverendo que chorava.Há semanas, em Nova Iorque, num jantar público que fez com John McCain e em que era suposto os discursos usarem o humor, Obama riu--se de si próprio: "Quem me baptizou Barack Hussein estava a torpedear-me a carreira política..." Estava e não estava. Mestiço e com tais nomes muçulmanos, ele poderia assumir a condição minoritária ou, pior, adoptar a condição muito comum nos afro- -americanos de não singrar na vida porque a História cometeu contra eles o pecado mortal da escravatura. O queixume como modo de vida deu cabo de muita carreira num país que reconhece como das virtudes maiores o saber lutar contra o destino. Mas Obama não foi por aí. A provocação dos seus nomes, Barack Hussein, como que serviu de aguilhão para não se desculpar.Deitando fora o colete-de-forças que pretendia fazê-lo só um afro-americano (e neste só traduza--se o que seria o filho de um imigrante português querer fazer carreira em Boston mas desdenhar os Red Sox e ser sócio do Benfica), Obama descobriu-se, afinal, um legítimo filho da América moderna. Pai queniano e mãe branca do Kansas, e nascido no Havai, de tão diversificado, bebia na corrente de fundo que faz a América de hoje - ele é muito mais comum que, por exemplo, um mórmon como Mitt Romney, que esteve para ser o candidato republicano.É verdade que Obama teve 95% dos votos negros. Mas teve também mais votos brancos que o precedente candidato democrata John Kerry (2004). Nas sondagens à boca das urnas, nove em dez votantes disseram que a raça não tinha sido importante nestas eleições. O facto dado como adquirido, os hispânicos não gostam de políticos negros, virou mito: Obama ganhou mais de metade dos votos hispânicos.Essa situação de facto e a vontade ideológica de assumir a tradição americana fizeram a força de fundo, aliada ao talento natural (tornem a ouvir o discurso da madrugada de ontem e reconheçam esse talento). Quando lançou a sua candidatura, Obama escolheu as escadarias do Capitólio de Springfield, Ilinóis, a casa de Abraham Lincoln. E no discurso de ontem, a figura invocada foi de novo Lincoln. A direita portuguesa que se fascinou com Obama vai arrepender-se - ele é um revolucionário porque é da América que tem por vocação transformar-se; a esquerda portuguesa que se fascinou com Obama vai arrepender-se - ele é um conservador que rega as tradições americanas. Se não quiserem enganar-se, vejam nele o essencial: Barack Hussein Obama, um homem da América.
A AMÉRICA ELEGEU UM PRESIDENTE PRETO
América mais universal e menos americana
António Justo
Os Estados Unidos da América elegeram o seu primeiro presidente preto, 150 anos depois da libertação dos escravos. A América apresenta-se com um rosto novo ao mundo!
Barack Obama conseguiu entusiasmar a América pela política. A participação eleitoral alcança um novo recorde. 153 milhões de cidadãos participaram nas eleições conseguindo Obama já 57,7 % dos votos para si. O 44.° Presidente da USA apresenta muitas semelhanças com o presidente Kennedy que então foi o símbolo duma nova América.
A América ao eleger um presidente preto reconcilia-se consigo mesma e com o mundo.
Com a derrota de McCain a USA despede-se duma era histórica nostálgica de vitória e de força no mundo.
Num momento em que o sonho americano sofre as primeiras arranhaduras com a crise financeira, a USA procura um novo papel na história. Barack Obama personifica o sonho americano de vida, liberdade e felicidade. Ele consegue subir, com o próprio esforço, duma situação modesta ao mais majestoso cargo da América. Os votos em Obama são mais que os votos num partido. São os votos dum movimento, o grito da esperança que surge da profundeza da sociedade americana. Na vitória do partido democrático está presente a desilusão de políticas falhadas e a esperança daqueles que levantam a mão, no desejo de verem os seus interesses chegarem à ribalta da nação. Por todo o lado se torna latente o desejo dum novo começo.
Obama, na sua campanha eleitoral, procurou um novo estilo de discurso. Tentou superar os clichés ideológicos de direita e de esquerda, de Etablishment e de carenciados. Com estilo deixou alguns alertas dignos de escrita no álbum dos partidos: "Não há uma América liberal e uma América conservativa – há os Estados Unidos da América". Aqui, Obama não se revela como um político normal. Ele quer construir pontes para melhor servir o povo americano.
Às águias do poder, que questionavam a sua experiência, ele responde:"Trata-se da capacidade de discernimento e não da experiência". A América, tal como ele, é jovem e na sua juventude antecipa o futuro. Obama fala, no plural, dum futuro melhor onde "nós todos encheremos o sonho americano com nova vida, onde todos terão, verdadeiramente, as mesmas chances". A América é sempre jovem porque a sua elite sonha e com ela o povo também. Nela a elite, com todos os seus paradoxos, não deixou de ser povo.
O povo americano elegeu uma biografia e não um programa. Na sua pessoa os americanos vêem a história da América, reconhecendo-se na sua mensagem de esperança e entusiasmo.
Todo o Mundo olha para a América porque sabe que grande parte do seu destino depende dela.
A concorrência da Rússia e da China, o ressentimento árabe, o terrorismo e a inveja europeia terão um novo peso na nova era que agora se anuncia.
Embora o tema da guerra do Iraque tenha estado ausente durante a propaganda eleitoral, o seu fim não pode ser adiado indefinidamente. A sua vontade de reformar o sistema de saúde é mais que pertinente. Embora se incline para o proteccionismo económico (o que assusta os chineses) mostra-se mais liberal na política de segurança. Com ele talvez a presença militar da USA no mundo, com as suas 761 bases militares em 151 países, se faça sentir menos e a ideia imperialista presente em todas as civilizações se comece a embaçar. Com ele, os europeus querem ser tomados mais a sério. Esperam uma política que não se aproveite da rivalidade entre os Estados europeus e que assuma compromissos internacionais em questões de protecção do clima e do controlo de armamento. (O problema para Obama em relação à União Europeia será saber o que esta quer!) Os poderes que Obama tem de enfrentar são hercúleos: um mundo contraditório em si, os serviços secretos, as forças militares e económicas e uma pratica mundial em que o ser humano ainda não é tema prioritário.
Obama, filho de pai queniano e de mãe americana, desperta muitas esperanças também na África. Espera-se que ele não escreva apenas história americana. Os russos esperam, com ele, ser mais fácil recuperar o velho brilho de potência que tinham no tempo da União Soviética.
Obama não será nenhum santo. Neste sentido fala a sua carreira de político. Consta que nas escadas do poder partidário ninguém sobe sem cadáveres na cave. Além disso, as esperanças, nele colocadas, tornarão mais difícil o seu papel de presidente. As projecções colocadas no presidente eleito são de tal ordem que exigiriam dele uma pessoa sobre-humana para as satisfazer. Só resta lugar para o desencanto.
A crise financeira mostrou a necessidade duma nova ordem mundial. Uma mudança radical seria mais que óbvia.
Obama encontra, como hipoteca, a guerra do Iraque que terá de pôr fim em tempo determinado. O conflito israelo-árabe espera também por solução. A necessidade da USA se libertar da dependência dos regimes do petróleo possibilitará o renascimento da ecologia. Ele quer "um governo do povo para o povo". A crise histórica em que o mundo se encontra não facilita o papel do presidente. Não será fácil tirar o carro da lama.
O novo presidente pode tornar-se numa oportunidade de reconciliação de muitos países com os Estados Unidos. Ele é o símbolo da nova era. Nele pode torna-se possível a integração da potência e da impotência e assim se passar da era do diálogo para a era do triálogo. A chama da liberdade deixará então de ser tão deslumbrante.
A sua vitória, integrada na sua biografia, revela a possibilidade de integração das forças do Sul com as do norte. Na sua personalidade se encontra a mistura americana, a mistura racial e religiosa. Barack Obama representa na sua pessoa a post-américa, a vontade de integração do mundo do norte e do mundo do sul. A América permanecerá sempre uma nação universal, um luzeiro que integra em si todas as culturas.
A América continuará a ser a AMÉRICA: talvez mais universal e menos americana!
António da Cunha Duarte Justo
Simbolismo e esperança
00h30m
A América elegeu um presidente negro. A América mudou. A primeira afirmação é um facto; a segunda, parecendo sê-lo, pode não passar de uma percepção. Como depois da bebedeira vem a ressaca, depois da "Obamania" - emoção e entusiasmo, expectativas sem freio - vem a realidade. Sombria e incerta, nos tempos que correm.
A partir de Janeiro, quando Barack Obama oficializar a sua entrada na Casa Branca, é que é a doer. Por enquanto, duas palavras ganharam primazia: simbolismo e esperança. Ambas são indispensáveis em política, porque mobilizadoras dos cidadãos. Mas não constituindo um programa político, muito menos automática garantia de bem-estar, correm o risco de esfumar-se em pouco tempo.
A América mudou por fazer as pazes com o passado, por reconhecer, finalmente, que os afro-americanos também integram o seu código genético? Talvez, embora a perspectiva pareça excessivamente simplificadora da realidade. Mais avisado é dar tempo ao tempo, para perceber em que consiste, se consiste, a mudança.
Numa nação habituada à hegemonia no mundo, o peso da história continua a ser mais decisivo do que o papel circunstancialmente desempenhado pelos indivíduos. Os Estados Unidos não se tornaram mais conservadores do que eram durante o consulado de George W. Bush, nem a eleição de Obama representa uma ruptura - quanto mais uma revolução! - tão absoluta como tendemos a acreditar na Europa. Quanto mais não seja porque a erupção da crise em Wall Streeet, já toda a gente teve oportunidade de o constatar, entrou sem pedir licença para o topo da agenda política do novo presidente.
O seu mais imediato desafio é esse: pôr em ordem a economia interna. Não é pêra doce, sabendo-se que o sistema financeiro bateu no fundo. Nem é tarefa que diga exclusivamente respeito aos Estados Unidos, na medida em que a globalização se encarregou de espalhar metástases da crise por todo o planeta. A política interna norte-americana, hoje mais do que nunca, tem impacto externo, que nenhum país pode ignorar.
Só depois de arrumar a casa Obama poderá concentrar energias na política externa. É provável que, entretanto, encerre a prisão de Guantanamo, como sinal de mudança (lá está: simbolismo). A resolução dos mais quentes dossiês - Iraque, Irão, Afeganistão, Médio Oriente - requer um fôlego suplementar. Exige-se que adopte uma estratégia menos "imperial" e mais multilateral, em cumprimento das promessas feitas em campanha. O palco internacional constituirá, por excelência, o verdadeiro teste à mudança. Obama, vaticina-se, precisa de um prolongado "estado de graça". Não é seguro que lhe seja proporcionado.
Uma eleição histórica e que traz esperança
A crise internacional será o grande desafio a enfrentar de imediato por Barack Obama, o primeiro negro a ser eleito Presidente dos Estados Unidos. E cujo triunfo foi recebido um pouco por todo o mundo com palavras como "mudança", "histórico" e "esperança". As reacções à clara vitória sobre John McCain foram entusiasmadas, tanto nos Estados Unidos, onde a mobilização eleitoral foi surpreendente, como no exterior, sobretudo entre os aliados europeus. Mas também por parte de países como Cuba ou Irão, que surgem na lista dos tradicionais inimigos dos americanos. E o discurso de vitória, celebrado em Chicago perante centenas de milhares de apoiantes entusiasmados, correspondeu às expectativas. Não só pelo tom, cativante como sempre, mas sobretudo pelo conteúdo: Obama prometeu relançar a economia, combater a crise financeira, retirar as tropas responsavelmente do Iraque e investir o potencial militar dos Estados Unidos na luta à Al-Qaeda e aos seus aliados talibãs no Afeganistão. Foi um discurso de mudança, cheio de sentido histórico e com uma mensagem de esperança, a reflectir a forma como foi acolhido pelo mundo. Depois de uma era Bush marcada pelo unilateralismo - em que a invasão do Iraque sem o aval da ONU foi a marca mais visível - Obama promete agora uma América dialogante, capaz, porém, de se mostrar forte também quando for preciso. O derrotado McCain, candidato republicano, reconheceu a derrota sem demoras e amargura, ao contrário do que sucedeu há oito e há quatro anos por parte dos democratas. E prometeu colaboração com o adversário, apesar da diferença de opiniões que se revelou durante a campanha. Mesmo George W. Bush, que termina sem glória uma passagem pela Casa Branca que também começou de forma cinzenta (com a polémica vitória de 2000 sobre Al Gore na Florida, que teve mais votos populares a nível nacional), prepara-se para apoiar o seu jovem sucessor neste momento delicado de transição que se arrastará até à tomada de posse a 20 de Janeiro, em Washington.Da América e destas eleições sai ainda uma tremenda mensagem. O racismo que era desmentido há décadas pelos inquéritos sociológicos, mas que subsistia nas diferenças sociais e económicas, foi agora derrotado sem hesitações nas urnas. Os americanos - que, apesar de Thomas Jefferson ter proclamado que todos os homens nasceram iguais, tardaram um século a abolir a escravatura e outro a reconhecer direitos cívicos aos negros - mostraram na terça-feira serem capazes de ter heróis negros. Já não um basquetebolista , um cantor ou uma apresentadora de televisão, mas um político. Isso é um passo gigantesco. Sobretudo, porque o futuro inquilino da Casa Branca se chama Barack Hussein Obama e é filho de um imigrante do Quénia e de uma branca do Kansas. Um homem do mundo.
HOMEM QUE NÃO PODE FALHAR
Pedro LombaJurista - pedro.lomba@eui.eu
Já são tantas e tão variadas as explicações para a vitória de Obama que eu devia ter o cuidado de não me meter nisso. Mas tenho verificado que cada um tem o seu Obama. Nada de anormal, diga-se. Se alguém se torna Presidente da nação mais dividida do mundo, é porque chegou com êxito a públicos diferentes. Pode ser o Obama "espiritual" que ilumina os descontentes com homilias. Pode ser o "social-democrata" que promete o que nunca existiu na América: um Estado social europeu. Pode ser o membro da geração pós-anos 60 que apareceu na altura exacta em que os americanos se fartaram quase em absoluto das guerras culturais. Ou podem ser coisas mais elementares que até encaixam numa visão realista sobre o que deve ser a política. Primeiro, uma autoridade ética que ele sempre invocou nos seus ataques à Administração Bush (era fácil) e que lhe granjeou apoios à esquerda e à direita, dentro e fora de portas. Depois, a capacidade para a liderança: num tempo de crise e insegurança a sério, já ninguém tem paciência para políticos que causam um ruído dispensável e cuja competência para altas andanças é mais que duvidosa (e foi esse o problema de McCain no momento em que cedeu à escolha de Palin para "vice"). Ninguém sabe que tipo de líder vai ser Obama, mas uma coisa é certa: as pessoas querem recuperar o respeito por aqueles que as governam. Finalmente, Obama promete mudanças e algumas boas mudanças como o fim de Guantánamo, a abolição da tortura, reduções de impostos para a classe média e novas políticas na saúde, energia e ambiente que parecem justas e acertadas. O filósofo político inglês, Edmund Burke, dizia que "um estado sem meios de mudança é um estado sem meios de conservação" e tinha razão.As condições políticas ao dispor de Obama também são únicas. Os americanos estão com ele, o congresso está com ele, a Europa e o mundo também. Tanta "unanimidade" pode ser perigosa, mas foi esta mesma "unanimidade" que o elegeu. Já se diz por aí que ele irá errar muitas vezes e por certo que irá errar muitas vezes. Mas também ninguém espera que ele seja um presidente normal e inconsequente. A obamania precisa de continuar.Obama tem agora muito trabalho pela frente. Pela primeira vez na sua História, a América enfrenta a hipótese do seu próprio declínio económico e, por arrastamento, internacional. Há a crise financeira, mas não há apenas a crise financeira. Um pouco por toda a parte tem-se formado a ideia de que um certo tipo de capitalismo, o anglo- -saxónico, está esgotado e que os próximos tempos vão pôr em confronto tipos diferentes de capitalismo. É verdade que Obama não é um utópico e experimentalista, graças a Deus, mas sensato e moderado. Sabe falar e ouvir; vamos ver se também sabe fazer.
AMÉRICA VOTOU - NOVO CICLO
Maria José Nogueira PintoJurista
As dúvidas dissiparam-se, pelas duas e trinta da madrugada, quando as projecções das grandes estações de TV deram a vitória de Obama no Ohio e na Pensilvânia.São dois Estados com uma forte componente de operariado e pequena classe média branca, em que McCain investira na fase final da campanha e que tinham parte da decisão nas mãos, com os seus 41 votos no colégio eleitoral. A queda para Obama destes Estados lembrava também a grande viragem na campanha e o decisor da eleição: o crash de Wall Street na ocasião precisa em que as sondagens revelavam que McCain começava a chegar à frente. Mas a catástrofe económica, a recusa de uma parte dos congressistas republicanos de votar o Plano Paulson, as hesitações do candidato, tocaram de morte a causa do duo McCain-Palin.A economia liquidava o candidato republicano, como em 1992. Sobretudo nestes Estados com uma componente de blue-collars conservadores em religião e costumes. E ressurgiu, nesse sector do eleitorado, aquela impressão de que a Presidência Bush, que, além da guerra do Iraque, corporizava um "governo dos ricos, pelos ricos e para os ricos". Impressão excessiva, mas que, juntando às desgraças da economia e do povo a ideia de que umas dúzias de gestores, de lobbystas e de políticos corruptos, forrados com milhões de dólares de comissões e especulação, deu o golpe final nas aspirações dos republicanos.Porque muito fez McCain, para conseguir o resultado que conseguiu, com uma etiqueta republicana que a equipa no poder tinha posto pelas ruas da amargura.Assim se fecha um longo ciclo de hegemonia conservadora na política americana - apoiado a partir de Reagan em 1980 na aliança Sul-Middle West, blue-collars, evangélicos e republicanos tradicionais, que mesmo na era Clinton manteve o Congresso. A gestão de George W. Bush e Dick Cheney deu cabo dessa aliança. Como no Congresso e nos governos estaduais, a vitória dos democratas foi muito significativa, começa um novo ciclo político.Não me preocupa a vitória de Obama; só vai incomodar um bocadinho o barulho que a "esquerda festiva", por cá, vai fazer à sua volta. Até começar, daqui a seis meses, a manifestar a sua desilusão com o novo Presidente americano… Porque Obama é um político e estratega consumado no modo como apareceu, ganhou a nomeação democrática à todo-poderosa Hillary Clinton, captou as forças do capital - de Warren Buffet a Paul Volcker - e parte do establishment conservador americano e internacional.Por isso teve 600 milhões de dólares para a campanha. Que não podiam vir de "pequenas" contribuições de 50 dólares na Internet, num país de 300 milhões de habitantes! E acabou endossado por toda a gente, incluindo intelectuais conservadores - como o incontornável Fukuyama, do "fim da História" - e uma série de personalidades que na semana final se juntaram ao carro do vencedor.Obama vai ter uma das mais difíceis presidências da história americana: duas frentes de guerra - Iraque, difícil e vital para a política do Médio Oriente, e o Afeganistão, que nem sequer é um país, mas um conglomerado tribal, de "senhores da guerra" e fanáticos, que serviu de cemitério, sucessivamente a ingleses e soviéticos. O risco de recessão, com o acréscimo da dívida pública para a cobertura de Bancos e Seguradoras falidos. A questão do macroterrorismo. E os problemas de que fez bandeira - a saúde, a educação, as cidades, a pobreza.E também, a necessidade de redefinir o papel dos Estados Unidos perante um mundo que mudou muito. E onde não é possível, ao mesmo tempo, enfrentar o islamismo radical, hostilizar a Rússia e inquietar a China, e ter a política externa condicionada por lobbies de interesses e agendas ideológicas.Mas Obama tem, com um Congresso da sua cor e uma grande dose de expectativa favorável interna e externa, uma oportunidade de refazer, em face a face com o resto do mundo, uma ordem internacional estável e equilibrada. Deus o ajude, e a nós também.
A grande virada
De:JVerdasca
Os Estados Unidos da América acabam de dar - ao mundo - a maior lição de DEMOCRACIA e HUMILDADE do século. Elegendo um afro-americano (está errado designá-lo negro, muito menos preto) para o mais alto cargo político-administrativo, do mais RICO, PODEROSO e AVANÇADO Estado do Planeta, e - NOTE-SE - DE ESMAGADORA MAIORIA BRANCA - os americanos agira com a razão, escolheram o mais indicado para o cargo e neste momento, optaram PELAS MUDANÇAS POSSÍVEIS (que não se esperem loucuras e irresponsabilidades tipo PREC português). É certo que a DESILUSÃO de mais de metade dos americanos com o STATU QUO foi grande e traumática, dado o desastre econômico-financeiro-social provocado pela ganância, pela incompetência, pela irresponsabilidade de muitos gestores do grande capital e pelos governantes cuja obrigação era FISCALIZAR operações fraudulentas, salários ASTRONÓMICOS COMO O DO PRESIDENTE DO BANCO DE PORTUGAL, onde as mazelas se seguem umas às outras, dizia, que a desilusão foi traumática, e deve ter influenciado a escolha do candidato e do partido, a revelar que a ÉTICA está viva, a DIGNIDADE ainda mora nos corações e o sentido de justiça está de novo aflorando, com a honestidade sobrepondo-se à sem-vergonhice.
LIÇÂO de DEMOCRACIA e HUMILDADE, que decerto será muito absorvida e aproveitada, dado que todo o Planeta esteve e continua virado para a grande nação lider do mundo, exemplo de democracia, ordem e liberdade, mas que sabe MANTER a AUTORIDADE quando necessário se torna proteger cidadãos e bens, princípios e leis, sem discursos lamechas ou pseudo-direitos bandidos para quem os direitos do verdadeiro cidadão não existem, são letra morta, enfim, quando se sabe QUE TODO O DIREITO IMPÕE UM DEVER, e se um dia - e BEM - foi proclamada a DECLARAÇÃO dos DIREITOS do HOMEM e do CIDADÃO, ficou faltando a correspondente DECLARAÇÃO dos D E V E R E S do HOMEM E DO CIDADÃO. À NÃO-discriminação terá que - obrigatoriamente - seguir-se A FORMAÇÃO total e geral dos cidadãos com vistas aos aproveitamento de todas as inteligências; uma mais equitativa distribuição de renda, e uma mais JUSTA IGUALDADE de OPORTUNIDADES, para todas as etnias, para todas as classes sociais, para todos so cidadãos. HÁ muitas classes de indivíduos, muitos "líderes", muitos privilegiados e outros que AINDA se levam demasiadamente a sério, julgando-se SUPERIORES, quando, na realidade, são inferiores em muitos aspetos, podendo, embora, ser superiores em um ou outro. O MUNDO TEM QUE MUDAR e MELHORAR.
Caminhemos nesse sentido. Jverdasca
Opinião
A cara da mudança
A histórica vitória de Obama vem carregada de simbolismo e propõe-nos várias leituras. O povo americano revelou-se farto do rumo republicano e fê-lo votando num democrata afro-americano. Para mim, um presidente negro nos Estados Unidos era uma imagem que pertencia exclusivamente ao domínio da ficção.
Até ontem. É impossível não pensar nas palavras de Martin Luther King aquando do brilhante discurso em Washington que viria a ficar gravado na nossa memória colectiva. "Eu tenho um sonho: que os meus quatro pequenos filhos venham a viver numa nação onde não sejam julgados pela cor da sua pele mas pelo conteúdo do seu carácter." O novo residente da Casa Branca veio mostrar que o tal dia sonhado chegou. Há 50 anos, um negro nem se podia sentar ao pé de um branco no autocarro. Neste preciso momento, nos EUA nascem meninos e meninas que crescerão num país governado por um afro-americano. Mesmo que as coisas não lhe corram de feição na dura missão que tem pela frente, até porque a tarefa não lhe será facilitada, Barack Obama já marcou a história e a nossa era. Os americanos votaram na cara da mudança. Não votaram na cor da pele dessa cara. E nós, por todo o Mundo, voltamosa acreditar. Na capacidade de mudança e na evolução da raça humana.
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06 Novembro 2008 - 00h30
Quintas do Norte
Promessa para 2009
Obama traz optimismo para mudar os EUA e o Mundo. Por cá, o Governo apresenta um Orçamento do Estado que promete controlar uma crise de que ainda não sabemos a verdadeira dimensão e cuja duração depende essencialmente do comportamento das grandes economias internacionais.
Aqui pelo Norte, as PME olham com expectativa positiva o anúncio de que o Estado vai pôr as suas dívidas em dia – felizmente, a polémica à volta do salário mínimo morreu - e os cidadãos olham com esperança as promessas de melhoria e de apoio ao desenvolvimento da região. O ano que aí vem está envolto em boas promessas, para o Mundo, para o País e para a Região. Pois, que se cumpram!
Rogério Gomes, Colunista
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06 Novembro 2008 - 09h00
Opinião
Passar à frente
“Os EUA querem enterrar a Administração Bush, a Cimeira das Lajes, a guerra no Iraque e Guantanamo”
Num instante os EUA passaram para a frente da civilização. Acabam de eleger um afro-americano para a Casa Branca, revalidando o mito do ‘Melting pot’ com que iniciaram a fusão de populações de vários continentes que emigraram para o Novo Mundo. Há outras sociedades ocidentais com boas intenções sobre a integração racial mas nenhuma elegeu ainda um presidente negro. Lá nas alturas ressoam as orações de Luther King: "Tive um sonho" ou o profético "Subi ao alto da montanha…" Luther King é um dos maiores vencedores destes novos dias, quarenta anos depois do movimento dos direitos cívicos. A eleição presidencial de Barack Obama não se esgota nessa ilustração excepcional da igualdade de oportunidades. Ela é um indicador de que os EUA querem enterrar a Administração Bush, a Cimeira das Lajes, a guerra no Iraque e as torturas em Guantanamo. Querem reaparecer com a face rejuvenescida de ‘potência benevolente’ perante um mundo em mudança e a requerer mais cooperação do que guerras. Por isso, nem um moderado como McCain chegou para evitar a derrota dos conservadores nas Presidenciais e nas eleições para o Congresso.
É verdade que Obama teve enormes meios financeiros para levar por diante a campanha, a mais cara de sempre de um candidato democrata. Mas isso não explica tudo, sobretudo o significado da vitória. Não explica a mobilização dos apoiantes nem a expressiva participação eleitoral. E muito menos o movimento de esperança que, com epicentro em Chicago, se espalhou pela Terra inteira.
São exigentes os desafios que o novo presidente tem pela frente. Em primeiro lugar, organizar a resposta à crise económica e financeira e avançar com um esquema de maior governança mundial da globalização; depois, responder aos anseios de disciplina ambiental e energética sem diminuir o crescimento sustentável; e ainda contribuir para que os conflitos sejam resolvidos dentro das regras do Direito Internacional e pelo sistema das Nações Unidas, de preferência. No imediato, vamos assistir aos sinais emitidos pela escolha dos mais directos colaboradores, certamente uma mistura entre antigos conselheiros de Bill Clinton e gente descomprometida com os vícios de Washington. Vícios de Washington que tanto animaram as primárias. Obama bem disse no discurso de vitória que os desafios que tinha pela frente requeriam tempo para serem ultrapassados. Falou mesmo em mais do que um mandato. Ele não quer ficar na História como alguém que foi eleito para desiludir.
José Medeiros Ferreira, Professor Universitário
Opinião
Blog
Obama é jovem. É o primeiro negro na Casa Branca. Ganhou civilizadamente a um civilizado McCain (o seu discurso de aceitação da derrota é exemplar). Esperam-no tarefas difíceis dentro e fora dos EUA, sobretudo porque a expectativa é grande e perigosa. Mas, também, porque a América precisa de confiança, de prosperidade e de paz.
Obama é o colírio ideal para devolver à América um pouco de orgulho e de ambição, coisas que Bush desperdiçou sem obter nada em troca. Por outro lado, o fim da era Bush é um momento de esperança para o pensamento liberal e para os conservadores, que têm a oportunidade de se libertar do ‘republicanismo velho’. Mas a hora é de Obama. Pode ser que ele tenha jeito de fingidor e tenha um sorriso de plástico – mesmo assim. A América precisa de sorrir.
Francisco José Viegas, escritor
Bilhete Postal
Ganhou porquê?
Obama ganhou porque soube personificar a diferença face a um dos piores presidentes da História americana. Porque conseguiu aglutinar em torno de si as muitas vertentes do descontentamento que os últimos oitos anos despertaram. Ganhou porque é o melhor comunicador político de que me consigo lembrar.
Porque fez uma campanha sem erros estratégicos. Obama ganhou porque é um daqueles raros líderes que conseguem animar esperanças novas e diferentes nas pessoas mais desiguais. Obama ganhou porque o partido republicano se converteu numa união impossível de ideologias discrepantes. Porque a direita americana não realizou a separação higiénica entre política e religião. Obama ganhou porque essa é a melhor forma de os Estados Unidos consolidarem a sua supremacia mundial.
Carlos Abreu Amorim, Professor Universitário
OS DESILUDIDOS António VitorinoJurista
Os órfãos e as viúvas da Administração Bush consolam-se da derrota antecipando que o novo Presidente americano irá inevitavelmente desiludir os seus fervorosos apoiantes europeus, que situam sobretudo à esquerda.Cometem um duplo erro.Os índices de apoio à eleição de Obama na Europa são muito mais transversais no espectro político do que nos querem fazer crer. Eles exprimem mais o cansaço com a política americana destes últimos anos e o impasse a que chegou a relação transatlântica do que propriamente uma identificação ideológica em sentido estrito.Por outro lado, esse apoio e a atenção com que toda a eleição presidencial americana foi seguida aqui no Velho Continente constituem o mais eficaz antídoto contra o sentimento anti-americano tanto de sectores da esquerda como da direita europeia.Logo, nem a vitória de Obama é apropriável pelo conjunto da esquerda europeia nem representa um momento de reconversão de certas direitas europeias.À esquerda, as correntes antiamericanas provavelmente até teriam preferido que prevalecesse uma lógica de quanto pior melhor, uma lógica de continuidade em relação à cessante Administração americana. E à direita a linha de demarcação é bem mais ideológica: independentemente dos erros e das falhas da candidata a vice-presidente Sarah Palin, é ela e o que representa que verdadeiramente mais entusiasmam os que agora carpem mágoas pela derrota de McCain.No meio disto tudo será fácil fazer de George W. Bush o bode expiatório da derrota republicana. Claro que a impopularidade do Presidente cessante terá pesado no resultado eleitoral (não tanto o Iraque, mas sobretudo a crise financeira, preocupação maior de quase dois terços dos eleitores americanos a 4 de Novembro). Mas o resultado desta eleição é também o julgamento (e sanção) de oito anos de hegemonia neoconservadora, cujos resultados estão à vista. Importa que tal sanção não seja levada apenas a débito da inépcia do ainda Presidente, deixando passar entre as malhas do resultado os seus autores morais.E é aqui que reside a fonte da vitória de Obama. Para além de beneficiar da crise financeira (a qual lhe permitiu algumas tiradas mais eleitoralistas de que ainda poderá vir a arrepender-se no futuro), a grande linha de demarcação foi a de um contraponto ideológico e até cultural, um sentido de coesão e de respeito pela diversidade, expresso tanto no plano da política interna como no da política externa. Por isso, a primeira prioridade do novo Presidente será a de reunificar política e culturalmente a América em torno dos valores que os eleitores sufragaram tão expressivamente, o que aqui e além poderá até desiludir alguns dos seus apoiantes europeus... Mas nenhuma ingenuidade é consentida: Obama foi eleito Presidente dos EUA e é em nome e em função dos interesses da América e dos americanos que irá governar!A eleição de Obama tem um significado simbólico incontornável, tratando-se do primeiro Presidente proveniente da comunidade de origem africana. Nesse significado vai um mundo de sentimentos e de esperanças que apela ao imaginário colectivo não apenas nos EUA mas também à escala planetária. Mas por muito importante que seja a eleição de um Presidente de raça negra, não seria justo para o próprio Obama que a sua eleição se reconduzisse apenas a essa dimensão histórica e simbólica. Aliás a forma como Obama calibrou a questão racial durante os dois anos da sua campanha pode ser considerada magistral e a sua eleição premiou essa clarividência e esse sentido de equilíbrio.A eleição de Obama representa também uma janela de oportunidade de relançamento da relação transatlântica, essencial tanto para os EUA como para a Europa. Perante a magnitude dos problemas com que estamos confrontados, o sucesso desta reaproximação dependerá tanto da forma como Obama a liderar como da resposta conjunta que os europeus estiverem dispostos a dar-lhe.Cabe agora ao resto do mundo aproveitar o espaço aberto pela eleição de Obama. Até porque a maior desilusão é sempre aquela que vem de não fazermos aquilo que nos compete a nós próprios fazer.
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Mais uma imagem de rara beleza captada numa prova de esgrima, no embate.A imagem diz tudo....
16 Agosto - Os jogadores do Sporting mostram ao mundo a mais recente conquista, após baterem a Supertaça frente ao FC Porto
Porto, 26 Julho - O FC Porto apresentou a equipa para a época 2008/09 e para a posteridade ficou a foto de família em pleno relvado do Estádio do Dragão
Os Benfiquistas não esquecem o cebola....
Lisboa, 9 Agosto - A apresentação do Benfica aos sócios decorreu este sábado no meio de grande entusiasmo. Antes do embate com o Feyenoord, os artistas mostraram-se aos adeptos.
Porto, 9 Maio - A decisão da Liga em castigar o Boavista com a pena de descida de divisão deixou os adeptos boavisteiros desolados e revoltados. Manuel do Laço, conhecido simpatizante do clube, não escondeu mesmo as lágrimas
Porto, 11 Janeiro - O FC Porto apresentou o monolugar com que irá competir na Superleague Fórmula. Na cerimónia, "apadrinhada" pelo plantel do futebol, marcaram presença, entre outros, os pilotos Tiago Monteiro, Álvaro Parente, Armindo Araújo, Pedro Matos Chaves e Ni Amorim
Porto, 8 Julho - O FC Porto apresentou ao início da tarde os equipamentos para a temporada 2008/09, destacando-se o alternativo azul celeste
Appiano Gentile, 18 Julho - O Inter Milão apresentou os novos equipamentos para 2008/09. Adriano, Zanetti, Júlio César, Materazzi e Mancini, acompanhados por Mourinho, serviram como modelos.
Roma, 7 de Maio - Antes de defrontar a Lazio a contar para as meias-finais da Taça de Itália, o plantel do Inter de Milão, com Figo, Maniche e Pelé, foi recebido pelo Papa Bento XVI. É a segunda vez que Maniche vai ao Vaticano.
Milão, 2 Junho - Mourinho junto com funcionário do Inter pouco depois da chegada à capital lombarda, que ocorreu às 22.30. No aeroporto foi notório o acotovelamento dos jornalistas para tirar o melhor "boneco" ao "Special One
Milão, 3 Junho - Mourinho apresentado oficialmente como treinador do Inter. O português respondeu durante quase uma hora a perguntas de dezenas de jornalistas. Foi o primeiro show “Il Speciale” em Itália
simple THE BEST
ROKET
Paris, 8 Junho - Nadal recebeu um troféu que já conhece bem pela quarta vez consecutiva. Na final de Roland Garros, o tenista espanhol venceu Roger Federer por 6-1, 6-3 e 6-0
Freetwon, 20 Janeiro - Freetwon, 20 Janeiro - David Beckham esteve Serra Leoa como Embaixador da Boa Vontade da UNICEF. O ex-capitão da selecção inglesa esteve na capital e também viajou por diversas áreas rurais. Como não podia deixar de ser rolou a bola...
capitão sul-africano John Smit, ladeado pelo presidente Thabo Mbeki, levanta o troféu de campeão do Mundo de râguebi após triunfo (15-6) sobre a Inglaterra na final
Stefano Gabbana --- Madonna ---- Domenico Dolce
New Jersey, 5 Fevereiro - O espanhol Pau Gasol, ex-Memphis Grizzlies, contribuiu com 24 pontos e 12 ressaltos para a vitória dos Lakers por 105-90 sobre os New Jersey Nets. Foi uma estreia em grande
São Petersburgo, 18 Fevereiro - O tenista Roger Federer venceu a categoria de "Atleta Masculino do Ano" no decorrer da cerimónia dos Laureus World Sports Awards, realizada em São Petersburgo. É a quarta vez consecutiva que o suíço, de 25 anos, recebe esta distinção, um recorde
Londres, 5 Julho - Venus Williams, ao superar a irmã Serena em dois sets - 7-5 e 6-4, conquistou o Torneio de Wimbledon pela quinta vez na sua carreira. Venus tinha já triunfado na relva de Wimbledon em 2000, 2001, 2005 e 2007
Melbourne, 25 Janeiro - As ucranianas Alona e Kateryna Bondarenko conquistaram o título de pares do Open da Austrália, ao baterem na final a dupla composta pela bielorrusa Victoria Azarenka e pela israelita Shahar Peer
Londres, 6 Julho - Rafael Nadal trinca a taça de Wimbledon, depois da épica vitória sobre Federer, numa maratona de ténis que durou quase cinco horas (4:48) e interrompida duas vezes devido à chuva
Pequim, 13 Agosto - Definitivamente uma das mais incríveis imagens deste dia de competição na China. O húngaro Janos Baranyai grita de dor após deslocar o ombro direito quando tentava erguer 148 quilos
Pequim, 10 Agosto - Mais uma imagem de rara beleza captada numa prova de esgrima, no embate entre a francesa Fabrice Jannet, à esquerda, e a sul-coreana Jinsun Jung
Kaiyang, 26 Março - Anéis olímpicos formados nos campos de colza e trigo em Kaiyang na província de Guizhou, no sudoeste da China. Cada um tem 136 metros de diâmetro
Lisboa, 16 Março - Como já é hábito, os portugueses corresponderam em peso à Meia-Maratona e deram mais uma vez uma excelente imagem da Ponte 25 de Abril. Gebrselassie e Salina Kosgei foram os grandes vencedores da prova lisboeta
A organização dos Jogos Olímpicos de 2012, que vão decorrer em Londres, revelou hoje os planos do futuro Estádio Olímpico a construir na capital inglesa, com capacidade para 80.000 espectadores
Pequim, 18 de Abril - Ainda faltam uns bons meses para o início dos Jogos Olímpicos, mas o Estádio Olímpico Nacional, na capital da China, também conhecido por o "Ninho do Pássaro", recebeu nesta sexta-feira a sua primeira competição, o Desafio da Marcha
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Pequim, 10 Agosto - Mais uma imagem de rara beleza captada numa prova de esgrima, no embate entre a francesa Fabrice Jannet, à esquerda, e a sul-coreana Jinsun Jung
Kaiyang, 26 Março - Anéis olímpicos formados nos campos de colza e trigo em Kaiyang na província de Guizhou, no sudoeste da China. Cada um tem 136 metros de diâmetro
Lisboa, 16 Março - Como já é hábito, os portugueses corresponderam em peso à Meia-Maratona e deram mais uma vez uma excelente imagem da Ponte 25 de Abril. Gebrselassie e Salina Kosgei foram os grandes vencedores da prova lisboeta
A organização dos Jogos Olímpicos de 2012, que vão decorrer em Londres, revelou hoje os planos do futuro Estádio Olímpico a construir na capital inglesa, com capacidade para 80.000 espectadores
Pequim, 18 de Abril - Ainda faltam uns bons meses para o início dos Jogos Olímpicos, mas o Estádio Olímpico Nacional, na capital da China, também conhecido por o "Ninho do Pássaro", recebeu nesta sexta-feira a sua primeira competição, o Desafio da Marcha
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CRÓNICAS - OPNIONS MAKERS
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Nobel/Literatura: Le Clézio, escritor do rigor formal e do sentido de viagem -
Por:José Manuel Mendes
LITERATURA
LITERATURA
Lisboa, 9 Out (Lusa) - Jean-Marie Gustave Le Clézio, distinguido este ano com o Prémio Nobel da Literatura, escreveu o seu primeiro livro aos sete anos durante uma travessia marítima rumo à Nigéria.
A sua literatura confunde-se com as viagens, que não cessou de empreender. Ganhou a admiração de filósofos como Michel Foucault e Gilles Deleuze, que apreciaram a sua escrita inovadora e revoltada.
Filho de um cirurgião britânico e de uma francesa da Bretanha, nasceu em Nice, sul da França, em 13 de Abril de 1940.
Formado em Letras, trabalhou na Universidade de Bristol e de Londres, em Inglaterra, dedicando uma tese ao poeta Henri Michaux, também ele um viajante. Com 23 anos ganha o Prémio Renaudot, um importante galardão francês, por um ensaio que ainda hoje é considerado magistral, "Le procès-verbal".
Depois de ensinar nos Estados Unidos, em 1967 cumpre o serviço militar na Tailândia, como cooperante, donde é expulso por denunciar a prostituição infantil. Termina o seu serviço militar no México.
Durante quatro anos, de 1970 a 1974, partilha a vida com índios do Panamá, uma experiência que terá grande influência na sua escrita. Depois, ensina em Albuquerque, nos Estados Unidos.
A sua obra, que compreende contos, romances, ensaios, novelas, traduções de mitologia ameríndia, numerosos prefácios e artigos, é considerada como crítica do Ocidente materialista e uma atenção constante aos mais fracos e aos excluídos.
Numa sondagem, realizada em 1994 pela revista francesa Lire, foi considerado como o "maior escritor vivo da língua francesa".
Casado e pai de duas filhas, Le Clézio vive em Albuquerque, mas desloca-se frequentemente entre Nice e uma casa que possui na Bretanha.
"O Processo de Adão Pollo", "O caçador de tesouros", "Deserto" (considerado a sua obra-prima), "Estrela errante", "Diego e Frida", "Índio branco", são os livros de Le Clézio traduzidos em Portugal, cuja obra ultrapassa os 50 títulos.
A sua literatura confunde-se com as viagens, que não cessou de empreender. Ganhou a admiração de filósofos como Michel Foucault e Gilles Deleuze, que apreciaram a sua escrita inovadora e revoltada.
Filho de um cirurgião britânico e de uma francesa da Bretanha, nasceu em Nice, sul da França, em 13 de Abril de 1940.
Formado em Letras, trabalhou na Universidade de Bristol e de Londres, em Inglaterra, dedicando uma tese ao poeta Henri Michaux, também ele um viajante. Com 23 anos ganha o Prémio Renaudot, um importante galardão francês, por um ensaio que ainda hoje é considerado magistral, "Le procès-verbal".
Depois de ensinar nos Estados Unidos, em 1967 cumpre o serviço militar na Tailândia, como cooperante, donde é expulso por denunciar a prostituição infantil. Termina o seu serviço militar no México.
Durante quatro anos, de 1970 a 1974, partilha a vida com índios do Panamá, uma experiência que terá grande influência na sua escrita. Depois, ensina em Albuquerque, nos Estados Unidos.
A sua obra, que compreende contos, romances, ensaios, novelas, traduções de mitologia ameríndia, numerosos prefácios e artigos, é considerada como crítica do Ocidente materialista e uma atenção constante aos mais fracos e aos excluídos.
Numa sondagem, realizada em 1994 pela revista francesa Lire, foi considerado como o "maior escritor vivo da língua francesa".
Casado e pai de duas filhas, Le Clézio vive em Albuquerque, mas desloca-se frequentemente entre Nice e uma casa que possui na Bretanha.
"O Processo de Adão Pollo", "O caçador de tesouros", "Deserto" (considerado a sua obra-prima), "Estrela errante", "Diego e Frida", "Índio branco", são os livros de Le Clézio traduzidos em Portugal, cuja obra ultrapassa os 50 títulos.
O escritor francês Jean-Marie Le Clézio, premiado com o Nobel da Literatura, "elaborou sempre um processo de experimentação e de rigor formal", disse hoje à agência Lusa o presidente da Associação Portuguesa de Escritores (APE), José Manuel Mendes.
"É alguém que faz o cruzamento da literatura anglo-saxónica, tendo em conta o seu percurso geográfico, e os caminhos inconformistas da literatura francesa e que conduziu a uma bibliografia onde podemos encontrar o sentido de viagem, do maravilhoso, mas também dos sofrimentos da Humanidade", disse José Manuel Mendes.
O presidente da APE sublinhou ainda "a busca de ritmos de magia" e uma escrita que "pratica diferentes géneros narrativos, incluindo o da literatura para a infância".
José Manuel Mendes, que disse ter lido toda a obra do autor francês, escolhe os romances "O caçador de tesouros" e "Estrela Errante", ambos editados em Portugal.
Jean-Marie Gustave Le Clézio, 68 anos, foi distinguido hoje com o Nobel da Literatura por ser um "escritor da ruptura, aventura poética e êxtase sensual, explorador de uma Humanidade mais além e na base da civilização reinante", anunciou hoje a Academia sueca.
Le Clézio receberá o Nobel, com um valor monetário de 1,02 milhão de euros) a 10 de Dezembro em Estocolmo.
SS.
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"É alguém que faz o cruzamento da literatura anglo-saxónica, tendo em conta o seu percurso geográfico, e os caminhos inconformistas da literatura francesa e que conduziu a uma bibliografia onde podemos encontrar o sentido de viagem, do maravilhoso, mas também dos sofrimentos da Humanidade", disse José Manuel Mendes.
O presidente da APE sublinhou ainda "a busca de ritmos de magia" e uma escrita que "pratica diferentes géneros narrativos, incluindo o da literatura para a infância".
José Manuel Mendes, que disse ter lido toda a obra do autor francês, escolhe os romances "O caçador de tesouros" e "Estrela Errante", ambos editados em Portugal.
Jean-Marie Gustave Le Clézio, 68 anos, foi distinguido hoje com o Nobel da Literatura por ser um "escritor da ruptura, aventura poética e êxtase sensual, explorador de uma Humanidade mais além e na base da civilização reinante", anunciou hoje a Academia sueca.
Le Clézio receberá o Nobel, com um valor monetário de 1,02 milhão de euros) a 10 de Dezembro em Estocolmo.
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Opinião - Pedro Camacho
Um novo mundo?
Wall Street e as praças financeiras mundiais sofreram um rude golpe. Mas as vozes de «mudança» que se fazem ouvir dão pelo nome de Soros ou Gates...
Com este novo pico de crise financeira, muitas pessoas começam a perguntar se o sistema capitalista está a chegar ao fim. Como se não bastassem as intervenções «estatizantes» da superliberal administração norte-americana, até mesmo Gates, símbolo por excelência do sucesso americano e das multinacionais, apareceu pela mesma altura a falar de capitalismo criativo.
O capitalismo tem os dias contados? Estamos a viver uma qualquer fase de transição para um qualquer modelo económico diferente, como se começa a escrever em alguns sítios? Não me parece. O capitalismo está aí para ficar. E mais forte que nunca.
Os norte-americanos são liberais na economia, mas não são parvos. Esta última intervenção das autoridades monetárias no sistema financeiro, através, nomeadamente, da compra dos activos de risco na posse de seguradoras e bancos, e que ninguém agora quer, não tem por objectivo principal salvar as empresas que entraram em falência ou ficaram em situação de exposição crítica. Nem mesmo os muitos milhares de postos de trabalho directos que garantem. Ao contrário do que se passa na Europa, a economia norte-americana dá «todos os dias» provas de que é insensível a esse género de dramas, situações que as bolsas aplaudem e que os americanos esperam que o «mercado» resolva, criando novas oportunidades de emprego. O objectivo último destas intervenções é, e sempre será, a manutenção da própria credibilidade do sistema, tal como ele é, para garantir que tudo volte ao business as usual.
Ao contrário do que muitos discursos parecem insinuar, esta não é a primeira vez que os poderes públicos dos Estados Unidos intervêm em situação de crise aguda. Já o fizeram inúmeras vezes, ao longo da História. E têm, inclusivamente, actuado para lá do campo etéreo e caótico dos mercados bolsistas. Ora a nível federal ora a nível estadual, a mão do Estado deu muitas vezes uma forte ajuda à mão invisível do liberalismo para resolver situações críticas para a economia em numerosos sectores, do fi nanceiro à distribuição de água ou de electricidade.
O capitalismo tem os dias contados? Estamos a viver uma qualquer fase de transição para um qualquer modelo económico diferente, como se começa a escrever em alguns sítios? Não me parece. O capitalismo está aí para ficar. E mais forte que nunca.
Os norte-americanos são liberais na economia, mas não são parvos. Esta última intervenção das autoridades monetárias no sistema financeiro, através, nomeadamente, da compra dos activos de risco na posse de seguradoras e bancos, e que ninguém agora quer, não tem por objectivo principal salvar as empresas que entraram em falência ou ficaram em situação de exposição crítica. Nem mesmo os muitos milhares de postos de trabalho directos que garantem. Ao contrário do que se passa na Europa, a economia norte-americana dá «todos os dias» provas de que é insensível a esse género de dramas, situações que as bolsas aplaudem e que os americanos esperam que o «mercado» resolva, criando novas oportunidades de emprego. O objectivo último destas intervenções é, e sempre será, a manutenção da própria credibilidade do sistema, tal como ele é, para garantir que tudo volte ao business as usual.
Ao contrário do que muitos discursos parecem insinuar, esta não é a primeira vez que os poderes públicos dos Estados Unidos intervêm em situação de crise aguda. Já o fizeram inúmeras vezes, ao longo da História. E têm, inclusivamente, actuado para lá do campo etéreo e caótico dos mercados bolsistas. Ora a nível federal ora a nível estadual, a mão do Estado deu muitas vezes uma forte ajuda à mão invisível do liberalismo para resolver situações críticas para a economia em numerosos sectores, do fi nanceiro à distribuição de água ou de electricidade.
OS ESTADOS UNIDOS são uma economia capitalista, que acredita na iniciativa privada e nos mecanismos de mercado. Mas mesmo todos aqueles que olham para os EUA como um modelo de alheamento excessivo do Estado, quer na condução da economia quer na resolução dos problemas sociais, não devem cair no erro de pensar que ali não há Estado. Sempre existiu e actuou quando considerou que o devia fazer – e sempre sem receio de ser acusado de fazer «nacionalizações».
Isto não significa que tudo vai bem no coração do capitalismo ou nos muitos outros circuitos por onde os fluxos financeiros andam, mundo fora. Bem pelo contrário, é indiscutível que alguma coisa falhou e muito. Embora tenha sido uma tempestade anunciada, que se arrasta há já cerca de um ano, a verdade é que a crise do subprime teve condições para aparecer e crescer, mau grado a apertada teia de regulação e de vigilância das autoridades financeiras. As grandes referências da banca de investimento global, os mercados financeiros mundiais, a expressão máxima do capitalismo que é Wall Street, todos sofreram um rude golpe na sua reputação e credibilidade.
Isto não significa que tudo vai bem no coração do capitalismo ou nos muitos outros circuitos por onde os fluxos financeiros andam, mundo fora. Bem pelo contrário, é indiscutível que alguma coisa falhou e muito. Embora tenha sido uma tempestade anunciada, que se arrasta há já cerca de um ano, a verdade é que a crise do subprime teve condições para aparecer e crescer, mau grado a apertada teia de regulação e de vigilância das autoridades financeiras. As grandes referências da banca de investimento global, os mercados financeiros mundiais, a expressão máxima do capitalismo que é Wall Street, todos sofreram um rude golpe na sua reputação e credibilidade.
Isso é um facto indiscutível. Ninguém sabe ainda exactamente qual é a verdadeira dimensão desta crise e de que forma ela se fará sentir nos Estados Unidos e no resto do mundo. E há quem diga mesmo que, aconteça o que acontecer, o que já caiu é mais do que sufi ciente para que Wall Street não volte a ser a mesma coisa. Talvez sim, talvez não. Mas a verdade é que parece que nos esquecemos todos das muitas crises por que já passou Wall Street, tenham elas nascido lá, ou lá chegado, vindas do outro lado do mundo.
MAS O CAPITALISMO, esse, continua de pedra e cal. Basta ver que as principais vozes da mudança vêm dos seus principais papas. A começar por George Soros, Bill Gates ou mesmo Richard Branson, que esteve recentemente em Lisboa, a convite da VISÃO, Exame e Ministério da Economia, todos eles falam de um novo capitalismo, onde as grandes empresas assumem responsabilidade social à dimensão dos seus lucros. Um discurso que ganha adeptos um pouco por todo o mundo, inclusive em Portugal. E que pode, aliás, ser alargado a outros «papas» de outras latitudes, como Bono ou Geldof. De uma maneira ou de outra, mais ou menos anti-sistema, todos eles vivem e usam o capitalismo, e andam de braço dado com outros grandes capitalistas, para tornar o planeta um pouco melhor.
MAS O CAPITALISMO, esse, continua de pedra e cal. Basta ver que as principais vozes da mudança vêm dos seus principais papas. A começar por George Soros, Bill Gates ou mesmo Richard Branson, que esteve recentemente em Lisboa, a convite da VISÃO, Exame e Ministério da Economia, todos eles falam de um novo capitalismo, onde as grandes empresas assumem responsabilidade social à dimensão dos seus lucros. Um discurso que ganha adeptos um pouco por todo o mundo, inclusive em Portugal. E que pode, aliás, ser alargado a outros «papas» de outras latitudes, como Bono ou Geldof. De uma maneira ou de outra, mais ou menos anti-sistema, todos eles vivem e usam o capitalismo, e andam de braço dado com outros grandes capitalistas, para tornar o planeta um pouco melhor.
A força do capitalismo está no facto de, infelizmente, ninguém conseguir oferecer uma alternativa melhor e mais justa a quem preza a liberdade individual. A parte boa desta fatalidade é que, estando nós todos no mesmo saco, isso conduzirá necessariamente a um melhor capitalismo. Sobretudo se a esquerda não se perder em ilusões sem sentido.
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A seguradora AIG já era famosa quando andava sob o pescoço de Cristiano Ronaldo, na camisola do Manchester. Mas famosa mesmo, mesmo, foi quando os americanos passaram a andar com a AIG ao pescoço. Esganados. Ela falira e não fosse sugarem-se os dinheiros públicos (85 mil milhões de dólares) a empresa fechava. Não fechar é bom e o que é bom festeja-se. Alguns executivos da AIG foram para um luxuoso hotel de Monarch Beach, Califórnia, com factura final de 300 mil euros, entre diárias, almoços e pedicura. Tudo pago pela empresa que, já vimos, era paga pelos contribuintes. Evidentemente, os invejosos do costume foram aos arames - na Câmara dos Representantes, alguns dos eleitos que ainda há pouco tinham votado o resgate da AIG indignaram-se com o abuso. É verdade que aqueles executivos, em superficial análise, parecem não merecer prémio algum, quanto mais pedicura. Como se fosse fácil lidar com a consciência. Esta é aquela voz interior que nos diz que alguém está olhando. Sem poderem usufruir dos luxos com merecida tranquilidade, aqueles executivos estavam, no entanto, a dar-nos uma esperança: a crise não é geral.
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Em defesa da América
POR: Miguel Monjardino
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A história diz-nos que os EUA são o país mais bem sucedido da história. As últimas semanas têm levado muita gente a dizer-nos que os EUA estão em declínio e que o século XXI será muitas coisas mas não será influenciado de uma forma decisiva por Washington. Será verdade? Duvido.
As últimas semanas tornaram bastante mais transparentes os problemas internos dos EUA e os seus desafios externos. Os problemas e os desafios são reais e a sua solução ou gestão certamente exigentes. Neste contexto, apostar no declínio dos EUA é extremamente popular. A aposta ignora o enorme potencial, energia e optimismo dos americanos em relação ao seu país e ao seu papel no mundo. Mas antes de chegar à aposta que me interessa, é crucial prestar atenção aos problemas internos e aos desafios externos.
As últimas semanas tornaram bastante mais transparentes os problemas internos dos EUA e os seus desafios externos. Os problemas e os desafios são reais e a sua solução ou gestão certamente exigentes. Neste contexto, apostar no declínio dos EUA é extremamente popular. A aposta ignora o enorme potencial, energia e optimismo dos americanos em relação ao seu país e ao seu papel no mundo. Mas antes de chegar à aposta que me interessa, é crucial prestar atenção aos problemas internos e aos desafios externos.
Começando pelos primeiros. O intenso debate sobre a legislação para evitar o colapso do sistema financeiro e da economia americana mostra a dimensão da revolta e desconfiança de importantes sectores da sociedade americana em relação às suas lideranças políticas. Este ponto tem sido pouco acentuado entre nós.
Quando a Câmara dos Representantes chumbou a legislação inicialmente submetida pelo secretário do Tesouro Hank Paulson ao Congresso no início da semana, concentrámos toda a nossa atenção e perplexidade na revolta dos republicanos contra George W. Bush. Esquecemo-nos de que os democratas têm a maioria absoluta na Câmara dos Representantes e que 95 dos seus representantes também votaram contra a legislação negociada, aprovada e anunciada por Nancy Pelosi, líder da maioria democrata, e Barney Frank, presidente do Comité dos Serviços Financeiros.
O que é que isto mostra? Mostra que, para lá de uma revolta republicana contra George W. Bush - que é real -, há uma enorme desconfiança e desprezo de largos sectores da sociedade americana em relação aos seus líderes políticos democratas e republicanos. Tal como muitos bancos e empresas, Washington está sem capital político e sem crédito.
Do ponto de vista orçamental e fiscal, a enorme maioria dos congressistas democratas e republicanos e a Administração W. Bush têm sido totalmente irresponsáveis. Os compromissos orçamentais assumidos a nível da segurança social e saúde e o nível de gastos governamentais são insustentáveis e, no caso de não serem rectificados nos próximos anos por políticos corajosos e prudentes, terão consequências severas para as próximas gerações. Numa altura em que tanto se fala do falhanço dos mercados, é bom relembrar que Washington está totalmente fora de controlo do ponto de vista orçamental e fiscal há muito tempo.
Em termos externos, o principal desafio de Washington será mudar a percepção que os líderes políticos estrangeiros e as suas sociedades têm dos EUA. Esta percepção tende hoje em dia a ser bastante negativa. Uma das grandes acusações que são feitas a George W. Bush é ter transformado os EUA numa "nação perigosa" e ideológica. Do ponto de vista histórico a acusação não faz sentido. Como John Quincy Adams, o sexto Presidente dos EUA, escreveu em 1817, a Europa via a América como "um membro muito perigoso da sociedade das nações". Um olhar para os discursos de Adams mostra também que os EUA foram desde a sua fundação um país extremamente ideológico. Ao contrário do que as pessoas pensam, dizem e escrevem, a Administração W. Bush não é uma aberração na história política americana.
O que é novo e significativo do ponto de vista estratégico é a dimensão da oposição e ressentimento em relação aos EUA e às suas políticas. Esta oposição e ressentimento são hoje em dia generalizadas e são também o grande acontecimento político da geração que cresceu à sombra do 11 de Setembro. Como Geoffrey Wheatcroft escreveu no 'International Herald Tribune' no início de Setembro, os EUA "não são temidos nem respeitados". Do ponto de vista da credibilidade política, ideológica e financeira, as últimas semanas foram péssimas para os EUA. Os próximos anos prometem dificuldades. Nada será como dantes, dizem-nos.
É provável. A política internacional, felizmente, não é uma coisa estática. A ascensão e declínio dos impérios, cidades-estado e países é uma coisa natural. O declínio dos EUA é algo que tem vindo a ser regularmente previsto e intensamente desejado nas últimas décadas. As previsões de declínio ignoram os tendões e os músculos do país - a pujança demográfica da América, a dimensão do seu mercado interno, a sua enorme produtividade e capacidade de inovação, a qualidade das suas universidades e instituições de investigação científica, a capacidade empreendedora dos americanos e a sua enorme determinação perante dificuldades e desafios. Nos dias que correm, apostar publicamente a favor dos EUA não é fácil. Pela parte que me toca, estou disposto a fazê-lo. A América continua a ter tudo o que é necessário para ter um futuro brilhante. Aceito apostas. Haverá interessados?
James Bond Stockdale
O vice-almirante James Bond Stockdale (1923-2005) foi um candidato improvável à vice-presidência dos EUA em 1992. "Quem sou eu? O que é que eu faço aqui?", perguntou ele no início do debate com Al Gore e Dan Quayle perante a incompreensão geral. Do ponto de vista político, o debate foi um desastre para Stockdale, que rapidamente foi esquecido. Stockdale merece ser relembrado na semana do debate vice-presidencial entre Sarah Palin e Joseph Biden pela sua extraordinária carreira militar e pela sua liderança dos prisioneiros de guerra americanos no Vietname entre 1965 e 1973. O seu livro 'Confessions of a Philosophical Fighter Pilot' (Stanford, Califórnia: Hoover Institution Press, 1995) é um grande livro sobre liderança e sobrevivência em situações extremas.
Miguel Monjardino
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A mania que têm da pontualidade
Por: Rui Cartaxana
A ideia vaga que os portugueses têm da pontualidade (‘qualidade do que é pontual’, que é aquele ‘que se apresenta à hora marcada’, segundo os dicionários) não podia deixar de se estender ao mundo do futebol, onde os horários não são obviamente para cumprir, mas para constarem dos programas e outros fins sociais. O desleixo com os horários estende-se, como é lógico, ao começo dos jogos de futebol, o seu espectáculo por excelência, mesmo que o seu cumprimento seja exigido pelos regulamentos… que, ainda bem, ninguém se preocupa muito em cumprir. No principal encontro desta segunda jornada do campeonato da cerveja sem álcool, o Benfica-FC Porto, o jogo começou com 6 minutos de atraso, no segundo mais importante, o Sp. Braga-Sporting, a festa principiou mais de 5 minutos para além da hora. Nem atrasos foram. Mas num país onde as reuniões dos ilustres representantes do povo, na AR, os outros espectáculos, os julgamentos e os prazos dos processos, os banquetes oficiais nunca nada começa à hora marcada, por que raio é que os jogos do futebol indígena haviam de começar? E a não ser que se nos deparemos por aí com algum chato com a mania das pontualidades, como acontece, por exemplo, com o doutor Cavaco, não nos amofinemos muito com o rigor das horas, que a vida é curta e, que se saiba, nem sequer costuma marcar a hora. Imaginem a minha indignação ao acabar de ler uma notícia oriunda do Uruguai, que me diz que um árbitro de futebol chamado Liber Prudente (só podia ser alguém com um nome destes), num encontro da 2ª jornada do campeonato lá do sítio, puniu a equipa dos donos da casa, o conhecido Nacional de Montevideu, por esta ter entrado em campo com… um minuto de atraso! Isso mesmo, um minuto de atraso.
O jogo, entre os donos da casa e a equipa adversária, a do Villa Española, estava marcado para as 15.30 e 60 segundos depois, o imprudente Prudente, certamente um maníaco-depressivo com a obsessão das horas, suspendeu o jogo a atribuiu a vitória aos visitantes por 2-0!Poupo os leitores aos pormenores que se seguiram – a Direcção do clube ameaçou abandonar a competição, os seus adeptos provocaram distúrbios, várias pessoas, entre as quais dois jornalistas, foram agredidas, houve umas dezenas de feridos, automóveis destruídos, lojas vandalizadas, etc... Enfim, uma justíssima indignação. Mas quem, por menos dos tradicionais 15 minutos de tolerância, se lembra de punir uma equipa com uma derrota? Só um árbitro, claro.
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BY: Rui Cartaxana
O FC Porto comemorou em 28 de Agosto o seu "alegado" 115.º aniversário, para citar um importante jornal desportivo com “uma celebração discreta e muito intimista”, coisa que nos põem a imaginar o seu vitalício presidente a recitar Régio e a esposa, em fundo, a tocar Mozart ao piano. E digo "alegado" porque nem todos os portistas, que durante quase 90 anos se habituaram a comemorar o aniversário do clube no dia 2 de Agosto, aceitam como boa a engenharia histórica que o sr. Pinto da Costa fez em finais dos anos 80, acrescentando nada mais de 13 anos à já longa vida do clube, e tornando-o, de uma assentada, "centenário". Não sei se o ora suspenso presidente se inspirou numa espécie de repescagem histórica feita anos antes pelo seu rival preferido, o Benfica, que, mais modesto, se contentou em "recuperar" apenas 4 anos da sua história através do parceiro com o qual se fundaria, de facto, em 1908.
Sei é que, com este golpe de génio, o insigne e esmagador presidente azul venceria mais uma vez o Benfica, tornando o seu FC Porto centenário antes dos encarnados. O FC Porto foi fundado realmente em 2 de Agosto de 1906, pelo eng. José Monteiro da Costa, cujos descendentes ainda pensaram, na altura, desmascarar este atropelo à sua memória. Conheci as duas pessoas recrutadas, digamos assim, para montar e dar alguma verosimilhança à nova "versão histórica" da fundação do clube.
Uma delas era um curioso jornalista, tenaz coleccionador de histórias, uma espécie de pesquisador de ouro que esmiuçava tudo em que mexia, (cujo não identifico porque ainda é vivo e não lhe pedi autorização para o meter nisto) a outra era, na altura, um conhecido pianista e homem-de-sete-ofícios, que criou ou copiou da televisão italiana a figura de um boneco que teve algum sucesso na RTP, o “Toppo-Giggio”. A base de trabalho de ambos foi, salvo erro, o recorte de um jornal datado de 1882 ou 1893, em que era referido um certo Foot-Ball Club do Porto, criado por um senhor António Nicolau de Almeida, do qual se perderia totalmente o rasto ou mais referências nos anos que se seguiram e que tudo indica terá desaparecido como uma alma penada. Com ele, Pinto da Costa, aumentou nada menos de 13 anos (cruzes, canhoto) ao FC Porto. Ou seja, não se contentou em “fazer história" no seu clube durante o seu tempo, reescreveu-a andando para trás no tempo até ao século anterior
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Quando o capitalismo regula mal
Por: Henrique Monteiro
Subitamente, como numa reviravolta vingativa de um filme barato, o capitalismo passou a ser o mau da fita. Há uma crise e há culpas. Foi de não haver regulação, dizem.
Eu concordo inteiramente com a ideia de que é necessária regulação do mercado (na verdade, até Bush começa a perceber que não há outra hipótese) e penso que o mercado, por si só, embora tendendo para se auto-regular pode conduzir a situações indesejáveis e insustentáveis. Mas, embora não negue a necessidade de certa intervenção do Estado, desconfio profundamente dos que passam a vida a pedi-la e não vivem sem ela.
Eu concordo inteiramente com a ideia de que é necessária regulação do mercado (na verdade, até Bush começa a perceber que não há outra hipótese) e penso que o mercado, por si só, embora tendendo para se auto-regular pode conduzir a situações indesejáveis e insustentáveis. Mas, embora não negue a necessidade de certa intervenção do Estado, desconfio profundamente dos que passam a vida a pedi-la e não vivem sem ela.
Vamos a factos. O capitalismo, com mais ou menos crises, representou um enorme avanço civilizacional na autonomia e liberdades individuais. Essa pulsão, que vem desde o Renascimento, mantém-se ainda hoje. As sociedades mais livres, onde o homem consegue maiores realizações pessoais, artísticas e empreendedoras, são capitalistas.
As alternativas ensaiadas a este modelo resultaram ou em anarquias improdutivas (recorde-se Robert Owen e a sua experiência em New Harmony) ou - o que foi mais frequente - em ditaduras ferozes, apenas capazes de distribuir riqueza pelas suas próprias oligarquias. Hoje em dia, o capitalismo funciona em todo o mundo e, se nos EUA e na Europa sofre uma crise, continua vigoroso, por ora, na China, na Venezuela ou em Angola. Nesses países em que o Estado intervém de forma total na economia e mesmo nos mercados financeiros, a distribuição da riqueza resume-se aos aliados, amigos e afilhados dos respectivos regimes.
O que falhou, então, no nosso capitalismo? A resposta deu-a em parte Miguel Sousa Tavares na sua crónica da semana passada: falhou a ética e abundou a ganância e o crime económico.
O capitalismo pode funcionar com mais ou menos intervenção estatal, mas regula mal, é totalmente pérfido se não estiver associado àquela ética estrita de que falava Max Weber em 'A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo'.
Nesse aspecto, não foi preciso vir a esquerda alertar para os danos do capitalismo - a Igreja Católica andava a pregar isso mesmo há anos.
Não foi o mercado em si, nem tão pouco a ausência de reguladores que provocou esta crise. Foi a falta de senso e a cobiça extrema. Ora, estes são males que não são específicos do capitalismo, mas do género humano. A crise resulta, de facto, de uma maneira de ver e de uma organização social. Mas, infelizmente para certa esquerda, não se compõe com as suas receitas.
New York, New York -
Carla Ferreira Alves
A primeira vez que cheguei a Nova Iorque não foi a cidade que me impressionou logo. A linha iluminada daquele horizonte pontilhado de luzes e reflexos no caminho de JFK para Manhattan é uma espécie de bilhete universal, uma imagem gravada dentro das nossas cabeças, e uma das mais belas paisagens do mundo mas, não foi isso que me impressionou. Foi o som, o som subterrâneo da cidade, o som surdo e confuso de milhões de pessoas apinhadas num espaço restrito, uma ilha de nada onde cabe o mundo inteiro.
O som das ambulâncias e carros de bombeiros, o som dos respiradouros do Metro donde se escapava um vapor quente e húmido com cheiro a gente, o som das buzinas dos carros, o som electrónico dos semáforos, dos letreiros de néon a crepitar, o som dos vendedores de cachorros quentes e "pretzels", o som do vento nas árvores de Central Park, o som dos elevadores nos hotéis, o som das sirenes da polícia, o som de tiros algures, o som dos lamentos dos pedintes e vagabundos sentados nas esquinas das ruas com um letreiro ao pescoço, o som das gargalhadas nos restaurantes, o som de garrafas a partir contra o asfalto, o som das patas dos cavalos das charretes, o som dos amantes. O som da desordem da Humanidade, o som da tristeza, o som da felicidade. O som dos gritos e vozes em muitas línguas, espanhol, inglês, chinês, hindu, francês, sueco, árabe, urdu, o som bélico da mistura do homem com o homem numa harmonia sem precedentes na sua história.
Nova Iorque é isso, a Babilónia no seu período de esplendor, a Torre de Babel original, onde os contrários produzem o melhor exemplo do directo dos homens a perseguir a felicidade, como disseram os fundadores da América. A cidade era muito mais perigosa nessa época, e saía-se à rua com 30 dólares na carteira para dar ao assaltante "just in case". Lembro-me que uma noite me deu uma fome criativa por volta das três da manhã e resolvi ir a uma "deli" na 3ª Avenida, junto à Rua 64, uma zona abastada e residencial de Manhattan. De repente, entrei num episódio de "Hill Street Blues", uma série de polícias e ladrões mais ou menos desse tempo. A loja foi assaltada por um ladrão solitário e armado e a polícia entrou por ali aos tiros. Dois minutos depois de eu ter saído de lá com a minha salada de frutas e uma "bagel" com creme de queijo. No meio da violência, a cena parecia estranhamente normal, porque aquilo fazia parte de Nova Iorque, do som, o som colectivo de que eu tanto gostava. O medo era parte da substância e da energia de Nova Iorque, e o medo juntava-se às outras emoções que a cidade oferecia os moradores e visitantes. Nunca vim a Nova Iorque, onde escrevo estas linhas, sem sentir essa emoção quando corro as ruas a pé e verifico que o planeta abriga a mais estranha colecção de espécimes conhecidos e que uma parte dessa colecção veio parar a esta ilha, às margens destes rios, unida pelo desejo da liberdade e desse direito à felicidade.
Nova Iorque é isso, a Babilónia no seu período de esplendor, a Torre de Babel original, onde os contrários produzem o melhor exemplo do directo dos homens a perseguir a felicidade, como disseram os fundadores da América. A cidade era muito mais perigosa nessa época, e saía-se à rua com 30 dólares na carteira para dar ao assaltante "just in case". Lembro-me que uma noite me deu uma fome criativa por volta das três da manhã e resolvi ir a uma "deli" na 3ª Avenida, junto à Rua 64, uma zona abastada e residencial de Manhattan. De repente, entrei num episódio de "Hill Street Blues", uma série de polícias e ladrões mais ou menos desse tempo. A loja foi assaltada por um ladrão solitário e armado e a polícia entrou por ali aos tiros. Dois minutos depois de eu ter saído de lá com a minha salada de frutas e uma "bagel" com creme de queijo. No meio da violência, a cena parecia estranhamente normal, porque aquilo fazia parte de Nova Iorque, do som, o som colectivo de que eu tanto gostava. O medo era parte da substância e da energia de Nova Iorque, e o medo juntava-se às outras emoções que a cidade oferecia os moradores e visitantes. Nunca vim a Nova Iorque, onde escrevo estas linhas, sem sentir essa emoção quando corro as ruas a pé e verifico que o planeta abriga a mais estranha colecção de espécimes conhecidos e que uma parte dessa colecção veio parar a esta ilha, às margens destes rios, unida pelo desejo da liberdade e desse direito à felicidade.
O que torna Nova Iorque diferente de todos os outros lugares no mundo é a população, primeiro, e a arquitectura, depois. E essa arquitectura, dos arranha céus "trumpantes", como Mr. Trump, aos edifícios de fábula, como o Empire State e o Chrysler, é o resultado da diversidade do gosto e do senso. Os emigrantes fizeram a América em camadas sucessivas. Agora, nos trabalhos mais mal pagos, vêem-se mexicanos, peruanos, bolivianos, venezuelanos e outros sul-americanos, como dantes se viam afegãos ou paquistaneses, árabes ou malaios, chineses ou italianos. Ou portugueses, de reconhecida competência e probidade como mordomos exclusivos ou corretores da bolsa, tanto faz. Também integrámos a Babel e a ajudámos a crescer. A metrópole brutal e brutalmente bela, iluminada e sem sono, onde nada fecha ou cessa. Nova Iorque é um hino ao emigrante, à sua coragem e determinação, trabalho e criatividade. um hino à sobrevivência em duras circunstâncias. O que torna o atentado do 11 de Setembro tão terrível não é o número de vítimas ou a destruição das torres, é o facto de ter atingido o coração, a essência de Nova Iorque. E ter assassinado várias nacionalidades. os que dizem que os americanos estavam a pedi-las não sabem o que dizem, porque não foram, os americanos as vítimas, foi o mundo todo. O lugar continua triste e desabitado, como dizia Cesare Pavese, nada mais inabitável do que um lugar onde se foi feliz.
No meio do pavor financeiro e da derrocada, a cidade continua igual, com o consumo no topo, com a agitação nas lojas que saldam produtos todo o tempo. os que acham que o capitalismo liberal morreu aqui enganam-se sobre o poder desta economia, que gerou a maior riqueza de que há memória, para se renovar e para sobreviver. Esta é a regra americana. Mas nada será como dantes. A Nova Iorque que eu conheci da primeira vez, no final dos anos 70, era uma metrópole infinitamente mais pobre e habitada com gente mais miserável. Houve ganância e "hubris", mas também houve prosperidade e igualdade. Os pedintes juncavam os passeios, onde estão eles hoje? Os que decretam a morte de Wall Street com tanto gozo deviam lembrar-se disto. A cidade continua a sua marcha à procura do dia seguinte, apenas do dia seguinte, sem amanhã que canta. Um novo capitalismo pode emergir desta crise, mais consciencioso, mais criativo, menos egoísta. Mas, com todos os seus defeitos, este ainda é o lugar onde todos gostaríamos de viver. Ou de ter vivido. A nossa rapsódia de Gershwin, o som que é a síntese romântica da cacofonia de Manhattan.
Clara Ferreira Alves
No meio do pavor financeiro e da derrocada, a cidade continua igual, com o consumo no topo, com a agitação nas lojas que saldam produtos todo o tempo. os que acham que o capitalismo liberal morreu aqui enganam-se sobre o poder desta economia, que gerou a maior riqueza de que há memória, para se renovar e para sobreviver. Esta é a regra americana. Mas nada será como dantes. A Nova Iorque que eu conheci da primeira vez, no final dos anos 70, era uma metrópole infinitamente mais pobre e habitada com gente mais miserável. Houve ganância e "hubris", mas também houve prosperidade e igualdade. Os pedintes juncavam os passeios, onde estão eles hoje? Os que decretam a morte de Wall Street com tanto gozo deviam lembrar-se disto. A cidade continua a sua marcha à procura do dia seguinte, apenas do dia seguinte, sem amanhã que canta. Um novo capitalismo pode emergir desta crise, mais consciencioso, mais criativo, menos egoísta. Mas, com todos os seus defeitos, este ainda é o lugar onde todos gostaríamos de viver. Ou de ter vivido. A nossa rapsódia de Gershwin, o som que é a síntese romântica da cacofonia de Manhattan.
Clara Ferreira Alves
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"Juntos podemos" ou "Yes, we can"-
NÃO ME LEMBRO de ver nada assim. A recepção à selecção de Espanha foi a maior festa do país desde a democracia. Milhares e milhares de espanhóis embrulhados em bandeiras e símbolos nacionais, camisetas e gorros, pintalgados com as cores amarela e vermelha, esperaram na Praça Colón de Madrid o autocarro descoberto com os jogadores e o seleccionador. Existe uma Espanha, deixaram de existir várias Espanhas, ao menos por uma semana. E o que o escritor espanhol Javier Marías tinha chamado "um bando de mediocridades" tornou-se um grupo de heróis nacionais, como ele mesmo conta no "El País". Eu vi o jogo num "pub" de Madrid, cheio de ingleses, escoceses, espanhóis, brasileiros e um pequeno grupo de "chicas alemanas" que fumavam cigarros tensos e desesperados com o andamento do jogo. Empoleirada na multidão suada, rodeada de ecrãs gigantes e adrenalina, fui observando como a paixão do futebol e do trabalho bem feito consegue empolgar toda a gente.
No final, todos éramos espanhóis, especialmente os ingleses do lado. No dia seguinte, ouvi a conversa entre os empregados de um restaurante. Primeiro empregado: "E nós que éramos pelos portugueses e acabamos a ganhar o Euro, que bem que isto sabe." Segundo empregado: "Estes rapazes são muito jovens. muito amigos, muito unidos. Os portugueses não tinham bem uma Selecção, muitos contratos, muito dinheiro, muitas vedetas.
No final, todos éramos espanhóis, especialmente os ingleses do lado. No dia seguinte, ouvi a conversa entre os empregados de um restaurante. Primeiro empregado: "E nós que éramos pelos portugueses e acabamos a ganhar o Euro, que bem que isto sabe." Segundo empregado: "Estes rapazes são muito jovens. muito amigos, muito unidos. Os portugueses não tinham bem uma Selecção, muitos contratos, muito dinheiro, muitas vedetas.
Comentadores de bancada cheios de razão. O pior de Portugal nestes campeonatos foi contentar-se com pouco e usar o futebol e as pequenas vitórias para as piores exibições de marialvismo e bacoca exaltação patriótica.
Portugal precisa de uma vitória, e não é de uma pequena vitória. Não precisa do culto da personalidade a que temos assistido. Os "posters" de Ronaldo, as pancartas de Ronaldo, os anúncios de Ronaldo, as revistas detalhando a vida íntima da Ronaldo e das amigas de Ronaldo, a família de Ronaldo, os milhões de Ronaldo. Vencidos à procura de um vencedor. A política, como o futebol, precisa de vitórias e de mobilização, e nada nos últimos tempos parece estar em condições de tirar Portugal da mais funda depressão, nem o Ronaldo e os seus milhões, nem o futebol e a Selecção, nem as prédicas de Sócrates e Ferreira Leite. Muito menos os avisos banais do Presidente da Republica.
Os espanhóis não são muito diferentes dos portugueses, nem de outros povos, no que toca a derrotas e vitórias. A crença na vitória em Espanha, pelo menos no futebol, adoptou um slogan roubado a Obama, "Juntos Podemos". Este "Juntos Podemos" serviu de mantra e de oração, serviu de mote e de poema, e foi repetido como um acto de fé até se tornar uma realidade. Quem ouviu como eu os comentários da população e das televisões, ouvia estas palavras repetidas como se não houvesse outro caminho a não ser este. O colectivo. Em Espanha, país de um individualismo extremo, é um fenómeno novo. Um cínico diria que tudo isto é um disparate, mas estes disparates têm um efeito poderoso nos comportamentos colectivos. Portugal não tem, em nenhuma das suas frentes mobilizadores do orgulho nacional ou da satisfação do trabalho bem feito, um única acção ou frase que o mobilize. Somos um povo quebrado por anos de sacrifícios inúteis. De privações, de malícias e péssimas governações. E quebrado pelo provincianismo que faz com que saudemos como providencial o que é medíocre e como genial o que vem do estrangeiro.
O presidente da TAP dizia há pouco tempo que está cansado e que será muito difícil recuperar a TAP outra vez. Grande frase de derrota. A frase aplica-se a Portugal, estamos cansados. Cansados de dificuldades. Em vez de trabalho colectivo, veneramos o sucesso individual e o dinheiro dos outros. Assim, não vamos lá. Juntos, não pudemos. Num tempo de medo e recessão, de dúvida e lassidão, o país pensa em que vai substituir Scolari, o homem providencial. Não pensa no que o país é capaz de fazer sem Scolaris, sem Mourinhos, sem Ronaldos. Muitos contratos, muito dinheiro, pouco trabalho. Bem dizem os espanhóis, que vivem muito melhor do que nós.
Clara Ferreira Alves
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Impunidades
Por: Miguel Sousa Tavares
Tony Blair veio fazer uma palestra a Lisboa, para a habitual plateia de decisores políticos e económicos. Depois de dez anos a governar a Inglaterra em nome dos trabalhistas, Blair é hoje um dos homens mais bem pagos da Europa, cobrando entre 125 mil e 250 mil euros por cada uma destas conferências, além do salário de luxo que recebe como consultor de um desses bancos americanos que agora estão no olho do furacão da crise financeira mundial. Também é enviado especial da ONU para o Médio-Oriente, mas, nessas funções, tem-se revelado bem menos empenhado e eficaz do que a fazer conferências. Como herança interna, Blair deixou um défice monumental nas contas públicas inglesas, arruinou o mítico Serviço Nacional de Saúde (ao ponto de ser o líder dos "tories", David Cameron, quem hoje faz o papel de defensor público do SNS), deixou umas centenas de mortos ingleses no Iraque e o país ligado ao desfecho da aventura de Bush (para a qual Blair foi o primeiro dos apoiantes), e, para rematar em beleza, deixou toda a economia inglesa refém da tragédia de Wall Street.
Seria de esperar da sua parte talvez alguma humildade, algum embaraço, quem sabe mesmo, alguma vergonha: afinal de contas, ele foi um dos principais responsáveis pelo estado do mundo e ainda anda a facturar fortunas a falar dos 'problemas' que ajudou decisivamente a criar! Mas, se alguém esperava tal coisa, esperou em vão. Descontraído e sorridente, Tony Blair puxou de umas notas avulsas e deu conta das suas recentes andanças pelo mundo: esteve em Pequim, nos Jogos Olímpicos, esteve no deserto, numa tenda com Kadhafi, esteve aqui e ali, derramando a sua vasta experiência sobre os 'problemas', para poder concluir em Lisboa que "os problemas são globais e precisam de soluções globais". Mais uns quantos lugares-comuns de profundidade semelhante e a repetição de que o trabalho tem de ser flexível e a Segurança Social tem de ser reestruturada. E pronto. Suponho que lhe terão batido palmas e agradecido muito a lição e o incómodo. E lá se foi Tony Blair, sorridente, para o seu próximo compromisso global. É assim que se governa o mundo, nos tempos de agora.
2 Já aqui falei antes sobre um problema particular que o PSD, o país e todos nós temos: ter de estar sempre a encontrar uma ocupação para Santana Lopes. E tem de ser uma ocupação política e um cargo público, porque é tudo o que ele quer e pode. Agora, germina no PSD a originalíssima ideia de voltar a entregar ao 'menino-guerreiro' o 'combate' pela Câmara de Lisboa. Não admira que o próprio tenha já esclarecido que combates desses "não se recusam". O que admira e confrange é que a gente que sabe o que a casa gasta, como Manuela Ferreira Leite ou Marcelo Rebelo de Sousa, estejam dispostos a voltar a entregar Lisboa ao pior presidente da Câmara que Lisboa teve, desde um tal Aquilino, do PS. O raciocínio é este: nós livramo-nos do Santana e, se os lisboetas votarem nele, o problema é deles. Sim, eu sei, a culpa é da ordem natural das coisas: a democracia é uma senhora sem memória nem pudor, uma espécie de maria-vai-com-todos. E, se são os próprios eleitores que estão dispostos a cobrir tudo com um manto de impunidade, porque não aproveitar?
3 António Champalimaud foi um dos raríssimos milionários deste país que, por morte, deixou parte da sua fortuna a uma Fundação a sério, dedicada ao bem público e a uma causa utilíssima. Mais, teve a visão de escolher para gerir os destinos da Fundação alguém com a capacidade de não defraudar o seu gesto, como é Leonor Beleza. Dito isto, confesso o meu desapontamento com a forma como a Fundação Champalimaud quer começar a intervir na coisa pública. Primeiro, tentou por todas as formas conseguir uma excepção às regras do ordenamento paisagístico para instalar a sua sede em zona de construção vedada, na área de paisagem protegida Sintra-Cascais. Frustrados os seus intentos, virou-se para Lisboa e acaba de conseguir que a CML (com o verbo de encher que se está a revelar António Costa), consentisse em suspender o PDM da cidade para que a Fundação, contrariando as regras em vigor para todos, possa edificar a sua sede à beira-rio, na zona de Pedrouços. Ou seja, uma Fundação que nasce para fazer o bem público, começa por exigir e obter privilégios no espaço público que resultam no prejuízo de um bem comum, como é o direito a usufruir livremente da frente do rio, sem a ver tapada por construções avulsas, negociadas por favor político ou pessoal. É pena. Porque isto diz muito acerca da prática instalada entre nós de que não existe iniciativa privada sem favor do Estado.
Ali em frente, temos a Fundação Berardo, a quem o CCB emprestou toda a sua ala de exposições para ele colocar a sua colecção de pintura que não tinha onde pôr, e que empresta ao Estado. Sem espaço para mais nada, o CCB vai agora construir um novo módulo para exposições e, para o financiar, quer também construir um hotel. Se a exploração do hotel correr mal, são mais dois encargos a acrescentar à despesa pública. Para sustentar uma necessidade que não existia e que só passou a existir porque o Estado resolveu abrir mão de coisa sua para a oferecer a um 'mecenas'.
Ali em frente, temos a Fundação Berardo, a quem o CCB emprestou toda a sua ala de exposições para ele colocar a sua colecção de pintura que não tinha onde pôr, e que empresta ao Estado. Sem espaço para mais nada, o CCB vai agora construir um novo módulo para exposições e, para o financiar, quer também construir um hotel. Se a exploração do hotel correr mal, são mais dois encargos a acrescentar à despesa pública. Para sustentar uma necessidade que não existia e que só passou a existir porque o Estado resolveu abrir mão de coisa sua para a oferecer a um 'mecenas'.
4 A história de capa da última edição do EXPRESSO, sobre as 3200 casas atribuídas discricionariamente e em condições privilegiadíssimas pela CML, ao sabor das 'cunhas' e dos favores pessoais, é, de certo modo, a história deste país - desde, pelo menos, o tempo das Descobertas, quando se comandavam naus por 'cunhas' e favores. Em si mesma, a história apenas confirma hábitos de há muito conhecidos e factos concretos de há muito suspeitados. Isso não espanta, o que espanta são as explicações fornecidas pelos beneficiários do sistema instalado. Há a vereadora da Habitação, a quem compete atribuir casas e que acha que o facto de ela própria ter sido no passado uma das felizes contempladas em nada a desqualifica para as suas funções. Há o director de serviços da CML, que recebeu uma casa porque se tinha divorciado e precisava de outra e que, embora entretanto já se tenha recasado e mudado, mantém a casa da Câmara, com uma renda simbólica, porque, diz ele, nunca se sabe se amanhã não se volta a divorciar e a precisar outra vez da casa. Há os presidentes das Juntas de Freguesia, que acham 'normal' que os filhos tenham beneficiado de casas, porque "são cidadãos como outros quaisquer" (embora na altura tivesse constado na praça que não valia a pena concorrer porque as casas já estavam destinadas às famílias dos senhores membros das Juntas de Freguesia). E há o grande jornalista BB, campeão da indignação e da ética, que recebeu uma casinha porque a sua estava velha e atravessava problemas financeiros, mas que acha que revelar qual é a renda que paga por coisa pública, para que melhor se possa avaliar o favor de que beneficia, é "um assunto privado". Todos sem excepção acham a sua situação normalíssima e o grande jornalista até acha que tudo não passa de uma cabala dos seus inimigos e do preço a pagar pela sua frontalidade. De facto, como ele diz, "ser livre é muito difícil". Então não é?
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Europa e o problema americano
Europa e o problema americano
O presidente da Comissão Europeia, o 'nosso' Durão Barroso, descobriu agora os malefícios do "unilateralismo" americano no mundo de hoje. Arrependido, "ex officio", dos tempos do seu americanismo militante, quando se curvava em mesuras perante o "George" na cimeira das Lages, jurando a pés juntos que o seu "amigo George" era incapaz de mentir e que ia atacar o Iraque porque tinha provas das armas de destruição maciça de Saddam Hussein - que ele, Barroso, havia visto com os seus olhos - o comissário-chefe dessa coisa difusa a que insistimos em chamar Europa resolveu agora escrever um "dazibao" aos dois candidatos à próxima presidência dos Estados Unidos, dando-lhe conta dos sentimentos actuais de um europeu.
A Europa, diz Durão Barroso, quer que o próximo Presidente americano perceba que não pode passar sem ela; que se renda ao "multilateralismo", deixando de se comportar como o único actor global; que aceite a reforma das instituições que a Administração Bush tratou de tornar obsoletas e inúteis, como a ONU, o FMI, o Banco Mundial; que aceite a presença de outros "players" emergentes na cena mundial, com direito a audição e participação nas decisões, que reconheça que há problemas sérios à escala planetária que não podem continuar dependentes da agenda doméstica de um Presidente dos Estados Unidos. Tudo coisas óbvias e consensuais e que agora são fáceis de dizer. Há uma década, a ex-secretária de Estado americana Madeleine Albright, classificava os Estados Unidos como "a nação indispensável".
Oito anos de desastrada gestão de Bush encarregaram-se de nos ensinar amargamente que as coisas podiam mudar: os Estados Unidos tornaram-se hoje a nação dispensável - de bom grado dispensaríamos a contribuição que deram para o estado do mundo, nestes últimos tempos. Em oito anos, a nação que a dupla Clinton-Gore havia deixado na prosperidade e no caminho de uma efectiva e inteligente liderança mundial transformou-se num dos problemas do mundo, ao lado da Al-Qaeda e do fundamentalismo islâmico ou do aquecimento global. Os Estados Unidos que George W. Bush vai deixar em herança são o maior consumidor de energia e matérias-primas à escala global; o maior poluidor do planeta e o mais feroz adversário de todas as convenções e tentativas de inverter o caminho para o caos - tendo a Casa Branca chegado ao extremo de falsificar relatórios científicos para tentar provar que o aquecimento global não existia; são o principal factor de provocação do terrorismo islâmico e o maior destabilizador da paz no Médio Oriente, nos Balcãs, no Cáucaso; são o mais hipócrita defensor de um comércio global livre e justo, que defendem no papel e tratam de sabotar na prática, sempre que lhes dá jeito; e são, conforme se tornou agora exuberantemente exposto, o grande agente e exportador da crise económica mundial, graças à ganância dos amigos de Bush e à cumplicidade cooperante deste. Eis a herança do 'amigo George'. Não admira que até Durão Barroso seja agora capaz de negar três vezes que o conhece. E, todavia, só se deixou enganar quem quis. Os americanos, claro, e é por isso que a América é uma nação perigosa, porque tanto se podem entregar a um Roosevelt ou a um Clinton como a um Nixon ou a um Bush. Mas não só os americanos: também essa geração de dirigentes europeus enfatuados, que parecem desprovidos de pensamento próprio, mesmo quando se trata de questões que tocam muito mais de perto à Europa do que à América, como são os Balcãs, o Médio Oriente ou as relações com a Rússia. Toda a gente sabia que Bush era um completo ignorante em matéria de política externa, dotado daquela ignorância arrogante que se encontra no americano médio, que está convencido de que, fora dos Estados Unidos, nada mais conta e nada mais interessa, e que o mundo inteiro vive no desejo de poder imitar o estilo de vida e os 'valores' americanos - os únicos justos e conformes à vontade de Deus. Mas a ignorância é uma arma perigosa nas mãos de um homem poderoso, e dizem que o Presidente dos Estados Unidos é o homem mais poderoso do mundo. Foi a ignorância de Bush que conduziu os Estados Unidos ao caos e fez do mundo um lugar infinitamente mais perigoso. Tudo era por demais evidente que assim seria, mas a "intelligentsia" europeia que ditou moda nos últimos tempos havia decretado, qual "fatwa", que duvidar da infalibilidade americana era crime de "antiamericanismo primário" - uma doença mental de diletantes ou "órfãos do comunismo". Corremos o risco de ter mais do mesmo. A semana passada, durante uma entrevista à televisão espanhola, ficou a perceber-se que o candidato McCain - tido como um "especialista" em política externa - não sabia que Rodriguez Zapatero é primeiro-ministro de Espanha, o que equivale a dizer que não acha que a Espanha seja uma nação suficientemente importante para interessar um Presidente dos Estados Unidos. E a candidata a vice-presidente, a dona-de-casa do Alasca, Sarah Palin - que até ao ano passado nunca tinha pedido um passaporte para sair dos EUA - só terça-feira passada se encontrou pela primeira vez com um dirigente estrangeiro. Puseram-na nas mãos do 'guru' Kissinger para um "brain-storming" intensivo e trataram de introduzi-la à pressa ao resto do mundo, começando pelos amigos: os Presidentes da Geórgia, Ucrânia, Iraque e Afeganistão. Graças a uma indiscrição da CNN, cujo repórter se conseguiu aproximar da senhora mais do que os seguranças consentem, ficou a saber-se que, na quarta-feira, Kissinger tratava de lhe explicar quem era Sarkozy. A coisa promete... O que está errado na carta de Durão Barroso aos candidates às eleições americanas é o tom de pedido: a Europa pede aos Estados Unidos que a levem em conta. Dir-se-ia que a factura de Omaha Beach nunca mais está saldada... Mas venha Obama ou McCain, não há mais tempo a perder nem mais desculpas para que a direcção política europeia continue eternamente a resguardar-se nos interesses da 'Aliança Atlântica' para não assumir as suas responsabilidades
A Europa tem de ter uma política externa e uma política de defesa autónomas, que não dependam da NATO nem da ignorância geopolítica dos presidentes americanos. Tem de ter uma estratégia própria para as crises dentro das suas fronteiras e no seu perímetro. Uma estratégia própria para os Balcãs, para o Médio Oriente, para o Magrebe, para o Irão. E, claro, para a Rússia, que é um dos seus principais fornecedores de gás e petróleo e um parceiro indispensável para a manutenção da paz e para a resolução de crises regionais onde os interesses estratégicos americanos só atrapalham. A Europa não tem qualquer interesse em ver mísseis americanos a cercar a Rússia, nem em envolver-se, à sombra da NATO, em intervenções sem sentido e que, em última análise, apenas podem ressuscitar o espírito de guerra-fria sepultado em Berlim há quase vinte anos. Desgraçadamente, toda a gente parece concordar num ponto: não é com esta geração de políticos europeus que a Europa se conseguirá afirmar e construir. Precisamos de estadistas, de visionários, e só temos malabaristas da política e mestres da conjuntura e do vazio. Uma geração muda-se de cima para baixo, começando por mudar as opiniões públicas. É isso que se torna urgente fazer.
Por: Miguel Sousa Tavares
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Paul Auster vai votar no candidato
Se Obama perder "será pela cor da sua pele"
Paul Auster anunciou hoje, em Barcelona, durante a apresentação do seu mais recente romance 'Man in the Dark', que votará no democrata nas presidenciais de 4 de Novembro próximo.
Se Obama perder "será pela cor da sua pele"
Paul Auster anunciou hoje, em Barcelona, durante a apresentação do seu mais recente romance 'Man in the Dark', que votará no democrata nas presidenciais de 4 de Novembro próximo.
Para o escritor americano Paul Auster - que hoje apresentou em Barcelona o seu mais recente romance 'Man in the Dark'-, o próximo Presidente dos EUA deveria ser Barack Obama, por quem nutre profunda admiração "pela sua inteligência aguda, por saber manter a calma e a cabeça fria, inclusivamente em situações de muita pressão".
O autor de "A Trilogia de Nova Iorque" e "Loucuras de Brooklyn"diz que o candidato republicano John McCain "é todo ele o contrário [de Barack Obama], é impulsivo, exalta-se com facilidade e tende a entrar em acção antes de pensar". O peso da cor
Segundo Auster, "os europeus não estão conscientes do tamanho da pressão a que Obama está sujeito nos EUA. Ser o primeiro candidato negro à presidência é um peso colossal, exige que não cometa qualquer erro e que seja praticamente perfeito. E, de facto, ele tem sabido manter a cabeça fria, ainda não deu um passo em falso."
Segundo Auster, "os europeus não estão conscientes do tamanho da pressão a que Obama está sujeito nos EUA. Ser o primeiro candidato negro à presidência é um peso colossal, exige que não cometa qualquer erro e que seja praticamente perfeito. E, de facto, ele tem sabido manter a cabeça fria, ainda não deu um passo em falso."
Se Obama perder as eleições, diz Auster, "será pela cor da sua pele", admitindo que o facto de Obama ser negro pode vir a pesar na hora da votação.
"É-me impossível definir até que ponto os EUA são um país racista, mas em condições normais, com um candidato branco, depois de uma fracassada administração republicana e a terrível presidência de George W. Bush, ninguém duvidaria que ganhavam os democratas", acrescentou. O escritor vê os EUA como "um país dividido, que disputa uma guerra civil sem balas, mas com palavras e ideias."
De acordo com Paul Auster, 44% dos americanos não acreditam na teoria da evolução de Darwin, mas sim que o mundo foi criado em seis dias. "Se extrapolarmos esse caso a outros quinhentos temas que nos afectam, é evidente que não conseguimos comunicar entre nós", disse. A crise segundo Auster
Sobre a crise financeira que assola o país, o escritor disse que "nos últimos trinta anos as ideias de Milton Friedman invadiram a mentalidade de todos os norte-americanos, a ideia do capitalismo selvagem, segundo a qual a base é o mercado livre, um mercado que se auto-regula".
De acordo com Paul Auster, 44% dos americanos não acreditam na teoria da evolução de Darwin, mas sim que o mundo foi criado em seis dias. "Se extrapolarmos esse caso a outros quinhentos temas que nos afectam, é evidente que não conseguimos comunicar entre nós", disse. A crise segundo Auster
Sobre a crise financeira que assola o país, o escritor disse que "nos últimos trinta anos as ideias de Milton Friedman invadiram a mentalidade de todos os norte-americanos, a ideia do capitalismo selvagem, segundo a qual a base é o mercado livre, um mercado que se auto-regula".
Para o escritor nova-iorquino, essa auto-regulação é "falsa", pois o "capitalismo tende a auto-devorar-se, a assumir cada vez mais riscos, e o que agora vemos são as consequências da execução de más ideias".
Auster defendeu ainda a existência de um Governo que tome medidas de maior carácter regulatório. "Se não o fizer, em dois anos pode ser que comecemos a passar fome", acrescentou.
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Farto de más notícias, eis quatro boas
Por: Nicolau Santos
Quando o mundo económico cai à nossa volta, é possível encontrar alguns motivos de esperança? Seguramente. É só procurar. Eu encontrei quatro.
1 -Todos os Verões, Portugal e muitos outros países se debatem com o flagelo dos fogos florestais. A explicação, quando não tem origem criminosa, radica na acumulação de combustíveis florestais (matos, caruma, etc.) em terrenos que não são limpos pelos seus proprietários ou estão ao abandono. Além do mais, a limpeza dos terrenos custa muito esforço e bastante dinheiro.
Esta semana, a Impresa, empresa proprietária do Expresso, e a Água do Luso entregaram o Prémio Ideias Verdes aos responsáveis de um projecto já testado, que é um verdadeiro ovo de Colombo: utiliza cabras que, controladas por cercas, devoram literalmente todos os resíduos florestais que estão na origem dos fogos.
Os projectos-piloto na serra de Sintra e em Grândola foram um sucesso. Segue-se o primeiro projecto em larga escala nas serras de Aires e Candeeiros. As cercas que controlam a zona de actuação das cabras são alimentadas com energia solar e cada animal leva um chip na coleira, que permite a sua localização via GPS num telemóvel. É a junção da modernidade à ruralidade, à ecologia e à defesa do ambiente. E a prova de que uma excelente ideia não precisa de milhões para se concretizar.
2 - O MEP-Movimento Esperança Portugal, liderado por Rui Marques, parece ser um partido diferente. Esta semana organizou um debate sobre as razões e a necessidade de esperança em Portugal. Editou um livrinho com 52 razões de esperança. Alguns exemplos: o espaço Shengen foi alargado a nove novos países em 2007 graças à solução informática criada pela Critical Software, uma empresa portuguesa. Temos a terceira mais baixa taxa de mortalidade infantil da Europa e a quarta do mundo. O novo laboratório espacial europeu Columbus inclui tecnologia portuguesa concebida pela Efacec. Somos o país da Europa que mais alterou a estrutura de exportações na última década: os produtos de alta tecnologia já representam 15% das exportações nacionais. Estamos em 18º no Índice de Desempenho Ambiental entre 149 países. O PIB "per capita" passou de menos de 7 mil euros em 1986 para cerca de 17 mil euros em 2006. Em menos de um século a esperança de vida duplicou. Nos últimos 50 anos, o número de mulheres licenciadas passou de 11 mil para 600 mil. Chega para nos orgulharmos do país em que vivemos?
3 - A Chevrolet promoveu um concurso de Artes Aplicadas. Houve 41 propostas de 15 países. Paulo Branco, 23 anos, ficou em terceiro na categoria de fotografia, Ricardo Trindade e Rafael Gonçalves, ambos com 22, ficaram em segundo na categoria de artes visuais. E Trindade não tem pejo em dizer: "Quero ser o próximo designer da GM". Quem disse que esta é uma geração mal preparada e sem ambição?
4- Portugal tornou-se o primeiro país em todo o mundo com capacidade de produzir electricidade a partir da energia das ondas do mar. Há ainda 15 a 20 anos para confirmar o sucesso do projecto, onde Enersis, EDP e Efacec estão associadas. Mas quando é que estivemos na vanguarda de alguma tecnologia? E com as condições que temos, dificilmente perderemos um dos primeiros lugares na exploração desta tecnologia do futuro.
A PT e a imagem de Portugal
Na semana passada, a PT fez muitíssimo pelo nome de Portugal em África. Zeinal Bava, presidente da operadora, esteve na Namíbia para lançar o e-escolas, com a subsidiação de computadores 'Magalhães' para 25 mil estudantes universitários e a distribuição gratuita de mais mil nas escolas primárias. É um gesto que a Namíbia não esquecerá e a prova de que são as empresas que criam a imagem do país. É por isso que algumas têm de estar sempre em mãos nacionais.
Eles andam calados
De repente, todos os que sempre defenderam que as empresas que cometem erros de gestão devem falir, calaram-se.
Todos os que sempre defenderam menos Estado, calaram-se.
Todos os que sempre reclamaram da acção dos reguladores, calaram-se. De repente, todos eles perceberam que o mercado é vital, mas não pode ser deixado à solta. De repente, todos perceberam que os homens à frente das instituições não são intrinsecamente bons. De repente, todos perceberam que gerir com base num prémio associado ao desempenho da instituição pode ser perverso. Mas andam muito calados - enquanto o mundo paga a factura dos seus erros.
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Sim nós Podemos!
Porr:Miguel Monjardino
Barack Obama estará no Médio-Oriente e nas principais capitais europeias nos próximos dias. O principal objectivo da viagem do candidato presidencial democrata é fortalecer a sua credibilidade junto do eleitorado norte-americano nas áreas da segurança nacional e política externa. Estas duas áreas são sempre importantes na corrida à Casa Branca. As palavras, as imagens e os sons estrangeiros serão particularmente importantes para a campanha do senador democrata. Em Berlim, Paris e Londres não faltarão líderes políticos e multidões extremamente entusiasmados com a visita de Obama. O entusiasmo garante à partida um grande espectáculo político nos dias que aí vêm. O problema é que também pode garantir a sobrevivência de dois perigosos equívocos.
O primeiro gira à volta do principal tema da campanha presidencial. Para os americanos, o que realmente está em jogo são problemas internos. O que a sociedade americana espera ouvir de John McCain, o candidato republicano, e de Barack Obama são propostas de políticas públicas para gerir estes problemas nos próximos anos. Para os europeus, a campanha presidencial é crucial por uma coisa completamente diferente - a política externa norte-americana. Isto leva-nos ao segundo equívoco os europeus adoram ouvir Barack Obama dizer "Sim, nós podemos!" O problema é que a seguir dizemos "Sim, eles podem!". Dito de outra forma, os eleitorados europeus já decidiu que o senador democrata será o próximo presidente dos EUA e que, a partir de Janeiro 2009, a administração Obama vai resolver o problema do aquecimento global, acabar de uma vez por todas com o conflito entre palestinianos e israelitas, retirar todas as tropas americanas do Iraque, pôr fim à pobreza em África e reconstruir o Afeganistão. Estou a exagerar um pouco, é verdade. Não estou, todavia, a exagerar quando escrevo que os eleitorados europeus esperam que o próximo presidente americano resolva os principais problemas mundiais. Estes eleitorados têm uma opinião muito forte sobre estes problemas mas, paradoxalmente, não esperam ou não querem desempenhar um papel importante na sua gestão.
Se Barack Obama for eleito em Novembro - e vale a pena acentuar a dúvida - e estes equívocos não forem esclarecidos, 2009 promete surpresas muito desagradáveis em ambos os lados do Atlântico. Obama, obviamente, sabe isto melhor do que ninguém. Num discurso em Washington na terça-feira, o senador democrata disse que a sua estratégia de segurança nacional assentará em cinco pontos: pôr fim à guerra no Iraque de uma forma responsável; acabar a luta contra a Al-Qaeda e os talibã no Paquistão e Afeganistão; impedir os terroristas e os estados-pária de ter acesso a armas e material nuclear; conseguir a segurança energética; reconstruir as alianças dos EUA para enfrentar os desafios do século XXI.
A mensagem para os líderes e eleitorados europeus foi clara - "Sim, nós podemos!". Dito de outra forma, Obama espera que os países europeus façam muito mais nas áreas da política e segurança internacional. O Afeganistão é o melhor exemplo. Nos próximos dias, os recados públicos e privados do candidato presidencial democrata aos líderes e sociedades europeias serão óbvios. Muitos destes recados serão politicamente incómodos no Velho Continente. Acima de tudo por tornarem excessivamente visível o fosso entre a retórica e a vontade política das capitais europeias.
A campanha presidencial americana é uma excelente oportunidade para Portugal se adaptar a um novo ciclo euro-atlântico. Este processo não é fácil. Tal como acontece com todos os países da União Europeia, em Portugal o ministro das Finanças é bem mais influente do que os ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa. A geografia, todavia, tem favorecido Portugal no seu relacionamento com os EUA. Tenho chamado a atenção nesta coluna para a importância da base das Lajes no novo planeamento estratégico de Washington.
Para os militares norte-americanos, as Lajes poderão ser uma base extremamente importante para o apoio logístico e operacional às operações do Africom, o novo comando militar que se tornará operacional em Outubro. Se olharmos para o mapa, vemos que a base nos Açores é ideal para o pré-posicionamento de equipamento, trânsito ou estacionamento de forças de operações especiais e reabastecimento americano em direcção a África. As Lajes também são vistas pela Força Aérea dos EUA como ideais para o treino dos novos caças F-22 Raptor.
Para os militares norte-americanos, as Lajes poderão ser uma base extremamente importante para o apoio logístico e operacional às operações do Africom, o novo comando militar que se tornará operacional em Outubro. Se olharmos para o mapa, vemos que a base nos Açores é ideal para o pré-posicionamento de equipamento, trânsito ou estacionamento de forças de operações especiais e reabastecimento americano em direcção a África. As Lajes também são vistas pela Força Aérea dos EUA como ideais para o treino dos novos caças F-22 Raptor.
Num discurso na quarta-feira em Ponta Delgada, Carlos César, presidente do Governo Regional dos Açores, exigiu que Lisboa conclua rapidamente as negociações que tem vindo a manter desde há bastante tempo com os EUA sobre estes dois assuntos. Exigiu também que a resposta nacional seja sim. Os Açores têm todo o interesse político e orçamental em desempenhar o seu papel no 'Sim, nós podemos!' euro-atlântico de Barack Obama. Lisboa tem dúvidas. Porquê?
Roosevelt nos Açores Franklin Delano Roosevelt (FDR) visitou S. Miguel e o Faial na viagem que fez à Europa no Verão de 1918 na qualidade de sub-secretário da Marinha. Mais tarde, como Presidente dos EUA, FDR negociou com Winston Churchill e Salazar o regresso dos militares americanos aos Açores e pensou em realizar conferências das Nações Unidas no arquipélago. Noventa anos depois, por iniciativa de Mário Mesquita, a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), o Governo Regional dos Açores e a Biblioteca Presidencial Franklin D. Roosevelt organizaram o I Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt em Ponta Delgada. Ao longo de três dias discutiu-se a visão e o relacionamento de FDR com Portugal e o actual momento das relações euro-atlânticas. A próxima edição do Fórum terá lugar em 2010.
Roosevelt nos Açores Franklin Delano Roosevelt (FDR) visitou S. Miguel e o Faial na viagem que fez à Europa no Verão de 1918 na qualidade de sub-secretário da Marinha. Mais tarde, como Presidente dos EUA, FDR negociou com Winston Churchill e Salazar o regresso dos militares americanos aos Açores e pensou em realizar conferências das Nações Unidas no arquipélago. Noventa anos depois, por iniciativa de Mário Mesquita, a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), o Governo Regional dos Açores e a Biblioteca Presidencial Franklin D. Roosevelt organizaram o I Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt em Ponta Delgada. Ao longo de três dias discutiu-se a visão e o relacionamento de FDR com Portugal e o actual momento das relações euro-atlânticas. A próxima edição do Fórum terá lugar em 2010.
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